Donald Trump mostrou-se satisfeito pelo facto de o humorista Jimmy Kimmel, apresentador do programa Jimmy Kimmel Live!, estar fora do ar e pediu à NBC para que outros dois venham a ter o mesmo destino. Hollywood e a oposição democrata, incluindo o ex-presidente Barack Obama, reagiram a mais um capítulo do folhetim do presidente dos Estados Unidos na sua relação conflituosa com os meios de comunicação.“Ótimas notícias para a América: o programa Jimmy Kimmel, que enfrentava dificuldades de audiências, foi cancelado. Parabéns à ABC por finalmente ter a coragem de fazer o que precisava ser feito”, escreveu Trump no Truth Social a propósito da suspensão, “por tempo indeterminado”, do referido programa, anunciado na véspera, na sequência das críticas de Kimmel aos apoiantes de Trump após o assassínio do nacionalista Charlie Kirk. .Jimmy Kimmel suspenso "por tempo indeterminado" pelos comentários que fez sobre Charlie Kirk.Mais tarde, questionado sobre a liberdade de expressão e o aparente despedimento do humorista, Trump disse: “Foi demitido sobretudo porque tem más audiências. Ele disse uma coisa horrível sobre um cavalheiro que era Charlie Kirk. Jimmy Kimmel é uma pessoa sem talento. Ele já devia ter sido demitido há muito. Pode-se falar de liberdade de expressão ou não, ele foi demitido por falta de talento.” A apreciação do presidente dos EUA sobre o comediante não é nova. Em julho, ao regozijar-se com o fim anunciado do programa de Stephen Colbert, disse: “Kimmel é o próximo.” .“Tivemos um fim de semana inteiro deles [MAGA] a plantar sementes de dúvida, a insinuar que o atirador era um agente federal, ou antifa, ou qualquer coisa para evitar a realidade de que a retórica de ódio que eles vomitam todos os dias tem consequências.”Jimmy Kimmel. Quer num caso, quer no outro, as empresas envolvidas têm negócios dependentes da aprovação da Comissão Federal de Comunicações (FCC, na sigla em inglês), a agência reguladora das emissoras de rádio e televisão. Regulador ou comissário político? Foi Brendan Carr, de 46 anos, presidente da Comissão Federal de Comunicações (FCC), quem desencadeou a suspensão de Jimmy Kimmel, ao declarar num podcast que o comediante faz parte de “um esforço concertado para enganar o povo americano”, e deixou no ar uma ameaça: ”Podemos fazer isso da maneira fácil ou da maneira difícil. Essas empresas podem encontrar maneiras de mudar a conduta e tomar medidas em relação a Kimmel, ou então haverá trabalho adicional para a FCC pela frente.” Advogado e funcionário da FCC desde 2012, Carr ascendeu a comissário em 2017, pela mão dos republicanos. É o autor do capítulo sobre os media no programa de governo Projeto 2025. Nessa cartilha, Carr acusava as grandes empresas de tecnologia de censura e defendia que a FCC deveria controlá-las..“É um momento muito perigoso para a democracia constitucional dos EUA. Temos o presidente da FCC a agir como um comissário comunista.”Jamie Raskin, representante democrata.No seguimento das declarações do presidente da FCC, a empresa de comunicação Nexstar, proprietária do maior número de estações de TV dos EUA, anunciou à ABC, propriedade da Disney, que iriam deixar de retransmitir o Jimmy Kimmel Live! devido aos “comentários ofensivos e insensíveis” do apresentador. Acontece que a Nexstar aguarda pela aprovação da fusão com outra empresa, a Tegna. Um negócio de 6,2 mil milhões de dólares que a lei impede, uma vez que nenhuma empresa de transmissão de TV pode chegar a mais de 39% dos lares norte-americanos. Mas o presidente da FCC já se mostrou favorável ao fim dessa limitação. Em julho, a CBS chegou a acordo com Trump sobre um processo judicial em que este se queixou de tratamento injusto na campanha eleitoral, em 2024, e pagou uma indemnização de 16 milhões de dólares. Seguiu-se o anúncio da CBS de que o programa The Late Show, apresentado por Steven Colbert - outra voz crítica de Trump - iria acabar. Uma semana depois, a empresa proprietária da estação, Paramount, viu ser dada luz verde pela FCC para a aquisição da Skydance Media por 8 mil milhões de dólares.“Isto deixa Jimmy [Fallon] e Seth [Meyers], dois completos perdedores, na Fake News NBC. As suas audiências também são péssimas. Faça isso, NBC!!”, escreveu Trump na mensagem na sua rede social em que saudou o despedimento de Kimmel. Este apelo ou ameaça inscreve-se num padrão de vingança a todos os meios que não se dobram ao presidente. Em 2023, ainda longe de regressar à Casa Branca, dizia que “os meios de comunicação de notícias falsas deveriam pagar um preço elevado pelo que fizeram ao nosso país outrora grandioso!”