Cada um a fazer contas à vida

O que resume o último Conselho Europeu é que cada um dos Estados Membros fez contas absolutamente internas para medir o que ganhava e perdia. Com excepção da Alemanha, que sabe que a escala europeia é a sua, e de França, que acredita que deve ser, todos os outros fizeram contas ao dinheiro que querem receber ou não querem pagar. O europeísmo dos chefes de Estado e de governo da União Europeia não é muito mais que isto. Se deveria ou poderia ser diferente, é outra conversa.

A norte, estavam pressionados por eleitorados que se dizem fartos de contribuir para a falta de boa governação do sul e para a falta de democracia a leste. A sul, as transferências são a prova de solidariedade de que a União Europeia (UE) é suposto ser feita, exigem os eleitores. A que acresce, agora com a Holanda (como no tempo da Troika na Grécia com a Alemanha), um ressentimento pelo suposto facto de os países ricos serem os verdadeiros beneficiários do Euro ou do Mercado Interno. Sendo que quem diz isto foi quem defendeu a sua criação.

Isto tudo dito, é fácil compreender as horas que a Cimeira durou. Quase tantas quanto Nice, para alterações quase tão profundas. E com muito mais acrimónia entre todos, normalmente para eleitor ver.

A decisão mais importante é a que permite à Comissão financiar-se nos mercados em vários milhares de milhões. Isto tem consequências de grande impacto. De futuro, há novas formas de aumentar o orçamento da UE além das contribuições dos Estados Membros. Isto até pode reduzir as discussões de sete em sete anos sobre as entregas de cada um, mas permite a criação de uma verdadeira autoridade tributária na União que lance, cobre e utilize impostos em doses verdadeiramente relevantes. Se isso não é um Estado...

Ao mesmo tempo, isto também não é uma Federação. Nem um directório. França e Alemanha acreditavam que a saída dos Britânicos tinha resolvido o problema de passar o tempo a negociar com recalcitrantes. Agora já só haveria pequenos e necessitados e os que são as duas coisas. Enganaram-se. Não há Reino Unido, mas há outros que não querem mais integração nem pagar mais. A sucessão de Mário Centeno já tinha demonstrado que as economias liberais se iam organizar. O Conselho Europeu provou-o exaustivamente.

As piores decisões tomadas em Bruxelas foram as que mostraram que em vez de mais Europa, os chefes de Estado e de governo quiserem menos, quando isso significasse mais dinheiro para gastos nacionais. Perderam programas, como o Horizonte Europa, que são subsídios verdadeiramente competitivos e europeus. Trocou-se o que alimenta o que de melhor se faz na Europa e o que mais integra e desenvolve as economias europeias por dinheiro para ganhar eleições. Legítimo e compreensível, mas errado.

Quando finalmente se percebeu que o que os Frugais queriam era dinheiro de volta (os famosos rebates), aligeirou-se no Estado de Direito (mais do que o básico ou difícil de alcançar) e na pressão para reformas que nos evitem voltar onde estamos. O que havia de eventualmente positivo nas exigências, diluiu-se.

E, agora, nós. Depois de um campeonato nacional de ofendidos com os holandeses, sucessivos editoriais de jornais portugueses agora já falam de como temos má tradição no uso de fundos comunitários e de como temos tendência para ter grandes planos e pequenas realizações. Se essa discussão começar agora, ainda o dinheiro europeu não chegou e já valeu a pena. Se fosse consequente, claro.

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