Famílias amortizam valor recorde do crédito à habitação antes do prazo
Apesar das taxas de juro em valores historicamente baixos, no ano passado, os portugueses amortizaram antecipadamente o valor mais alto de crédito à habitação.

Reembolso no crédito à habitação pode estar associado ao dinamismo do mercado imobiliário, uma vez que a troca de casa implica muitas vezes o pagamento do crédito existente.
© Rui Manuel Fonseca/Global Imagens
Ao longo de 2018, as famílias portuguesas amortizaram antes do prazo a totalidade do crédito à habitação num montante superior a 4,2 mil milhões de euros. É o valor mais elevado desde que o Banco de Portugal (BdP) recolhe estes dados. A primeira vaga refere-se à informação entre outubro de 2009 e setembro de 2010.
De acordo com o relatório de Acompanhamento dos Mercados Bancários de Retalho, registou-se um aumento de 8,3% do montante reembolsado, comparando com 2017. Os dados mostram que a capacidade das famílias portuguesas também aumentou. O valor médio de reembolso foi de 57 mil euros, quando no ano anterior se tinha fixado nos 53,5 mil euros, o que representa um crescimento de 6,5%. Neste caso, também nunca o valor médio tinha sido tão elevado.
O reembolso antecipado - total ou parcial - do crédito à habitação tem tido nos últimos anos um comportamento que acompanha as variações do ciclo económico e do rendimento disponível das famílias. "Esta evolução [menos reembolsos antecipados] está em linha com a redução do rendimento disponível das famílias verificada no período", escreveu o BdP nos relatórios de 2012 e 2013, acrescentando que as dificuldades em mudar de banco também explicavam este comportamento.
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Depois de uma cifra que ultrapassou os 3,5 mil milhões em 2010, os valores de amortização antecipada total foram caindo, atingindo o montante mais baixo em 2013, ainda no pico da crise financeira. A maior capacidade financeira para liquidar o crédito da casa acompanha também a recuperação económica do país. A partir de 2014 os montantes voltam a subir, atingindo no ano passado o valor mais elevado da série.
No relatório de 2015, o BdP arriscou uma explicação para a mudança de comportamento dos portugueses. "[O reembolso] no crédito à habitação pode estar associado ao maior dinamismo do mercado imobiliário, uma vez que a troca de casa implica muitas vezes o reembolso total do crédito à habitação existente e a celebração de outro contrato para financiar a nova habitação", lê-se no documento do supervisor.
Também o valor médio do reembolso antecipado total do crédito à habitação atingiu no ano passado o montante mais elevado desde que existem dados, superando os 57 mil euros.
Juros baixos não travam liquidações
Este comportamento das famílias portuguesas pode parecer contraditório tendo em conta o custo do empréstimo, medido através da taxa de juro média cobrada. No ano passado, a taxa de juro implícita para o crédito à habitação calculada pelo Instituto Nacional de Estatística manteve-se em níveis historicamente baixos, muito próxima de 1%. A justificação para esta amortização antecipada pode residir, de facto, no "dinamismo do mercado imobiliário" a partir de 2015 como avançou o Banco de Portugal no relatório desse ano.
E as taxas de juro deverão manter-se baixas ainda nos próximos tempos. É pelo menos essa a indicação que sai dos sucessivos discursos do ainda presidente do Banco Central Europeu que nesta semana não mexeu nos valores da taxa de referência para a zona euro. No comunicado publicado depois da reunião do Conselho de Governadores em Frankfurt, na quinta-feira, o BCE indicou que as taxas deverão manter-se até ao final do primeiro semestre do próximo ano nos níveis atuais ou "em níveis inferiores", abrindo as portas a futuros cortes.
Paulo Ribeiro Pinto é jornalista do Dinheiro Vivo