Álcool e Depressão: a relação que se deve evitar
O consumo de álcool é uma prática comum e socialmente aceite, que habitualmente relacionamos com a confraternização e momentos de prazer. O beber para socializar, para desinibir, ou para passar bons momentos, está culturalmente impregnado no nosso ADN.
Em Portugal, temos das maiores taxas de consumo per capita de álcool do mundo, com preocupação especial para as faixas etárias mais jovens e para o agravamento dos consumos de risco ou de dependência na população em geral. Outras evoluções negativas preocupantes têm surgido em alguns subgrupos populacionais, como nas mulheres e nos mais velhos.
Mas qual é o problema desta realidade? Na verdade, as suas pesadas consequências, com destaque para a relação com a depressão.
O álcool, contrariamente ao que pensamos, atua como um depressor de diversas ações do Sistema Nervoso Central, representando nos dias de hoje um dos mais importantes fatores de risco para a depressão. Contudo, de forma não percetível.
Se num consumo inicial e em pequenas quantidades, promove desinibição e euforia, facilitando o contacto social e o prazer; o aumento progressivo da quantidade e da frequência do consumo; facilita o desenvolvimento de alteração do humor, com desanimo e tristeza mais fácil; diminuição da sensação de prazer e do bem-estar nas atividades de vida diária; e intensificação dos pensamentos negativos.
Como resultado, gera-se muitas vezes um círculo vicioso, uma vez que, um próximo consumo de álcool leva a um novo alívio temporário destes sintomas, fazendo esquecer o posterior agravamento.
É neste contexto clínico que se consegue entender o que os estudos epidemiológicos evidenciam, nomeadamente, uma maior prevalência de sintomas depressivos e depressão entre consumidores de álcool, assim como, uma maior propensão ao uso abusivo e de dependência de álcool entre os doentes depressivos, não esquecendo a maior gravidade clínica e taxa de suicídio, nestas duas condições em simultâneo.
A este respeito, recordo uma consulta recente, de um adulto jovem, sem história psiquiátrica prévia, levado à consulta pelos pais, por presença de ideias de morte recorrentes e isolamento marcado no quarto há cerca de 3 meses.
O isolamento pandémico e a rutura recente do relacionamento afetivo, facilitaram o uso de álcool, que promovia o esquecimento deste mau momento da sua vida e aliviava o sofrimento. Contudo, e tal como descrito, o círculo vicioso estabeleceu-se rapidamente, originando uma perda de controlo no consumo de álcool e o agravamento da depressão, justificando a presença das ideias de morte.
Em conclusão, surge a certeza de que o consumo abusivo e a dependência de álcool constituem fatores importantes de agravamento e desenvolvimento depressivo, assim como, a presença de uma perturbação de uso de álcool, surge mais frequentemente entre doentes com depressão.
Neste contexto, a procura de ajuda especializada e atempada, deve ser tida em conta, uma vez que, quer a depressão quer as problemáticas aditivas têm tratamento.