Especulação nos supers? Populismo é isto!

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Em janeiro de 2023, no índice de preços de produtos agrícolas no produtor, observaram-se variações positivas na batata (+99,5%), nos hortícolas frescos (+86,8%), nos ovos (+76,9%), nos suínos (+70,5%), no azeite a granel (+65,4%), nas aves de capoeira (+28,4%), nos bovinos (+15,0%), nos ovinos e caprinos (+13,9%), nas plantas e flores (+8,6%) e nos frutos (+0,3%)."

A frase é retirada do Boletim Mensal da Agricultura e Pescas de janeiro de 2023 do INE. E para que não haja mal entendidos, traduz a subida de preços a que os alimentos são comprados a quem os produz. No campo.

Em média, os produtos agrícolas foram vendidos por quem os planta, cuida e colhe 36% mais caros do que um ano antes e os vegetais 27% acima de janeiro de 2022. Antes de chegarem às prateleiras dos supers, esses produtos tiveram de ser transportados, armazenados, alguns deles transformados e manuseados. Cada um desses passos implicando custos acrescidos pela inflação, que se fixou numa taxa anual de 7,8%, fazendo subir ainda mais a fatura imputada às mercearias, supers e hipermercados onde são vendidos a quem os consome.

Antes que se caia na tentação de julgar que os culpados são então os "produtores gananciosos", há que recordar os números revelados também pelo INE e que traduzem a escalada dos custos nos fatores de produção. Ou seja, quanto estão os agricultores, criadores de gado e afins a pagar a mais para ter as mesmas colheitas ou alimentar os mesmos animais.

Num ano, os adubos e fertilizantes ficaram 93% mais caros, o preço da energia e lubrificantes subiu 41%, a ração para animais aumentou 35%, o gasóleo agrícola/combustíveis teve uma escalada de quase 42%. Não foi só a inflação a pesar, foi a seca (registou-se a segunda pior campanha de cereais dos últimos 105 anos), foi o clima, foi a quebra de produção europeia devido à guerra na Ucrânia. E foi o atraso inexplicável na chegada dos já magros apoios dispensados ao setor primário por um governo que acumula oito anos sem querer saber de quem vive do campo e por uma ministra da Agricultura que despreza os agricultores.

Pelo cabaz de produtos alimentares que a DECO vem analisando, os portugueses pagaram em fevereiro de 2023 mais 24% do que um ano antes. Bem abaixo do mero aumento no produtor: os tais 36%. Uma média que ainda menos traduz a escalada dos referidos exemplos de batata, ovos, vegetais, carne de porco e azeite, todos a sair dos campos quase ao dobro do preço que custavam no arranque de 2022.

Ao anunciar um plano de fiscalização e acompanhamento do preço dos alimentos, lançando uma inominável suspeita sobre todo o setor da distribuição e usando a ASAE como instrumento de propaganda, o ministro da Economia afirmou que quer perceber toda a cadeia de alterações no custo da comida.

Porque não consultou então previamente o Instituto Nacional de Estatística é uma incógnita que ultrapassa quem procura informar-se para entender a subida de preços. Mas é uma dúvida que, naturalmente, não assalta a classe média (e menos ainda os mais pobres) que luta para pagar as contas porque o desconto no combustível e o cheque de 125 euros de Medina não fazem frente a um ano de inflação galopante.

A comida custa agora menos em Espanha do que aqui? É natural, considerando que Sánchez cortou o IVA do gás de 21% para 5% a meio do ano passado e eliminou - repito, eliminou - o IVA nos alimentos básicos, reduzindo a metade o imposto que cobra numa série de outros, como o azeite e as massas (5%). É normal, se os custos de produção são mais caros em Portugal em praticamente todas as parcelas (combustíveis, energia, transporte, fertilizantes, etc.), provocando um efeito em cadeia nos preços a cada passo dado por um bem alimentar.

E os bandidos são os supermercados?!

Obviamente mais vulneráveis e ainda predispostos a acreditar que há genuína boa vontade na ação deste governo, muitos portugueses não se lembram sequer que os preços que pagam estão, além de tudo o mais, também inflacionados nos impostos.

Vale a pena referir que os mesmos governantes - que acusam a distribuição de especular sobre os preços a que vende os produtos - ficam calados e a esfregar as mãos perante o brutal aumento de receita fiscal obtido em 2022. Foram perto de 7 mil milhões de euros a mais que tiraram dos bolsos dos contribuintes num só ano. Metade desse valor adicional veio à custa do IVA (a mesma percentagem sobre preços mais caros).

As mãos que no último ano arrebanharam 21 mil milhões de euros só em IVA são as mesmas que antes aplaudiam os supermercados como heróis da pandemia e agora os apontam como vilões - como já fizeram com os agricultores, os médicos, os professores...

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