Bolsonaro só conseguiu mobilizar 18 mil pessoas numa manifestação a favor da amnistia dos envolvidos na tentativa de golpe de Estado de 8 de janeiro de 2023.
Bolsonaro só conseguiu mobilizar 18 mil pessoas numa manifestação a favor da amnistia dos envolvidos na tentativa de golpe de Estado de 8 de janeiro de 2023.EPA/ANDRE COELHO

Bolsonaro chega aos 70 anos no pior momento da carreira

Ex-presidente deve ser considerado réu na próxima terça-feira pelo Supremo, participou em manifestação esvaziada no domingo e vê onda a favor de um sucessor que ainda não abençoou crescer.
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O aniversário de 70 anos de Jair Bolsonaro, que se festeja esta sexta-feira, 21 de março, surge no pior momento político e jurídico da carreira do ex-presidente da República do Brasil. Por um lado, pode ser declarado oficialmente réu pelo Supremo Tribunal Federal (STF), terça-feira, dia 26, no caso da suposta tentativa de golpe de Estado de 8 de janeiro de 2023. Por outro, viu, no domingo, 16, uma manifestação a favor da amnistia dos envolvidos naquele ato ser acompanhada por meras 18 mil pessoas. E ouviu na ocasião Tarcísio de Freitas, governador de São Paulo, fazer um discurso de candidato à presidência no lugar dele, em 2026. 

“Os que assaltaram a Petrobras voltaram à cena do crime”, disse Tarcísio, no palanque de Copacabana, num raro ataque ao governo de Lula da Silva, com quem vem mantendo relação de cooperação, ao aludir ao Petrolão, o caso de corrupção na petrolífera estatal investigado pela Lava Jato. “Ninguém aguenta mais arroz caro, gasolina cara, ovo caro, prometeram picanha e não tem nem ovo”, continuou, em nova ofensiva contra o atual presidente e a subida dos preços dos alimentos e dos combustíveis.

Sobre o tema da manifestação, a amnistia que pode, no limite, tornar Bolsonaro elegível outra vez, Tarcísio, que foi ministro da Infraestrutura do ex-presidente e venceu as eleições para o governo do estado mais rico e populoso do Brasil em 2022, só dedicou palavras de circunstância. Em vez, portanto, de mirar em Alexandre de Moraes, o juiz do STF debaixo do fogo de Bolsonaro e dos bolsonaristas radicais, apontou para Lula, o que foi interpretado como início das hostilidades eleitorais.  

“Elencou itens de discurso de candidato a presidente (...) mas foi bem mais comedido na hora de criticar o Supremo”, escreveu Igor Gielow, analista do jornal Folha de S. Paulo. Para o articulista, Tarcísio, que simbolicamente vestiu o equipamento secundário da seleção do Brasil, de cor azul, por contraste com o amarelo vivo dos demais palestrantes, como o próprio Bolsonaro, “buscou o jogo impossível de ser bolsonarista e moderado ao mesmo tempo”.

“Deixou claro que entendeu o seu papel de ‘plano T’ na disputa pelo Palácio do Planalto em 2026”, acrescentou o colunista Matheus Leitão, da revista Veja, referindo-se a capa da publicação que dizia estar em marcha um “plano T”, de Tarcísio, nos mercados para pressionar o governador paulista a candidatar-se no lugar de Bolsonaro.      

Marco Aurélio Carvalho, advogado de um grupo considerado muito próximo de Lula, viu um velório em vez de uma manifestação. “As manifestações foram um verdadeiro cortejo fúnebre. Bolsonaro foi velado à luz do dia. E Tarcísio já disputa, em frente ao caixão, o legado do defunto”, resumiu.

Segundo sondagem da ONG More In Common e do Monitor do Debate Público do Centro Brasileiro de Análise e Pesquisa, Tarcísio é o preferido para o Planalto no lugar de Bolsonaro por 42% dos 495 manifestantes ouvidos, à frente de Michelle Bolsonaro, ex-primeira-dama, e de Eduardo Bolsonaro, deputado e terceiro filho do presidente, opções mais do agrado de Jair, com 21% e 16%, respetivamente.

Sobre a modesta adesão ao ato – 18 mil pessoas é um número muito abaixo do que Bolsonaro conseguia atrair quando era presidente – o organizador Silas Malafaia, pastor evangélico, culpou o dia e o horário. “Eu disse para o Bolsonaro que domingo de manhã o carioca acorda mais tarde, com praia, se tiver Fla-Flu piora, mas ele disse ‘vamos fazer, vamos fazer’...”.

No plano jurídico, a chamada “primeira turma do STF”, ou seja, cinco dos 11 juízes da corte, irá deliberar no dia 25 se acata ou não a denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR) sobre a suposta tentativa de golpe de Estado tramada após as eleições de 2022.

Entre os denunciados estão, além de Bolsonaro, os generais Walter Braga Netto, ex-ministro da Casa Civil, Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa, e Augusto Heleno, ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional, Anderson Torres, ex-ministro da Justiça, Alexandre Ramagem, ex-diretor da agência brasileira de inteligência, Almir Garnier, ex-comandante da Marinha do Brasil, e Mauro Cid, tenente-coronel do Exército e ex-ajudante de ordens de Bolsonaro que, ao assinar acordo de colaboração premiada, denunciou os demais.

Se a “primeira turma do STF” acatar, Bolsonaro e demais acusados serão considerados réus. Numa fase posterior, depois de ouvidas defesa e acusação, os cinco juízes, todos considerados hostis ao ex-presidente pelos observadores, decidem-se pela condenação ou absolvição.

A PGR considera os denunciados culpados dos crimes de organização criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, dano qualificado por violência e grave ameaça contra o património da União, com considerável prejuízo para a vítima, e deterioração de património tombado.

Juristas estimam que, no máximo, Bolsonaro, aniversariante do dia, pode ser condenado a 39 anos e quatro meses de prisão.  

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