No futebol, o segredo está cada vez mais no meio-campo. E, de entre as imensas variações para garantir a eficácia de um sistema, o mais contemporâneo é a do losango. Na política nacional está a ser igual..Portugal é, até ver, um país onde a social-democracia representa o centro. Mais de dois terços dos eleitores estão aqui. É com base nestes princípios que Portugal faz parte da União Europeia, da moeda única, das fronteiras Schengen, da OTAN e participa na esmagadora maioria dos tratados sobre Direitos Humanos..Quem garante esta opção política, contemporânea, alinhada com as melhores democracias do mundo, é a base de votantes do PS e PSD. No entanto, há demasiadas flutuações a ocorrer nos sociais-democratas para podermos compreender até quando isto será assim..Vejamos: Pedro Passos Coelho era um representante do que se entende historicamente por social-democracia? O ex-primeiro-ministro estava bastante mais à direita na ideologia e nas opções. Por isso foi rejeitado por muitos dos históricos do partido, além de que os seus estrategas (Vítor Gaspar, Miguel Relvas, Marco António Costa ou Luís Montenegro) refletiam muitíssimo pouco o famoso "legado de Sá Carneiro", por mais generalidades que se apregoem nos discursos....Já Rui Rio, pelo contrário, representa um regresso à matriz do partido. Mas, o que lhe está a acontecer? Um verdadeiro linchamento, essencialmente porque a "tática" não garante uma alternativa "clara" a António Costa (e hoje a tática, segundo alguns, é o conteúdo)..Mas olhemos numa perspetiva mais larga e regressemos ao meio-campo da política portuguesa. Qual o losango que garante hoje a estabilidade política do país? A dupla Costa-Marcelo. Dois vértices da mesma social-democracia. E quem está nas laterais desta estabilidade? Mário Centeno e Rui Rio..A pergunta que está na base deste entendimento é simples: o economista Rui Rio discorda muito de Mário Centeno? Não é de crer. E no que discorda, provavelmente o próprio Centeno também subscreveria as críticas de Rio, se pudesse. Mas a política é a arte do compromisso e Costa-Marcelo são reis dessa arte..Na verdade, nas questões de fundo, Rio poderia fazer uma boa parte da política de Costa, exceto nalgumas capciosas cedências à gerigonça. (Mas até Rui Rio sabe o que é ceder ao PCP - o seu primeiro mandato na Câmara do Porto sem maioria obrigava-o a negociar à esquerda. Há sempre um preço a pagar.).A questão complexa para o futuro do país é, portanto, essa..Uma forte derrota do PSD nas próximas eleições e o regresso de Passos Coelho ou Luís Montenegro trariam a consequência de entregar todo o espaço da social-democracia ao PS. O que distingue o PSD de Passos/Montenegro das ideias de Santana e até de Cristas?.Um PSD social-democrata com um resultado digno em 2019 (e com Rui Rio a manter-se na liderança do PSD) poderia permitir a António Costa uma negociação mais livre no futuro Parlamento - ora negociando à esquerda ora à direita. Para isso era necessário que Rio sobrevivesse ao autofágico PSD, o que é altamente improvável..Um PS completamente dependente da gerigonça durante mais quatro anos (ou de algum eventual deputado da Aliança de Santana Lopes) lança dúvidas pesadas sobre qual o preço a pagar pela governabilidade. Portugal não ultrapassou completamente a crise estrutural nem revolucionou o modelo da sua economia. Sobreviveu nos últimos anos através do fim da psicose da crise e reforço da confiança trazido por Costa. Mas na base, em concreto, o motor é o turismo e a economia mundial em boa fase. Estas duas circunstâncias não duram sempre..Num tempo em que o populismo (de esquerda ou de direita) tende a medrar logo que surgem os primeiros choques económicos, perder o PSD para um "Passismo austeritário", ou depender de uma esquerda cada vez mais sindical, faz-nos pensar quando chegará a nossa vez de enfrentar os fantasmas que andam à solta em tantas democracias ocidentais. Ou seja: quanto tempo durará o nosso milagre político assente na social-democracia?