Internacional
21 março 2023 às 22h28

Líder japonês responde a Xi em Moscovo com visita a Kiev

Sinal de apoio nipónico à Ucrânia no dia em que o presidente russo admite que o plano de paz chinês pode servir de base para negociações com Kiev.

Ao segundo dia da visita do líder chinês Xi Jinping a Moscovo, o primeiro-ministro japonês Fumio Kishida respondeu com uma viagem surpresa a Kiev - a primeira de um chefe de governo nipónico a um país em guerra desde a Segunda Guerra Mundial. Enquanto Pequim estreita relações com a Rússia, e vê o presidente russo aceitar a proposta de paz "como base para um acordo", Tóquio deu um importante sinal de compromisso para com a Ucrânia, e convidou o presidente Volodymyr Zelensky a participar na próxima Cimeira do G7, que se realizará em Hiroxima, em maio.

O primeiro-ministro japonês iniciou o dia com uma visita guiada a Bucha, onde expressou "forte indignação pelos atos cruéis" dos invasores, mais tarde prestou homenagem aos soldados mortos e por fim encontrou-se com Zelensky, com quem assinou uma declaração conjunta sobre a parceria conjunta.

A deslocação de Kishida à capital ucraniana, apelidada de "histórica" pela vice-ministra dos Negócios Estrangeiros ucraniana Emine Dzhaparova, por muito alcance geopolítico e simbólico que tenha, não conseguiu superar o frisson das declarações do líder russo em resposta ao plano chinês para acabar com o que o Kremlin designa de "Operação Militar Especial".

No final da cimeira bilateral, ao lado de Xi Jinping, Vladimir Putin mostrou-se recetivo a adotar o plano de 12 pontos - ou parte dele. "Acreditamos que muitas das disposições do plano de paz apresentado pela China estão de acordo com as abordagens russas e podem ser tomadas como base para um acordo de paz quando o Ocidente e Kiev estiverem prontos para ele", afirmou.

O plano tem algumas considerações genéricas, como a rejeição liminar de uma guerra nuclear - e nesse ponto ambos os líderes lavraram na capital russa uma declaração nesse sentido -, mas também pontos que agradarão a Moscovo, como o fim imediato das sanções económicas; uma trégua e o início de conversações de paz; e o "fim da mentalidade da Guerra Fria".

Este último ponto, uma crítica velada à NATO na qual se defende "os legítimos interesses e preocupações de segurança" e que "a segurança de uma região não deve ser alcançada através do reforço ou da expansão de blocos militares", encontrou também eco na cimeira sino-russa: noutra declaração conjunta, os líderes acusaram a Aliança Atlântica de "minar a paz e a estabilidade regional" e mostraram-se "muito preocupados com o reforço crescente" da associação da NATO com os países do Indo-Pacífico.

Por outro lado, a proposta chinesa defende a soberania, independência e integridade territorial de todos os países, um choque frontal com a pretendida anexação das quatro regiões ucranianas parcialmente ocupadas, além da Crimeia, anexada em 2014. Até agora, o regime russo disse que futuras negociações teriam como ponto de partida as "novas realidades territoriais". Do lado ucraniano, uma vez que a sua pré-condição de as tropas ocupantes abandonarem o território não faz parte do documento, o plano foi visto com ceticismo.

DestaquedestaqueAntes de Xi e Putin elogiarem a "parceria estratégica", a Ucrânia anunciou a destruição de mísseis de cruzeiro russos na Crimeia, com recurso a drones chineses.

O líder russo disse que passou muito tempo a discutir a proposta com o homólogo chinês, enquanto este, sem se desviar um milímetro da posição oficial de Pequim, disse apoiar conversações para resolver o que chama de "crise ucraniana", e sobre a qual disse que o seu país manteve em todo o momento uma perspetiva "objetiva e justa". É esperado que Xi Jinping fale com Zelensky em breve.

A posição ucraniana foi defendida pelo secretário-geral da NATO. "A China precisa de começar a compreender a perspetiva da Ucrânia e de se relacionar diretamente com o presidente Zelensky se quiser empenhar-se seriamente na paz", disse Jens Stoltenberg. Na mesma ocasião, elogiou alguns pontos da iniciativa chinesa, mas em linha com o que o secretário de Estado dos EUA Antony Blinken havia advertido na véspera, sobre a hipótese de esta iniciativa ser apenas "uma manobra dilatória", o norueguês disse que uma trégua desrespeitadora da soberania ucraniana "será apenas uma forma de congelar a guerra e assegurar que a Rússia possa recompor-se, reagrupar-se e voltar a atacar".

Antes de Xi e Putin anunciarem 14 acordos e elogiarem a "parceria estratégica" entre os dois países, a Ucrânia enviou uma mensagem a ambos. Segundo a Divisão de Informação do Ministério da Defesa, dois dias depois de Putin ter visitado a península da Crimeia e no primeiro dia de visita de Xi à Rússia, vários mísseis de cruzeiro russos Kalibr foram destruídos.

"Uma explosão na localidade de Dzhankoi no norte da temporariamente ocupada Crimeia destruiu mísseis de cruzeiro russos Kalibr NK quando eram transportados por ferrovia", foi anunciado. Alegados destroços de drones de fabrico chinês Mugin-5, que terão sido usados na operação tinham autocolantes com memes inspirados na antiga estrela chinesa de basquetebol Yao Ming. Segundo Moscovo, não houve mísseis destruídos, apenas drones abatidos pela defesa antiaérea.

cesar.avo@dn.pt