Acordo político para cargos europeus “é duplamente positivo”
Como encara a perspetiva de um entendimento no Conselho Europeu, agora que há um acordo entre as famílias políticas?
É duplamente positivo. Primeiro, para os que acreditam no projeto europeu e que as principais famílias políticas devem continuar a liderar o futuro da União Europeia, sem ambiguidade ou cedência à extrema-direita e aos populistas. Segundo, porque António Costa é um europeísta e um português com uma visão sobre a Europa alinhada com os interesses de Portugal. Ele é muito respeitado na Europa, especialmente no Conselho Europeu. Espero que o acordo se confirme e que a Europa resolva rapidamente a situação dos cargos de topo para enfrentar os muitos desafios que temos pela frente.
A primeira reação de um membro do Conselho Europeu foi a de Viktor Orbán, que critica o acordo. Surpreende-o?
De Orbán, é o esperado. Quando a Europa avança e encontra consensos é natural que Orbán esteja em desacordo. A mim, a Europa avançar satisfaz-me, mas para Orbán e o seu regime não. Portanto, essa reação não me surpreende.
Uma vez ratificado o acordo pelos 27, vê alguma possibilidade de no Parlamento Europeu o nome de Von der Leyen ser posto em causa e não recolher apoios suficientes?
É evidente. Basta olhar para a matemática. Ursula von der Leyen foi eleita por nove votos há cinco anos. Com a redução do número de deputados do grupo liberal, o risco aumenta. Defendemos que a maioria pró-europeia deveria incluir os Verdes. Continuaremos a insistir nisso, mesmo que o PPE tenha mostrado menos abertura. Esperamos resolver isso a tempo das votações dos cargos.
A geometria política do acordo não parece fácil. Seria negativo para o Parlamento Europeu se for visto como um entrave para a eleição da presidência da Comissão Europeia?
Esta é a democracia europeia. O presidente da Comissão deve ser votado pela maioria dos deputados do Parlamento Europeu. Não é um entrave, são as regras estabelecidas. Procuramos coligações das forças pró-europeias para fazer avançar a União Europeia com consensos e não na base de confrontações entre as famílias pró-europeias. Se houver razoabilidade, poderemos resolver esta situação e avançar com as instituições.
Georgia Meloni é deixada de fora do acordo, mas sonha com uma vice-presidência da Comissão. Conhecendo o percurso político e as ideias do Irmãos de Itália, parece-lhe sensato que seja dado um cargo tão importante a um comissário nomeado por Meloni?
Desde o início estabelecemos que os Socialistas e Democratas europeus não estariam em negociações onde estejam a extrema-direita europeia, incluindo o ECR. Não tenho conhecimento de negociações concretas com Meloni. Entendemos a importância da Itália, mas não participaremos em acordos formais com a extrema-direita. Cada governo indicará os seus comissários e a presidente da Comissão constituirá o Colégio e atribuirá competências. Não estaremos em negociações com a extrema-direita.
O argumento de Meloni, expresso pelo seu ministro dos Negócios Estrangeiros Antonio Tajani, é que Itália é país fundador, com uma economia industrial poderosíssima e que não faz sentido não ter um reconhecimento de alto nível. Não faria também sentido haver esse reconhecimento para um país como Itália?
Esse argumento poderia ter sido válido há cinco anos, quando um comissário progressista foi indicado e não houve reclamações. O senhor Tajani sabia com quem estava a negociar e formar governo na Itália com a extrema-direita. Isso tem consequências para uma família política como a nossa na perspetiva europeia.
Atribuir uma pasta importante a alguém escolhido por Meloni não abre caminho para a extrema-direita francesa, reforçada nas eleições europeias, também fazer as suas exigências?
Há um cenário complexo em vários países europeus, incluindo França. O presidente Macron, após as eleições europeias, marcou eleições legislativas rapidamente, sem muito espaço para debate, aumentando o risco de a extrema-direita ganhar poder. A nós preocupa-nos muito. Temos uma alternativa clara com o Partido Socialista Francês. Esperamos que os franceses compreendam as consequências de uma votação forte na extrema-direita. Aumentar o peso político de aliados de Putin e anti-projeto europeu é preocupante.
Como vê a legislatura que está prestes a começar? Antevê um ciclo político mais difícil dada a fragmentação política?
Os próximos cinco anos serão de desafios impressionantes para a Europa. A extrema-direita cresceu e pesa em países importantes como Itália e França. A guerra na Ucrânia, se terminar com uma vitória da Rússia, seria uma ameaça permanente. Se a Ucrânia vencer, enfrentaremos a adesão de novos países e um alargamento sistémico da União Europeia. Teremos um novo Quadro Financeiro Plurianual e a necessidade de encontrar alternativas energéticas. Precisamos de mais independência económica e de políticas sociais para reduzir desigualdades. Todos esses desafios estarão presentes nos próximos cinco anos, tornando-os desafiantes e apaixonantes para o projeto europeu.