. Uma vez na presidência, instalou um homem de mão na FCC, o qual de pronto lançou investigações sobre o financiamento do canal de TV PBS e da rádio NPR (ambos meios públicos) e outra à política de diversidade do grupo Comcast, proprietário dos canais NBC e MSNBC. A agência Associated Press ficou sem acesso à Sala Oval e ao avião presidencial porque recusou seguir a ordem executiva que renomeia o Golfo do México para Golfo da América. O caso está em tribunal. A mesma ABC que suspendeu o programa de Kimmel já havia chegado a acordo extrajudicial com Trump em dezembro. A estação pagara 15 milhões de dólares porque um apresentador disse que o nova-iorquino fora condenado pela “violação” de E. Jean Carroll, quando a condenação civil deveu-se a “abuso sexual”. Mais recentemente, a ira do presidente virou-se para os jornais. Primeiro o The Wall Street Journal, por ter publicado a notícia de que Trump endereçou uma carta obscena a Jeffrey Epstein; há dias o The New York Times e a editora Penguin, por terem publicado notícias a pôr em causa o sucesso das suas políticas. Ao primeiro exige 10 mil milhões, aos segundos 15 mil milhões de dólares.O vice-presidente juntou-se à sanha contra os media. Depois de ter sugerido que as empresas deviam despedir funcionários que tenham celebrado a morte de Kirk, J.D. Vance ameaçou retirar as isenções fiscais a duas fundações (Ford e Open Society) por alegadamente financiarem a revista The Nation, a qual publicou um artigo cujo título é “O legado de Charlie Kirk não merece luto”. .“O que Jimmy disse foi liberdade de expressão, não discurso de ódio. As pessoas parecem querer proteger a liberdade de expressão apenas quando serve a sua agenda.”Jean Smart, atriz. Perante este clima, as associações profissionais de Hollywood e alguns atores saíram a terreiro criticar a suspensão do programa. Um grupo de congressistas do Partido Democrata pediu a demissão do presidente da FCC. Barack Obama também reagiu: “Após anos de queixas sobre a cultura de cancelamento, a atual administração elevou-a a um nível novo e perigoso ao ameaçar rotineiramente com ações regulatórias as empresas de comunicação, a menos que estas silenciem ou demitam jornalistas e comentadores que não agradam.” .“Dececionado” com Putin . Apesar da desilusão, Trump não deu indicações de ter na manga uma iniciativa para levar ao fim da guerra na Ucrânia. A visita de Estado do presidente dos Estados Unidos ao Reino Unido - o único chefe de Estado distinguido com tal honraria em duplicado - foi um sucesso nas palavras da equipa de Donald Trump. O primeiro-ministro britânico também pode ripostar a quem o criticou e ao rei Carlos pela onerosa visita ao anunciar “o maior pacote de investimento da história britânica” alcançado com empresas norte-americanas, avaliado em 150 mil milhões de libras (cerca de 173 mil milhões de euros). Quem tivesse expectativas sobre desenvolvimentos nas principais crises internacionais terá ficado desiludido, tal como Trump se afirmou em relação ao líder russo..Trump disse que discorda de Starmer no reconhecimento da Palestina, bem como nas políticas de imigração e de energia..Ao responder a uma pergunta na conferência de imprensa realizada no final da visita, na casa de campo do primeiro-ministro, Chequers, o presidente dos Estados Unidos voltou a dizer que acabou com sete conflitos, mas não com a guerra na Ucrânia. “Aquele que eu pensei que seria mais fácil, por causa da minha relação com o presidente Putin. Mas ele dececionou-me, realmente dececionou-me” disse. No entanto, nada adiantou sobre novas iniciativas para levar o russo à mesa de negociações. Disse não estar arrependido de ter recebido Putin no Alasca, e não se mostrou preocupado com os efeitos da guerra no seu país, voltando a dizer que há um oceano a separar a Europa dos EUA. Já Keir Starmer pouco mais disse além de que é necessário exercer pressão sobre o Kremlin. No que respeita a Gaza, é de esperar que nas próximas horas Londres anuncie formalmente o reconhecimento do Estado palestiniano. Starmer disse que ambos “concordam absolutamente sobre a necessidade de paz e de um roteiro porque a situação em Gaza é intolerável”. Trump preferiu destacar a urgência da libertação dos reféns em cativeiro pelo Hamas desde 7 de outubro de 2023, e destacou a “discordância com o primeiro-ministro nesse ponto”, em referência ao reconhecimento da Palestina. Mais tarde, já em declarações no Air Force One, Trump disse também não estar alinhado com o trabalhista nas questões da imigração e da energia. Na conferência de imprensa, sugeriu a exploração de petróleo no Mar do Norte por parte dos britânicos e desconsiderou a energia eólica, “uma piada cara”.Durante a visita, o governo britânico anunciou ter atraído investimentos no valor de 150 mil milhões de libras, dois terços dos quais da gestora de ativos Blackstone, num compromisso que estará em vigor ao longo da próxima década. “Os acordos e investimentos que anunciámos batem todos os recordes”, afirmou Starmer. Para Trump, a parceria económica faz parte do “vínculo indestrutível” entre os dois países.