Quanto desperdício!
Tomemos a imagem de uma torneira que veda mal. A pingar seis gotas de água por minuto, uma a cada 10 segundos, chegará ao fim do dia com mais de dois litros de água desperdiçados. Dois litros de água que vão diretamente da torneira para o cano, sem qualquer aproveitamento, sem servirem a absolutamente ninguém. É um drama para um país que continua a desperdiçar este cada vez mais escasso bem, sim. Mas é sobretudo um bom retrato para se entender o dano causado pelas pequenas ineficiências ou aparentemente insignificantes mudanças ou atrasos nas decisões, nomeadamente governamentais, fruto de politiquices e burocracias, as tais gorduras identificadas como reformas estruturais urgentes que adiamos há décadas.
Não é teoria vã, é a realidade, que se traduz em largos milhões de euros, que poderiam ser usados para verdadeiramente melhorar o país. Por exemplo, uma simples alteração no nome de uma pasta ministerial - com António Costa na liderança, só o cargo de ministro da Economia mudou três vezes em três governos, sendo Adjunto no primeiro Executivo, incluindo a Transição Digital no segundo e sendo agora também do Mar - ou na morada de um ministério implica deitar fora todo o economato que utiliza a anterior designação e mandar fazer de novo.
Há coisas bem piores, claro, em que o dano se avoluma, como a recente ideia de voltar ao início na decisão sobre a construção do novo aeroporto de Lisboa, expressa no Orçamento do Estado, pretendendo-se que há tempo para voltar até a procurar novas possibilidades nunca antes estudadas antes de avançar com a alternativa a uma infraestrutura esgotada há anos. Repare-se: contabilizando apenas os estudos e as consultorias levadas a cabo para definir a melhor localização, nos últimos 25 anos os sucessivos governos já gastaram mais de 71 milhões de euros.
Há ainda, para nosso azar, outros deslizes que não dependem de decisões, mas decorrem de esquecimentos e atrasos. Como acontece com o adiamento na renovação do regime da Zona Franca da Madeira, que, tendo ficado para trás no Orçamento em outubro e de novo neste mês, fez perder o potencial de seis meses de atração de novas empresas à Região Autónoma - multinacionais de valor acrescentado que significam desenvolvimento, emprego qualificado e receita fiscal para uma região ultraperiférica e altamente dependente do turismo, depois de dois anos de lockdown. Em anos de pandemia, a receita de IRC das empresas que se fixaram na Madeira, graças às condições especiais garantidas pelo Centro Internacional de Negócios, representou 70% do total angariado para os cofres regionais.
Cumprir as reformas estruturais que vimos adiando há uma vida para não deixar eleitores descontentes é um absurdo. Enquanto não houver coragem para acabar com pequenos favores, caprichos e vícios, vamos continuar a perder milhões, que seriam bem úteis para pôr Portugal na rota do crescimento sustentável. Vamos continuar a perder lugares em todos os rankings.