Bolonha

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Nos últimos meses, o ensino superior tem vindo a ser palco de uma revolução. Quase ninguém, tirando os mais interessados, terá, talvez, dado por isso, mas a moldura administrativa e intelectual em que se desenrolava, até agora, a formação de graduados e pós- -graduados está em vias de sofrer, por força da aplicação da Declaração de Bolonha, uma alteração sem precedentes. Não se trata de uma questão de formulários e preenchimento de papelada, ou do clássico mudar alguma coisa para que tudo fique na mesma. Muito simplesmente, a partir de Setembro próximo, a universidade tradicional tem os seus dias contados.

A mudança, deve reconhecer-se, tem algumas vantagens, a principal das quais é introduzir alguma racionalidade no sistema. Após décadas de crescimento caótico, durante as quais as tentativas para o adaptar à massificação só contribuíram para o descaracterizar e descredibilizar, o ensino superior precisa de definir um núcleo essencial de formação para cada área, a partir do qual se poderão desenvolver múltiplas especializações ou novas graduações. Insistir, à partida, no tudo ou nada de uma formação tradicional, de longa duração, para todos os que pretendem ir mais além do ensino secundário, só serve para prolongar o actual masoquismo de uma universidade que se culpabiliza e que toda a gente critica por não fazer uma coisa que é humanamente impossível.

Bolonha acarreta, além disso, maior internacionalização e transparência. Ao obrigar cada escola a organizar, de raiz, os seus currículos para uma oferta em contexto europeu, o novo sistema facilita o regime de equivalências e permite uma avaliação com padrões, e eventualmente pessoas, menos sujeitos a manipulação. Compreende-se, por isso, que o Governo queira levar por diante esta mudança, já este ano, contrariando os avisos de quantos gostariam que houvesse um período de preparação tão longo que nunca se chegasse à concretização de nada.

Que não haja, porém, ilusões. Bolonha é também o triunfo do eduquês e, pior ainda, leva a universidade a abdicar de tudo quanto foi a sua vocação secular, transformando-a em mais um centro de preparação de "recursos humanos", ao sabor de conjunturas empresariais ou políticas. Se não houver, em paralelo com esta reforma, uma política de estímulo à investigação nos vários domínios, corre-se o risco de ficar com um sistema racionalizado, mas que já pouco terá de superior e ainda menos de universitário.

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