Condições meteorológicas atrapalham corrida contra o tempo

Ao desastre dos sismos, que causaram pelo menos 8000 mortos, dezenas de milhares de feridos e infraestruturas destruídas, soma-se a dificuldade do acesso às províncias turcas e ao noroeste da Síria, e as temperaturas negativas que põem em risco os sobreviventes.

As equipas de emergência por norma correm contra o relógio. "É agora uma corrida contra o tempo", constatou o diretor da Organização Mundial de Saúde Tedros Adhanom Ghebreyesus. Uma verdade de La Palice que ganha particular acuidade na Turquia e na Síria, onde os sobreviventes presos nos escombros dos sismos ocorridos na segunda-feira estão expostos, em muitos casos, a temperaturas negativas.

Apesar da mobilização internacional, a chegada de grupos de resgate e de ajuda humanitária está condicionada ao estado das infraestruturas no local, caso da estrada que liga o único ponto de passagem aberto entre a Síria e a Turquia. E com as autoridades turcas a não mostrar capacidade de resposta para chegar a todas as cidades, os próximos dos desaparecidos, em desespero, tentam resgatar com as mãos os soterrados. No noroeste da Síria, os hospitais estão saturados ao ponto de não aceitarem mais feridos.

Segundo o porta-voz do Escritório das Nações Unidas de Coordenação de Assuntos Humanitários (OCHA), Jens Laerke, há uma janela de sete dias para resgatar pessoas soterradas com vida. A estimativa baseia-se em dados de operações de salvamento em todo o mundo, embora as condições específicas possam fechar a janela mais cedo, como é o caso. O frio é um risco acrescido para as pessoas forçadas a abandonar as suas casas, ou que têm medo de voltar para as que permaneceram de pé, tendo procurado refúgio em tendas, carros, mesquitas, escolas, ou estádios, e em especial para os sobreviventes enterrados sob os escombros.

Para agravar a situação, uma tempestade tornou muitas estradas - algumas já danificadas pelos terramotos - quase intransitáveis, o que resultou em engarrafamentos de quilómetros em algumas regiões.

O fornecimento de água potável é outra prioridade, como Ann Avril, diretora-geral da UNICEF em França disse à France 24, lembrando que tal representa um "desafio logístico". Para o presidente turco Recep Erdogan, a situação é de tal modo grave que declarou o estado de emergência nas dez províncias afetadas pelos sismos durante três meses.

Para agravar a situação, uma tempestade tornou muitas estradas - algumas já danificadas pelos terramotos - quase intransitáveis.

A solidariedade internacional continuou a somar milhões em ajuda humanitária e em mais anúncios de envio de equipas especializadas e hospitais de campanha. O governo espanhol, por exemplo, depois de ter despachado dois aviões com equipas especializadas, vai enviar dois navios da Marinha com médicos, enfermeiros e 500 marinheiros, além de helicópteros, criando hospitais flutuantes.

O desastre teve ainda o condão de aparentemente aproximar países ou lideranças de costas voltadas. A Arábia Saudita anunciou "uma ponte aérea"para ajudar as populações turca e síria. Riade apoiou o derrube de Bashar al-Assad e manteve relações frias com Erdogan na sequência do assassínio de Jamal Kashoggi, no consulado de Istambul. O Egito, pela voz do presidente Abdel Fattah al-Sisi ofereceu apoio a Assad numa conversa telefónica, a primeira desde que Sisi chegou ao poder, em 2014, com o sírio. O antigo marechal também falou com o líder turco, com quem também mantém uma relação distante.

Ainda mais surpreendente foi o anúncio do governo da Arménia de que vai enviar equipas de resgate para a Turquia (e para a Síria). Erevan e Ancara não têm laços diplomáticos, dada a recusa da Turquia em reconhecer o genocídio arménio pelo Império Otomano.

Para quem está sujeito a temperaturas negativas, sem acesso a bens básicos e com familiares e amigos soterrados, os jogos políticos não interessam. "Onde está o Estado? Não consigo retirar o meu irmão das ruínas. Não consigo alcançar o meu sobrinho. Olhem à vossa volta. Não há aqui nenhum funcionário do Estado, por amor de Deus", gritou um exasperado Ali Sagiroglu à reportagem da AFP em Kahramanmaras, onde só no centro da cidade ruíram oito edifícios de apartamentos com mais de 10 andares.

Horas depois, os bombeiros conseguiram retirar com vida uma menina de quatro anos nessa cidade.

Na Síria, em Jandaris, um recém-nascido, ainda com o cordão umbilical a ligá-lo à mãe, que não sobreviveu, foi resgatado com vida entre os escombros de um prédio de cinco andares.

cesar.avo@dn.pt

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