Droga e subornos. EUA apertam cerco ao presidente das Honduras
O caso podia ser de apenas mais um traficante de droga condenado num tribunal norte-americano, mas o arguido que arrisca a pena perpétua é um dos irmãos do atual presidente das Honduras, Juan Orlando Hernández. E parece que Juan Antonio, mais conhecido por Tony, não era a ovelha negra da família. Noutro julgamento, testemunhas acusaram o chefe de Estado de receber malas de dinheiro dos narcotraficantes e prometer inundar de droga os EUA. Hernández nega tudo, mas a justiça norte-americana estará a apertar o cerco à sua volta.
Tony, de 42 anos, foi condenado por tráfico de droga e venda de armas em outubro de 2019 e, depois de vários adiamentos, conhece hoje a sua sentença num tribunal de Nova Iorque. "O arguido era um congressista hondurenho que, junto com o irmão Juan Orlando Hernández, desempenhou um papel de liderança numa violenta conspiração de tráfico de droga, patrocinada pelo Estado", alegam os procuradores, que pedem prisão perpétua e o pagamento de quase 140 milhões de dólares, referentes aos lucros que terá tido com o tráfico.
Tony foi condenado por transportar 185 mil quilos de cocaína para os EUA durante um período de 15 anos, além de servir de intermediário ao pagamento de subornos a políticos do Partido Nacional - incluindo um milhão de dólares do líder do cartel de Sinaloa, o mexicano Joaquim El Chapo Guzmán, ao irmão, Juan Orlando, de 52 anos.
Este não é o único caso em que surge o nome do atual presidente das Honduras. Já neste mês, dois antigos líderes do cartel Los Cachiros (que nas últimas décadas controlou o tráfico de droga no país) testemunharam no julgamento do narcotraficante Geovanny Fuentes Ramírez, também em Nova Iorque, que Hernández recebeu subornos em 2012 para garantir que o exército e a polícia não os prendiam e extraditavam para os EUA. "Vamos entupir os narizes dos gringos de drogas e eles nem vão notar", terá dito Hernández num encontro com Fuentes, segundo uma das testemunhas.
Na altura, Hernández estava à frente do Congresso Nacional e concorria às primárias do Partido Nacional para se tornar no candidato às presidenciais de 2013 e suceder a Porfírio Lobo - outro dos que foram acusados de ter recebido dinheiro dos narcotraficantes, tendo o seu filho sido condenado no ano passado.
Hernández nega todas as acusações - "são 100% falsas", afirmou o governante - tendo respondido que aqueles que o acusam não são mais do que dois informadores da agência antidrogas norte-americana (a DEA) a tentar reduzir a sua própria sentença. E alega que há gravações da própria DEA que mostram como os traficantes estavam frustrados por ele não estar disponível para ser corrompido. As autoridades norte-americanas já indicaram contudo que ele está a ser investigado (aparentemente já desde 2013), juntamente com outros responsáveis hondurenhos.
Hernández apresentou-se sempre como alguém com mão forte contra o tráfico de droga - a verdade é que terá extraditado líderes dos cartéis para os EUA apesar de isso ser proibido pela Constituição, pelo que estes podem querer vingar-se com as suas acusações. E surgiu como aliado de Washington no combate à imigração ilegal. Uma acusação que poderá complicar os esforços da administração do presidente Joe Biden de investir 4 mil milhões de dólares da América Central, incluindo nas Honduras, para tentar lidar com as causas da imigração e assim evitar que milhares de pessoas façam a viagem para os EUA.
Os norte-americanos já fecharam os olhos no passado a acusações de que a reeleição de Hernández, em 2017, foi fraudulenta. Na altura, não só os juízes do Supremo Tribunal (leais ao presidente) tinham revogado a proibição de concorrer a mais um mandato, como a Organização de Estados Americanos considerou o próprio escrutínio cheio de irregularidades. Hernández venceu Salvador Nasrallah, que as primeiras projeções tinham dado como vencedor, por cerca de 50 mil votos.
Juan Orlando Hernández não pode candidatar-se às eleições de 28 de novembro, mas poucos acreditam numa mudança. O candidato do Partido Nacional, de Hernández, é o autarca de Tegucigalpa, Nasry Asfura, investigado pelo desvio de um milhão de dólares da câmara. Já Xiomara Castro, da aliança de esquerda LIBRE, é a mulher do ex-presidente Manuel Zelaya, deposto num golpe em 2019, que também é acusado de receber dinheiro dos narcotraficantes. O candidato do Partido Liberal, Yani Rosenthal, é um ex-ministro que cumpriu três anos de prisão nos EUA por lavagem de dinheiro. Por último, Salvador Nasralla concorre pela terceira vez e continua a dizer que foi ele que ganhou em 2017.