5% de quê? O verdadeiro desafio da Europa
A Cimeira da NATO de 2025, em Haia, fixou uma meta ambiciosa: 5% do PIB para defesa e segurança até 2035. Um salto orçamental histórico, dizem uns. Mas a questão essencial é outra: 5% de quê? E, sobretudo, para quê?
O verdadeiro desafio europeu não está em atingir essa meta. Está em evitar que ela se torne um fetiche financeiro ou um álibi político. A Europa não sofre de escassez de recursos - os diversos pacotes de financiamento e o apoio à base industrial de defesa são prova disso. Falta, sim, uma visão estratégica comum. Sem ela, o que se multiplica não é a eficácia, mas a fragmentação: prioridades concorrentes, capacidades redundantes, projetos sobrepostos e uma miríade de interesses nacionais, corporativos e institucionais.
O novo paradigma exige mais do que dinheiro. Exige escolhas, e, com elas, renúncia: ao egoísmo estratégico, às soberanias simbólicas, à tentação de duplicar o que já existe. A defesa europeia não se pode limitar a uma equação orçamental; tem de ser um projeto político, com interoperabilidade e direção claras.
A própria cimeira foi sintomática: breve, contida, quase silenciosa, moldada pela sombra calculada de Donald Trump e pelo esforço diplomático para evitar dissonâncias. O comunicado final, com apenas cinco parágrafos, espelha esse minimalismo. E a Ucrânia, antes presença central, foi relegada ao plano simbólico.
Mas houve um sinal político novo e profundamente transformador: dos 5%, 1,5% será dedicado a áreas não militares, como ciberdefesa, proteção de infraestruturas, apoio ao setor privado e capacitação da sociedade. Pela primeira vez, assume-se de forma explícita que o combate das guerras não é monopólio dos militares. As guerras do futuro serão travadas também nas redes, nos sistemas logísticos, nas escolas, nos hospitais e nos municípios. A defesa tornou-se multidimensional, e convoca todos.
Esse 1,5% é mais do que uma rubrica: é o reconhecimento de que a coesão social e a resiliência democrática são agora ativos estratégicos. A população deixa de ser apenas protegida, passa a ser parte ativa do sistema de defesa.
O verdadeiro desafio europeu não é apenas mobilizar 5% do PIB, é construir uma direção comum, capaz de transformar recursos em propósito estratégico.
Portugal, pela sua vocação atlântica e histórico papel de mediador, não deve limitar-se ao papel de observador. Pode, e deve, ser catalisador de convergência, articulador de equilíbrios e voz ativa num projeto de segurança partilhada.
Porque a segurança do futuro não se mede apenas pelo que se gasta, mede-se sobretudo pelo que se constrói em conjunto.