Compreender a Depressão
12 julho 2021 às 12h40

Sexualidade e depressão: as barreiras que deve ultrapassar sobre esta relação

A intimidade e a depressão têm uma relação muito complexa. Por isso, é necessário questionar e procurar ajuda sem inibições, salienta a especialista em Psiquiatria Ema Conde. Perceba melhor como esta patologia afeta a capacidade de sentir prazer e autoestima.

A relação entre sexualidade e depressão é complexa, multifatorial e bidirecional. Num doente deprimido que, tipicamente, apresenta compromisso no humor, energia vital, capacidade para sentir prazer e autoestima, é compreensível que exista maior propensão para desenvolver alterações do desejo, da excitação, do orgasmo e da satisfação sexual.

A disfunção sexual resultará não só dos efeitos diretos da depressão, mas também do impacto que esta tem na funcionalidade, uma vez que geralmente há retração da vida social e perda de oportunidades para o estabelecimento de vínculos afetivos e sexuais. Por outro lado, a mera existência de dificuldades sexuais poderá ser suficiente para desenvolver sintomas depressivos ou contribuir para o seu agravamento.

Importa também explorar a relação entre o funcionamento sexual e os fármacos antidepressivos, ferramentas essenciais no tratamento da depressão moderada a grave. De facto, sendo verdade que alguns fármacos podem precipitar ou potenciar alterações na função sexual, existem várias opções medicamentosas disponíveis que não interferem com a esfera sexual ou o fazem apenas marginalmente.

Muitos destes efeitos são transitórios ou controláveis com ajustes na dose, posologia, tratamentos coadjuvantes ou alterações no estilo de vida. Mais ainda, os seus efeitos secundários podem até ser "aproveitados" para tratar algumas disfunções sexuais. Finalmente, a recuperação clínica sob tratamento farmacológico poderá contribuir positivamente para a melhoria do desejo, atividade e satisfação sexual.

Ainda que se reconheça que a coocorrência de depressão e disfunção sexual possa contribuir para má adesão terapêutica, este tópico continua a ser negligenciado na prática clínica. As barreiras à abordagem da sexualidade podem identificar-se nos doentes, por razões culturais, por embaraço ou mesmo por não acharem o tópico pertinente ou passível de resolução.

Há também barreiras a condicionar os clínicos, quer decorrentes de desconforto dos próprios, quer da adesão a argumentos espúrios de que a vida sexual e a intimidade são assuntos da esfera privada e que os doentes não esperam (nem apreciam) a sua discussão, ou que o farão espontaneamente se lhes for relevante. Adicionalmente, ao hierarquizarem os objetivos do tratamento, tendem a privilegiar as competências que visam a proficiência nas áreas ocupacionais e de lazer.

Certo é que, sempre que clinicamente relevante, os médicos devem abordar diretamente as questões relacionadas com a função sexual, fazendo-o de forma aberta, empática, num contexto adequado e privado. Só assim será possível envolver ativamente os doentes no seu processo terapêutico, potenciando a adesão ao tratamento e melhorando o prognóstico da doença.

A completa reabilitação do doente dependerá de uma abordagem individualizada, flexível e multidisciplinar que combine intervenções médicas, psicoterapêuticas e psicoeducativas em todas as dimensões do indivíduo, incluindo a sexual. Na doença e na intimidade, questione-se, questione e procure ajuda sem receios ou inibições.