O primeiro-ministro francês vai recorrer ao instrumento previsto na Constituição que permite a aprovação de leis que evita a sua passagem pela Assembleia, para aprovar o orçamento do Estado e a lei do financiamento da Segurança Social. A consequente moção de censura a acionar pela extrema-esquerda não deverá ter o voto dos socialistas.“O primeiro-ministro pode, após deliberação do Conselho de Ministros, assumir a responsabilidade do governo perante a Assembleia Nacional pela votação de uma proposta de lei de finanças ou de uma proposta de lei de financiamento da Segurança Social. Neste caso, a proposta de lei considera-se aprovada, salvo se for aprovada uma moção de censura, apresentada nas 24 horas seguintes”, reza a alínea 3 do artigo 49 da Constituição francesa (conhecido como 49.3). Recurso controverso usado por governos com minoria parlamentar, irá ser de novo usado, anunciou François Bayrou numa entrevista ao La Tribune Dimanche. Nas palavras de Bayrou, trata-se de um instrumento de “saída da crise” para “passar à adoção” do orçamento, que tinha sido já validado pela comissão mista de deputados e senadores. Depois deste compromisso elaborado pela coligação governamental, com concessões em especial ao Partido Socialista , avaliadas “cerca de 5 mil milhões” de euros em relação ao projeto inicial do anterior primeiro-ministro Michel Barnier, o orçamento para 2025 permitirá manter o défice no valor anunciado de 5,4% do PIB, garante o primeiro-ministro. Esse corte de de 0,6 pontos em relação ao ano anterior é feito à custa de 50 mil milhões de euros: 30 mil milhões de cortes e 20 mil milhões de aumento de receitas. À extrema-direita, Marine Le Pen fala de eleições antecipadas e à extrema-esquerda a França Insubmissa promete moção de censura, no que deverão ser apoiados por comunistas e ecologistas. Oficialmente, o PS ainda não definiu o sentido de voto. Mas o apelo do seu antigo primeiro-ministro e candidato presidencial Lionel Jospin para que a esquerda não vote a favor da moção de censura não deverá cair em saco roto. “Não se censura por causa de uma palavra”, disse ainda em entrevista à France 5, numa referência a uma frase de Bayrou que fez polémica. Há dias, o centrista afirmou que a França sofre uma “inundação migratória”. “Estaremos a negar a realidade se não conseguirmos ver que os nossos cidadãos estão profundamente preocupados com a nossa incapacidade de regular a imigração”, defendeu Bayrou na referida entrevista ao La Tribune, e na qual afirmou que “os franceses não querem viver de censura em censura, de dissolução em dissolução” e advertiu os partidos que “a concretização dessas ameaças será rejeitada com indignação pelos franceses”.