De olhos na China, EUA reforçam presença militar nas Filipinas
Norte-americanos foram autorizados a utilizar mais quatro bases no arquipélago, além das cinco onde já marcam presença. Pequim denuncia "ato que aumenta as tensões na região".
Os olhos do mundo podem estar na Rússia e na guerra na Ucrânia, mas há muito que os EUA consideram a China como "a maior ameaça a longo prazo" para a sua economia e segurança nacional, bem como a dos aliados. E procuram formas de contrabalançar o poder crescente de Pequim, que se tem mostrado mais assertivo em relação a Taiwan e nas disputas territoriais no Mar do Sul da China. O reforço da presença militar nas Filipinas, com a autorização para instalar forças norte-americanas em mais quatro bases (além das cinco atuais), é um passo importante nesse jogo de forças. Um passo que a China criticou de imediato.
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O anúncio do acordo foi feito durante a visita do secretário de Defesa norte-americano, Lloyd Austin, a Manila. "Os EUA sempre foram o nosso mais antigo parceiro e aliado", disse o presidente filipino, Ferdinand Marcos Jr. "Eu sempre disse que me parece que o futuro das Filipinas, e de facto de toda a região da Ásia-Pacífico, irá envolver sempre os EUA", indicou. Ao abrigo do acordo, os norte-americanos terão acesso a mais quatro bases em "zonas estratégicas do país", não tendo sido especificados os locais. O ministro da Defesa filipino, Carlito Galvez, disse que estes serão conhecidos após consultas com as autoridades locais.
Contudo, especula-se que os norte-americanos querem ficar na ilha de Luzon (a maior e mais próxima de Taiwan), onde já têm autorização para aceder a duas bases. E que há também interesse numa segunda base na ilha ocidental de Palawan, próximo das ilhas Spratly, cuja soberania é disputada por Pequim e vários países da região e onde a China construiu já pelo menos três bases militares.
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Na prática, os EUA estão a preparar-se para responder às duas principais ameaças. Nos últimos meses tem subido a tensão entre a China e Taiwan (que Pequim considera uma das suas províncias, cuja soberania está disposta a recuperar pela força). Depois da visita da então líder da Câmara dos Representantes dos EUA, Nancy Pelosi, a China enviou navios de guerra, bombardeiros e caças para próximo de Taiwan, desencadeando receio de um potencial bloqueio ou até de uma ação militar.
Por outro lado, os chineses estão envolvidos em disputas territoriais com as Filipinas, a Malásia, o Vietname, o Brunei e Taiwan no Mar do Sul da China, rico em recursos e uma importante via marítima. Os norte-americanos têm vários navios na região e efetuam missões de vigilância, em nome da liberdade de navegação que Pequim critica.
A China também já mostrou o desagrado diante do reforço da presença norte-americana nas Filipinas. A porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros chinês, Mao Ning, acusou os EUA de perseguirem uma "agenda egoísta" com o novo acordo. "Os EUA aderiram a uma mentalidade de soma zero da Guerra Fria e fortaleceram o destacamento militar na região", disse na conferência de imprensa diária. "Este é um ato que aumenta as tensões na região e põe em perigo a paz e a estabilidade regionais."
História
As Filipinas, com as suas mais de sete mil ilhas, foram colonizadas pelos espanhóis, que controlaram o território durante mais de três séculos até 1898, quando depois de perderem a guerra hispano-americana cederam o controlo aos EUA. O arquipélago acabaria invadido pelo Japão, na II Guerra Mundial, sendo a independência reconhecida no final do conflito, em 1946.
Por causa da história comum, as Filipinas são o mais antigo aliado militar dos EUA na região, com o primeiro tratado de defesa mútua a ser assinado em 1951. Mas os sentimentos antiamericanos, na última década do século passado, e uma divergência em relação aos custos da concessão, levaram as Filipinas a ordenar o fecho da última base militar norte-americana em 1992 (Subic Bay), que na altura albergava sete mil pessoas.
Em 1999, um acordo abriu contudo a porta à realização de exercícios militares conjuntos de larga escala entre os dois países. Já em 2014, um outro acordo permitiu aos norte-americanos destacarem tropas, além de material de defesa (que não pode incluir armas nucleares), para cinco bases filipinas: Antonio Bautista (na região de Palawan), Basa (em Pampanga), Forte Magsaysay (Nueva Ecija), Aeroporto de Lumbia (na cidade de Cagayan de Oro) e Benito Ebuen (em Mactan, na ilha de Cebu).
Os EUA estavam a reconstruir a presença militar no país, mas a chegada de Rodrigo Duterte ao poder, em 2016, resultou no deteriorar das relações. O presidente defendia que era "tempo de dizer adeus" aos EUA, ameaçando em várias ocasiões rasgar os dois últimos acordos (nunca o chegou a fazer) numa tentativa de se aproximar de Pequim - apesar das disputas no Mar do Sul da China.
Mas o atual presidente, Ferdinand Marcos Jr. (filho do ex-ditador com o mesmo nome, que governou de 1965 a 1986), tem procurado, desde que tomou posse em junho, reatar os laços com os EUA.
susana.f.salvador@dn.pt
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