Há quatro anos, o então presidente Donald Trump recusou receber na Casa Branca o presidente eleito Joe Biden (cuja vitória nunca reconheceu). Mas esta quarta-feira o democrata retomou a tradição e abriu a Sala Oval de novo ao republicano. “Bem-vindo de volta”, afirmou Biden, dizendo esperar “uma transição tranquila”. Apesar de toda a animosidade na campanha, o presidente deu-lhe os parabéns pela vitória eleitoral e estava mais sorridente do que Barack Obama, que há oito anos acolheu Trump pela primeira vez na Casa Branca..“A política é difícil e, em muitos casos, não é um mundo muito agradável”, disse Trump, na curta troca de palavras filmada pelos jornalistas no início da reunião. “Mas é um mundo agradável hoje e agradeço muito uma transição tão tranquila... vai ser tão tranquila quanto pode ser”, afirmou, agradecendo a “Joe”. Biden tinha dito que a sua equipa ia fazer todo o possível para garantir essa transição tranquila. Nenhum dos presidentes quis responder às perguntas sobre democracia e a Ucrânia lançadas pelos jornalistas..A reunião, que a Casa Branca qualificou de “cordial” e “substantiva”, incluiu temas de política interna e externa. Durou quase duas horas e não houve declarações no final..A primeira dama Jill Biden cumprimentou Trump quando o presidente eleito chegou à Casa Branca, entregando-lhe uma carta manuscrita para ele dar à mulher, Melania Trump - que recusou estar presente desta vez, ao contrário do que aconteceu há oito anos quando tomou chá com Michelle Obama. A carta inclui os parabéns de Jill Biden assim como a disponibilidade da sua equipa para assistir a de Melania no regresso à Casa Branca..A equipa de Melania Trump tinha emitido mais cedo um comunicado a confirmar que ela não iria a Washington. O texto dizia que era “encorajador” o marido estar a iniciar o processo de transição com este encontro e desejava-lhe “muito sucesso”. O comunicado atacava também os media e as suas fontes, “que continuam a fornecer informações falsas, enganosas e imprecisas”. Em causa podem estar notícias que alegam que Melania irá passar desta vez menos tempo na Casa Branca. “Sejam criteriosos com as vossas fontes de notícias”, acrescentava..Ovação republicana.Antes de voltar à Casa Branca, o presidente eleito esteve no encontro dos congressistas republicanos, num hotel em Washington e foi recebido com uma ovação: “É sempre bom ganhar”, disse. “Ganhámos em todos os sentidos, em todos os sete swing states por muito”, acrescentou. O presidente eleito brincou ainda com a possibilidade de ser eleito para um terceiro mandato. “Suspeito que não voltarei a candidatar-me, a menos que digam, ele é bom, precisamos de pensar noutra coisa”, disse Trump..Quem também foi ovacionado (não uma, mas três vezes) foi o bilionário Elon Musk, recém-nomeado por Trump para o novo Departamento da Eficiência Orçamental (ver caixa). “É uma luz brilhante na sala”, disse à agência AP um dos congressistas presentes, com outro a lembrar que de todos, Musk foi quem deu “o maior apoio” a Trump..As contas da Câmara dos Representantes ainda não estão fechadas - os republicanos estão a um congressista de reter a maioria, quando faltam decidir 11 corridas eleitorais - mas Trump está confiante que o partido vai recuperar a maioria. Uma maioria que já tem garantida no Senado (por 53 contra 47), com os senadores republicanos a eleger ontem o seu futuro líder..O senador John Thune, do Dakota do Sul, vai suceder a partir de janeiro a Mitch McConnell, de 83 anos, que tinha anunciado a intenção de deixar o cargo de liderança (da maioria ou da minoria, consoante as voltas eleitorais) que ocupava desde 2007. Thune, 20 anos mais novo e no seu quarto mandato no Senado, venceu dois adversários - John Cornyn, do Texas, e Rick Scott, da Florida, que tinha conquistado apoios importantes (incluindo de Musk) nos últimos dias..Thune, que venceu a votação secreta entre os senadores, prometeu trabalhar de perto com Trump, apesar de algumas diferenças entre ambos ao longo dos anos. “Esta equipa republicana está unida em torno da agenda do presidente Trump e o nosso trabalho começa hoje”, escreveu no X. O presidente eleito não tinha escolhido um favorito na corrida, só pediu que o futuro líder apoiasse as suas intenções de acelerar as audiências de confirmação da futura Administração..Nomeações polémicas.O presidente eleito dos EUA vai revelando aos poucos os nomes da futura Administração, optando por se rodear de pessoas que lhe são fiéis e supreendendo com algumas escolhas. .Secretário de Estado: O nome já circulava há dias e Donald Trump confirmou: o senador Marco Rubio, da Florida, vai ser o secretário de Estado, responsável pela diplomacia dos EUA. “Vai ser um