Serpentinas, confetis, garrafas, latas, copos e restos de fatos e acessórios no chão. Um cenário que se repete a cada Carnaval um pouco por todo o país. Por esta altura, há um grande apelo ao consumo e, consequentemente, um enorme desperdício e produção de resíduos. Já há autarquias a tomar medidas para tornar o Carnaval mais amigo do ambiente, mas está nas mãos dos foliões a possibilidade de fazer que os festejos sejam mais sustentáveis..Se quiser poupar o ambiente, pode começar pelo fato. "Esta é uma altura do ano em que há um pico de consumo. Há a aquisição de novos fatos, muitas vezes com preços competitivos, feitos em fibras sintéticas, geralmente em países onde não há controlo de aspetos ambientais", diz Carmen Lima, coordenadora do Centro de Informação de Resíduos da Quercus - Associação Nacional de Conservação da Natureza, que lamenta o facto de "nunca ser noticiado que há aproveitamento de fatos de uns anos para os outros nas grandes festas". "Por vezes, mantêm-se nos armazéns, mas há um grande estímulo ao consumo." Para um Carnaval mais sustentável, sugere que os foliões optem pela reutilização ou pelo aluguer dos fatos. E porque não pedir uma fantasia emprestada a um amigo?.Confetes e serpentinas, outra fonte de lixo.Os confetis e as serpentinas são outra grande fonte de lixo. E o problema agravou-se nos últimos anos, com o aparecimento de "confetis de plástico, a preços acessíveis, que se forem libertados numa rua ou num baile têm grande probabilidade de não ser recolhidos". Assim, "há o risco de contaminação do ambiente com produtos que não são biodegradáveis". Como são praticamente impossíveis de apanhar, acabam por ir parar aos rios e aos mares. O melhor é escolher sempre os de papel ou, em alternativa, fazê-los em casa. "É possível fazer confetis com as folhas das árvores que se apanham no chão, usando furadores. Desta forma, não têm um impacto negativo se forem libertados na rua. E não se gasta um recurso", sublinha a engenheira do ambiente..Antes de comprar o que quer que seja, veja o que pode reutilizar ou trocar com amigos. É esta a proposta de Susana Fonseca, membro da direção da Zero - Associação Sistema Terrestre Sustentável. "Podemos alterar uma máscara pintando-a ou colocando um novo adereço. É possível transformar o que já temos em algo novo", sugere. Outro conselho, prossegue, é ter atenção ao local onde compra os acessórios, qual a origem e do que são feitos. "Muitos dos adereços são feitos de plástico e alguns deles têm até químicos perigosos. Evitar dentes de vampiro, por exemplo, e outros que sejam para colocar na boca de adultos e crianças. São geralmente adereços de baixo preço, com muito pouca qualidade. Tal como as tintas", alerta a socióloga..Purpurinas são plástico, e uma ameaça para o ambiente.No Carnaval, estão por todo o lado: nas roupas, nos cabelos, nos rostos. Parecem inofensivas, mas são uma ameaça para o ambiente, de tal forma que até já foram proibidas em algumas creches do Reino Unido. Regra geral, as purpurinas são feitas com pequenos pedaços de plástico (polietileno tereftalato - PET) e alumínio - os chamados microplásticos (partículas inferiores a cinco milímetros com químicos na sua composição).."Normalmente, aplicam-se na pele. Deviam ser removidas com um material que as agarre e não através da lavagem. Quando a pessoa vai tomar banho, acabam por ir diretamente para o mar", alerta Carmen Lima, da Quercus. Quando chegam aos oceanos, as purpurinas e o glitter funcionam como esponjas e absorvem químicos, poluentes da água do mar. Como são muito pequenas, são ingeridas e vão escalando na cadeia alimentar, acabando por entrar na alimentação humana..Para minimizar o problema, várias empresas têm vindo a desenvolver purpurinas e glitter biodegradáveis. No Brasil, por exemplo, as marcas Viva