A propósito do jantar dos 80 anos de Mário Soares, notei aqui que nenhum outro português seria capaz de congregar tanta gente numa festa de aniversário eram cerca de duas mil pessoas e o pavilhão da antiga FIL parecia cheio como um ovo. Enganei-me num pormenor: é que foi possível juntar naquele mesmo espaço ainda mais mil comensais, no primeiro grande jantar de campanha do Partido Socialista. A festa de Soares não rendia dividendos políticos, sabendo-se que o antigo presidente já não pode alimentar expectativas sobre a distribuição de cargos e mordomias. Não é esse o caso, agora, com um PS lançado irresistivelmente à conquista do poder. Há quase três anos, em jantar idêntico num armazém do porto de Lisboa, Ferro Rodrigues terá conseguido reunir, se bem me lembro, apenas um terço das presenças registadas na sexta- -feira à volta de José Sócrates. Ferro nada tinha para oferecer, a não ser uma derrota honrosa (que, aliás, com os inesperados 37 por cento obtidos, soube quase a triunfo). Já Sócrates tem ao seu alcance o horizonte inebriante da primeira maioria absoluta do PS.
O cheiro a poder faz toda a diferença. Sempre foi assim e assim continuará a ser. No entanto, a facilidade com que alguns «independentes» se prestam a ser exibidos como troféus de caça no banquete do poder é já propícia à indigestão. Percebe-se que o antigo apresentador do «Acontece», Carlos Pinto Coelho, tenha razões de queixa contra os que o afastaram dos ecrãs, e que um putativo candidato a ministro de Educação de Durão Barroso, Valadares Tavares, queira aproveitar agora a ocasião para sair da obscuridade e respirar os ares do poder. Terá sido apenas por causa disso que foram eles as vedetas convidadas a discursar no banquete socialista? Em todo o caso, é motivo para nos interrogarmos sobre a sinceridade com que Sócrates vem defendendo um critério de comportamento político o decoro.