forte defensor da nossa nação, um verdadeiro amigo para os nossos aliados, e um guerreiro destemido que nunca recuará perante os nossos adversários”, disse o presidente eleito. Rubio, ex-adversário de Trump em 2016, chegou desta vez a ser falado como candidato a vice-presidente. É considerado um “falcão” em relação à China, a Cuba (é filho de imigrantes cubanos) e ao Irão, mas é um dos nomeados com experiência na pasta e que pode até ter o apoio dos democratas. Procurador-geral: É uma das pastas mais importantes na Administração de Trump, tendo em conta a sua história atribulada com a Justiça e os desejos de vingança que expressou. O congressista Matt Gaetz, da Florida, é o escolhido para o cargo de procurador-geral, apesar de ainda ser alvo de uma investigação do Comité de Ética da Câmara dos Representantes por “má conduta sexual” (suposto sexo com uma menor de 17 anos) e “uso ilícito de drogas”. Ele nega as acusações. A nomeação causou choque entre os próprios republicanos. Inteligência Nacional: De querer ser candidata à presidência pelo Partido Democrata em 2020 à Casa Branca de Trump em 2024. A ex-congressista pelo Havai Tulsi Gabbard é a escolhida para diretora da Inteligência Nacional, com o presidente eleito a voltar a dar prioridade às pessoas que lhe são leais, em vez de olhar para a experiência. .Defesa: Muitos olharam para o Congresso à procura de pistas sobre quem seria o próximo chefe do Pentágono, mas Trump olhou para a televisão. Pete Hegseth, veterano de guerrae apresentador da Fox News, foi o escolhido. O autor do livro A guerra contra os guerreiros: por detrás da traição dos homens que nos mantêm livres (tradução literal), de 44 anos, tem-se mostrado contra os programas que promovem a diversidade e inclusão nas Forças Armadas - apelidados de “woke” pelos republicanos. Põe também em causa o papel das mulheres em postos de combate e defende perdoar os militares acusados de crimes de guerra. A escolha de Hegseth não sossega aqueles que temem uma purga no topo do setor da Defesa, já que ele defende a demissão do chefe do Estado-maior Conjunto das Forças Armadas, o general Charles Q. Brown Jr., e de todos envolvidos nesses programas “woke”. Críticos temem a politização das Forças Armadas. Segurança Interna: A governadora do Dakota do Sul, Kristi Noem, chegou a ser pensada para candidata a vice-presidente. Nessa altura, gerou polémica uma das histórias contadas nas suas memórias - de como tinha matado a tiro um cachorro de 14 meses indisciplinado. O cargo de vice-presidente acabou nas mãos de J.D. Vance, mas a história não afasta Noem da futura Administração. Será a secretária para a Segurança Interna, crucial para a agenda de imigração de Donald Trump - trabalhará ao lado do “czar das fronteiras”, Tom Homan. Será também a responsável pela resposta a catástrofes naturais e pelo Serviço Secreto (que ficou em causa após o atentado contra Trump)..Eficiência Governamental: O bilionário Elon Musk e o empresário Vivek Ramaswamy, ex-adversário que se tornou num dos grandes apoiantes de Trump, vão liderar o novo Departamento de Eficiência Governamental. Apesar do nome, este departamento não fará parte da Administração, tendo como objetivo cortar na burocracia governamental mas, principalmente, cortar dois biliões de dólares no orçamento do Governo Federal e restruturar as Agências Federais dos EUA. O presidente eleito disse que “este será o ‘Projeto Manhattan’ do nosso tempo”, referindo-se ao programa que permitiu produzir a primeira bomba atómica. Segurança Nacional: O conselheiro de Segurança Nacional da Casa Branca, responsável por manter Trump informado e coordenar a ação das diferentes agências nesta área, será o congressista Mike Waltz, veterano das Forças Especiais do Exército dos EUA. Diretor da CIA: O ex-congressista John Ratcliffe, que foi diretor dos serviços de inteligência nacional no primeiro mandato de Trump, será desta vez o diretor da CIA. O presidente eleito elogiou o seu trabalho a “expor o falso conluio com a Rússia como uma operação da campanha de [Hillary] Clinton” e a “falar a verdade” sobre o computador de Hunter Biden, filho do presidente Joe Biden. Médio Oriente: Trump nomeou o investidor no setor do imobiliário (e seu parceiro de golfe) Steven Witkoff como enviado especial para o Médio Oriente. Será “uma voz pela paz”, afirmou. Trump também já disse que o ex-governador do Arkansas, Mike Huckabee, será o futuro embaixador em Israel. “Ele ama Israel e o povo de Israel, e da mesma forma, Israel ama-o”, indicou. Huckabee disse em 2017, no colonato de Ma’ale Adumim, que “a Cisjordânia ocupada não existe” e também já disse “que não existe isso de palestinianos”. .susana.f.salvador@dn.pt