Presidente da Argentina, Javier Milei, encontrou-se com Donald Trump em fevereiro.
Presidente da Argentina, Javier Milei, encontrou-se com Donald Trump em fevereiro.Presidência da Argentina

Cenário de vitória de Trump anima extrema-direita da América Latina

Milei e bolsonarismo, devotos do republicano, acreditam em benefícios económicos e eleitorais. México e países sob Governos de esquerda, mesmo moderados, como o Brasil de Lula, preocupam-se.
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Após o debate ganho a um combalido Joe Biden e a sobrevivência ao atentado na Pensilvânia, a América Latina começa a preparar-se para o cenário de uma eventual vitória de Donald Trump nas eleições dos EUA. Os países governados à esquerda, como o Brasil de Lula da Silva, temem a coabitação com o candidato republicano. E aqueles sob regimes de direita animam-se. Assim, como a extrema-direita brasileira, por ora na oposição.

“No Brasil há um grande temor do Governo Lula por conta da proximidade de Trump com o bolsonarismo raiz, impulsionada por Eduardo Bolsonaro, deputado que já sugeriu até que Trump imponha sanções”, diz Vinícius Vieira, professor de Relações Internacionais da Fundação Armando Álvares Penteado (FAAP).

Para Denilde Holzhacker, professora de Relações Internacionais e especialista em EUA da Escola Superior de Propaganda e Marketing  (ESPM), “o atentado já deu um argumento à direita brasileira, logo uma eventual vitória de Trump dará, claro, argumentos muito maiores”. “O bolsonarismo vai utilizar a ligação entre Bolsonaro e Trump para sublinhar que, com o republicano na Casa Branca, a relação entre os países seria muito mais fluida se no Planalto estivesse alguém ideologicamente mais próximo.”

“Acredito no direcionamento de recursos para os aliados, isto é, Javier Milei, na Argentina, e Nayib Bukele, em El Salvador, isolando Governos à esquerda, mesmo a moderada, começando pelo Governo Lula e pelos Governos da Colômbia e do Chile”, prossegue Vieira.

“A eleição de Trump prenunciaria, portanto, uma nova onda de direita na América Latina, assim como o seu primeiro mandato proporcionou as experiências já conhecidas”, continua o académico. “Entretanto, Trump pode criar um zeitgeist que estimule, além dos Governos à direita, aventuras autoritárias e golpistas, porque a tentativa do malfadado golpe de Bolsonaro, por exemplo, teria mais hipóteses de prosperar se Trump estivesse no poder, já que dificilmente o republicano colocaria a sua diplomacia em campo para o impedir.”

Lula, por sua vez, perderia um aliado, Biden, na Casa Branca. “A relação de Lula com Trump, caso este ganhe, será por pelo menos, dois anos, e não será fácil por causa da distância ideológica e da visão de que o Brasil é mais próximo da China”, diz a docente da ESPM.

“Sem Biden e com aliados como o francês Emmanuel Macron ou o alemão Olaf Scholz, de futuro incerto, Lula ficaria fragilizado no cenário internacional”, acrescenta o professor da FAAP.

Vieira lembra, entretanto, que “Trump é America First, sobretudo no comércio e, por isso, dificilmente vai abrir os mercados, mesmo para que aqueles aliados à direita”, como Milei.

“Na América Latina em geral, o Governo de Milei será o mais beneficiado. Entretanto, a relação de Trump com o continente é tensa por causa da imigração, sobretudo em relação ao México e aos outros países da América Central, e mesmo aliados, como Milei, poderão não ter relação tão forte como pensam”, defende Holzhacker.

Para Vieira, além do Brasil, “o México será o mais atingido pelas questões da imigração, assim como os demais países da América Central, e, no plano dos Direitos Humanos, a questão das drogas e do aborto tratados como caso de polícia e não de saúde pública nos EUA pode reverberar na região”.

“O peso mexicano deve, por isso, ficar volátil com a proximidade das eleições e o aumento das probabilidades de derrota de Biden”, previu Hasnain Malik, da Tellimer, consultora internacional especializada em mercados emergentes, citado pela Reuters.

Sob Trump, as relações dos EUA com Venezuela, Cuba e Nicarágua, com regimes autoritários de esquerda, também devem ser revistas.

Pelo contrário, de acordo com Thys Louw, da empresa de gestão de ativos Ninety One, os regimes de Bukele e de Milei, por serem muito próximos do Partido Republicano, “estarão mais inclinados a negociar com o FMI e o FMI mais inclinado a negociar com eles em caso de vitória de Trump”.

Entretanto, em outubro, um mês antes das eleições americanas, o Brasil vai a votos nas Eleições Municipais - o cenário eleitoral norte-americano influirá a favor do bolsonarismo?

Para Holzhacker, “nas Municipais, à exceção da cidade de São Paulo, onde a discussão é federalizada, o que se debate são questões locais, por isso, a Eleição Municipal deve ser pouco permeável à de Trump e Biden”.

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