Exposto às intempéries, alvo de apedrejamentos, casa para multidões de ratos, o enorme paquiderme entregou a sua estrutura em gesso, ao longo de décadas, aos maus tratos e incúria. Aquele que em 1810 fora proclamado como um monumento máximo à glória militar de Napoleão Bonaparte, uma réplica de elefante em bronze, encimada por uma torre (howdah) e circundada por uma fonte, tornara-se em meados da década de 1820 uma promessa decadente. Os parisienses teriam de aguardar perto de duas décadas, até julho de 1846, para assistirem ao epílogo da história do Elefante da Bastilha, monumento que não passou de uma maqueta moldada em gesso à escala real. Aquando do desmantelamento da estrutura, todos os materiais aproveitáveis foram vendidos para uma segunda existência..O Elefante da Bastilha representava, no início do século XIX, a nova vida que os parisienses procuravam para o local onde, antes da Revolução de 1789, se erguia a fortaleza da Bastilha. Destruída esta, sucedeu-lhe no local, em 1791, uma fonte alegórica egípcia, com a divindade Ísis com os seios em generosa oferta de água. Uma dupla de leões ladeava Ísis. A fonte de La Régénération conformou-se a uma vida efémera na nova Bastilha. No dealbar do século XIX, Bonaparte, chamava a si o projeto daquela que seria uma memorável fonte parisiense, um colosso de pedra e bronze com 16 metros de comprimento, 24 metros de altura e 170 toneladas de peso. A partir de 1806 e ao longo de duas décadas, arquitetos como Jacques Cellerier e Jean-Antoine Alavoine, tomaram em mãos o projeto e a sua viabilidade. À fonte em forma de paquiderme não lhe bastaria ser grande, havia que dar mostra das conquistas militares napoleónicas. No dorso do paquiderme "viajaria" um guerreiro grego armado de lança, numa alusão de Napoleão a Alexandre, o Grande..A glória ao Primeiro Império Francês que se pretendia projetado na estátua em bronze não era consensual entre nomes maiores da arquitetura. Pierre-François-Léonard Fontaine opôs-se ao projeto, dada a manifesta desproporção da estátua face ao edificado envolvente. Com a década de 1820, esmoreciam as pretensões à conclusão da obra. Após 1830, com a queda, anos antes, de Napoleão Bonaparte, o projeto do paquiderme da Bastilha foi abandonado em prol da Coluna de Julho, assente na base que serviria de pouso ao elefante brônzeo..Para a posteridade ficou o projetado Elefante da Bastilha, talhado nas palavras que o escritor francês Victor Hugo, lhe dedicou na sua obra de 1862, Os Miseráveis: "Ele ali estava, no seu canto, sombrio, doente, desmoronado, cercado por uma paliçada podre. Era imundo, despojado, repulsivo e soberbo, feio aos olhos do burguês, melancólico aos olhos do pensador"..O Elefante da Bastilha não foi ato único, nem inaugural, na arquitetura elefantina parisiense. Em 1748, finda a Guerra de Sucessão Austríaca, assinado o Tratado de Aquisgrão, a cidade de Paris decidiu erigir um monumento em honra de Luís XV. Entre as dezenas de propostas apresentadas pela mão de arquitetos franceses, uma destacou-se pela sua excentricidade. Charles François Ribart, arquitetou aquele que ganhou o nome de Elefante Triunfal. Rodeado de bosques e águas, a culminar os jardins dos Campos Elísios, projetados em 1667 por André Le Nôtre, erguer-se-ia um monumento com a altura de cinco andares. Na colina elevada de Étoile, projetava Ribart o seu elefante, alinhando-o num eixo que corria até ao Palácio das Tulherias..Charles François Ribart olhava para a obra do italiano Gian Lorenzo Bernini que, na Roma de 1667, apresentara a escultura de um elefante encimado por um obelisco egípcio do século I a.C. À Paris do século XVIII, o arquiteto pretendia oferecer um paquiderme numa escala diferente daquele que repousava na romana Piazza della Minerva. O Elefante Triunfal, cavalgado pela estátua de Luís XV, flanqueado por espólios da guerra, alojaria no seu âmago várias câmaras decoradas ao estilo rococó. Próximo da cauda, uma sala de refeições, reproduziria na decoração o cenário de uma floresta, corrida por um ribeiro e servida por uma mesa basculante, de forma a permitir a troca de serviço sem a presença de criados. Na sala do trono, a pintura mural representaria cenas do passado e futuro. Numa oferta à cidade, Ribart imaginava as orelhas do elefante como enormes transmissores da música tocada por uma orquestra. A fértil veia criativa de Charles François imaginava réplicas em miniatura do seu Elefante Triunfal, povoando jardins e parques franceses..A desproporção do projeto de Ribart gerou atração e repulsa na sociedade francesa. Pierre Patte, arquiteto, publicou em 1758 um trabalho de apologia e de apresentação do projeto. Intitulou-o Architecture singuliere. L"éléphant triomphal. Grand kiosque à la gloire du Ro, para comparar o monumento pensado por Ribart a congéneres noutras latitudes, como o Grande Buda de Leshan, escultura chinesa, talhada na rocha, datada do século IX d.C..Quer o projeto, quer o livro que lhe sucedeu, mereceram as palavras pouco abonatórias do crítico literário e jornalista francês Elie Fréron, expondo ao ridículo o monumento que "fazia uma sala de jantar no traseiro do elefante"..Charles François Ribart seria recordado como um arquiteto de papel, fadado a projetos inexequíveis. Reprovado o projeto do Elefante Triunfal pela cidade de Paris, o local apontado para a sua construção serviria à consagração das vitórias militares de Napoleão Bonaparte. Este, em 1806, ordenou a construção do Arco do Triunfo, após a vitória em Austerlitz. Em 1836, o arco triunfal mereceu inauguração. A capital francesa esqueceu o elefante de Charles François Ribart..dnot@dn.pt