A saída provável de quem fará falta
Pouco depois da vitória do Brexit, um dirigente de uma associação empresarial portuguesa dizia que não estava preocupado porque "no final os políticos vão resolver isto". A fé demonstrada é tão injustificada hoje como era então, e a incerteza é exatamente a mesma. Até março de 2019, e depois, tudo pode acontecer: este acordo, nenhum acordo, ou mais tempo para chegar a um acordo qualquer. Entretanto, o Brexit, mesmo que não aconteça - o que é a hipótese mais remota de todas - já provou várias coisas.
Os 27 foram coesos, deixaram a Comissão liderar o processo - que inteligentemente delegou essa tarefa em Michel Barnier -, apresentaram uma solução possível mas a pensar nos interesses da União Europeia, e não tentaram reverter a posição do Reino Unido. Tanto para os que celebraram a saída dos britânicos que nunca estiveram sinceramente com o projeto europeu como para os que veem na sua partida um grave prejuízo para uma Europa mais liberal e menos integrada, o referendo é para cumprir. E embora haja consciência de que é fundamental não ter um acordo que faça crer que pode ser melhor partir do que ficar, também há realismo: ninguém pode achar que a Europa é mais forte no mundo quando perder uma das maiores economias, o melhor exército e o mais intercontinental dos seus membros. E implodir com a relação comercial também não é bom para ninguém. (Ou quase.)
Do lado dos britânicos a situação é mais complicada e, por isso, imprevisível. Os remainers querem ficar. Mais nada. Os brexiteers querem sinceramente partir, e qualquer réstia de dependência é inaceitável. No meio, Theresa May representa o realismo moderado, essencial mas muito pouco na moda hoje em dia. Se Boris Johnson e companhia tivessem liderado o governo, seria possível exigir-lhes um segundo referendo e recusar o resultado do que tivessem negociado. Inteligente ou cinicamente, fugiram a essa responsabilidade.
Em 2019 o Reino Unido vai (quase) certamente sair da União Europeia. Os termos dessa saída são incertos e, portanto, as consequências também. O mais extraordinário é que, apesar das centenas de páginas que tanto o governo britânico como a Comissão Europeia publicaram sobre uma saída sem acordo - são poucas, quase nenhumas, as entidades, públicas e privadas, preparadas para o que possa acontecer.
Especialista em assuntos europeus