Purpurina Biodegradável e a Glitter Ecológico estão a comercializar produtos que garantem ser não tóxicos, ou seja, que não prejudicam os ecossistemas. No entanto, alerta Susana Fonseca, é necessário ter atenção à designação de biodegradáveis, nem sempre utilizada da melhor forma. "O ideal é usar o mínimo e tentar perceber a composição através dos ingredientes", propõe..Autarquias mais conscientes.Nos últimos anos, várias autarquias anunciaram medidas com vista a reduzir o impacto ambiental dos seus eventos de Carnaval. Em 2013, a Câmara Municipal de Torres Vedras procurou, através do tema Reciclagem, apelar ao sentido de responsabilidade ambiental dos foliões enquanto assumia uma clara aposta na reciclagem dos resíduos produzidos. Já em 2017, o Carnaval da cidade assumiu-se como um Eco-Evento, sendo o terceiro ano consecutivo em que se compromete a reduzir o seu impacto ambiental. Desta forma, recolheu e enviou para reciclagem cerca de 20 toneladas de resíduos durante as duas últimas edições do evento..Em comunicado, a autarquia adianta que irá manter o EcoCopo (recipiente reutilizável de 200 ml, à venda nos bares aderentes por um euro) e, pela primeira vez, proibir a entrada e transação de garrafas de vidro e de plástico no evento. Além disso, "os foliões também vão ter oportunidade de tornar o Carnaval um evento mais "verde", participando numa recolha de copos de plástico que terá como oferta brindes oficiais do evento". A par da separação de resíduos, serão ainda promovidas ações de sensibilização junto do comércio local, nomeadamente em cafés, bares e restaurantes..Em Loulé, a organização do Carnaval também pretende tornar os festejos mais sustentáveis do ponto de vista ambiental. De acordo com a informação divulgada pela autarquia, "uma das novidades passa pela utilização de copos de papel 100% biodegradáveis, reutilizáveis até quatro ou cinco vezes e compostáveis, que serão distribuídos pelos bares existentes no recinto". Depois de usados, "a eliminação destes copos deverá ser feita adequadamente nos contentores castanhos", para que mais tarde sejam "levados para o aterro de compostagem e transformados em composto de qualidade para a agricultura"..Já em Ovar, a autarquia anunciou que vai impor aos bares o uso de copos recicláveis, com um custo associado, o que permitirá reduzir a circulação desses recipientes em mais de 60%. O objetivo, adiantou, é passar dos cem mil copos plásticos para entre 35 mil a 40 mil..No entender da Zero, é essencial que as autarquias estudem bem as alternativas que apresentam, pelo que não defende a utilização de bioplásticos ou plásticos supostamente biodegradáveis, exceto em situações pontuais. "Qualquer embalagem, recipiente, utensílio ou artigo, seja de que material for, necessita sempre de utilizarrecursos e estes têm sempre de vir de algum lado. Se apoiarmos uma economia do descartável reciclável ou supostamente biodegradável estaremos a manter o mesmo sistema de produção e consumo que nos trouxe até à presente situação", alerta a associação. Para a Zero, devem ser desenhadas soluções - embalagens, recipientes, utensílios -, garantindo a redução da sua utilização (sempre que possível) e a sua reutilização, mesmo em contextos diferentes. E sempre com uma tara associada..Carmen Lima, da Quercus, deixa um outro alerta: "É fundamental haver uma resposta que promova a recolha seletiva (contentores de reciclagem), mesmo que provisória. Isto contribui para sensibilizar mais as pessoas." Esta é, na sua opinião, uma falha que algumas organizações cometem. "Por vezes, colocam-se contentores para o lixo indiferenciado, mas não existem para a recolha coletiva. Devia promover-se o mais possível os reutilizáveis, mas, se tiver de se recorrer ao descartável, que haja contentores para encaminhar o lixo para reciclagem."