Braço-de-ferro entre Trump e Irão faz subir preço do combustível em Portugal

Nova fase de sanções do presidente americano, com ameaça aos países importadores de petróleo iraniano, pode fazer chegar o litro de gasóleo ao euro e meio. Tendência de aumento de preços veio para ficar.
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Os preços dos combustíveis nas gasolineiras portuguesas deverão manter a tendência de subida até ao verão, habitual período de pico, com o litro do gasóleo rumo à marca de 1,50 euros, preveem os analistas. A válvula que vem acentuar a tendência sazonal está nas mãos de Donald Trump, o presidente dos Estados Unidos, que se prepara para decretar, na próxima semana, o fim das isenções de sanções aos importadores de petróleo que furem o bloqueio ao Irão.

Já lá vão quatro meses desde que o petróleo afundou nos mercados internacionais à espera de um crescimento mais lento da economia global. Mas recuperam, entretanto, desde janeiro. Em breve, poderão regressar a máximos recentes, de outubro, quando os futuros de Brent foram além dos 86 dólares por barril. Nesta terça-feira, chegaram já perto dos 75 dólares. O crude do Texas superou os 66 dólares por barril.

Alfa e ómega da curva de preços, Trump tem contribuído para travar, pelo comércio, o valor do petróleo, e agora para o espicaçar. Turquia, China, Índia, Japão e Coreia do Sul enfrentam a ameaça de retaliação económica caso continuem a comprar combustível a Teerão. Grécia, Itália e Taiwan também estão no lote dos visados, mas abandonaram estas compras já no ano passado.

Para a economia portuguesa, esperam-se importações mais caras. "Na balança de transações, tem um impacto negativo na componente das importações, fica um pouco descompensada. Depois, o facto de o dólar ter apreciado face ao euro também amplia um pouco este efeito", prevê João Queiroz, do Banco Carregosa.

Espera-se também rendimento encolhido para quem atesta. "Provavelmente, vai ter um efeito de menor rendimento disponível", afirma o analista. Da logística aos transportes, passando pelo consumidor comum, quem depende dos combustíveis "pode pagar mais à boca da bomba de combustível". Para o analista, o diesel "pode estar no caminho dos 1,5 euros, o que para quem faz muitos quilómetros pode ter impactos semanais ou impactos trimestrais importantes".

Nem todos perdem. A reação dos mercados ao anúncio do fim de período de graça para quem importa ao Irão foi rápida, com repercussões positivas para as petrolíferas. Na bolsa portuguesa, a Galp teve a maior valorização do dia, ontem, subindo 3,85%.

Há quem entenda que o efeito é passageiro. O Goldman Sachs não vê o barril de Brent a ir além dos 75 dólares até junho. A Capital Economics admite a alta no cenário, mas vê o Brent terminar o ano nos 60 dólares por barril. Por cá, o Banco Carregosa vê efeitos mais arrastados no tempo, e cumulados pelo comportamento habitual dos meses estivais, quando cresce o tempo livre e, em consequência, os gastos de carburantes pelas famílias e pela aviação.

"Provavelmente, podemos ter aqui um impacto mais prolongado no tempo se nos próximos dois, três meses não houver capacidade de resposta da América Latina, ou não forem descobertas novas jazidas, ou não houver aqui um avanço tecnológico que compense este choque na oferta", diz João Queiroz.

Escalada americana

Tomás Cunha, da corretora XTB, vai no mesmo sentido. "As exportações do Irão nesta semana, só perante esta notícia, caíram de 1,2 milhões de barris por dia para 900 mil. Caíram quase um quarto. Conseguimos ter a impressão de que uma jogada destas teria de facto um impacto pesado na economia global e, principalmente, na economia portuguesa", aponta.

O analista da XTB lembra, aliás, que "um dos principais fornecedores de gasóleo de Portugal é Espanha, que vai buscá-lo à Turquia", um dos países ameaçados. O desfecho do conflito Estados Unidos-Irão, admite Tomás Cunha, poderá até ter implicações para a composição geográfica das importações de petróleo portuguesas. "De Espanha, anualmente, importamos mais ou menos três mil milhões de euros em combustível e da Arábia Saudita importamos cerca de mil milhões." Mas o fim das isenções à Turquia poderia "mudar esta tabela de uma maneira incrível", admitindo-se até "um monopólio" para a Arábia Saudita.

João Queiroz não vê o mesmo cenário. "A economia doméstica e as estruturas estão muito integradas com Espanha e seria necessário um fenómeno extraordinário para favorecer a Arábia Saudita, cujo peso é quase irrelevante na nossa economia", afirma.

Mas o facto é que o mundo tem assistido não apenas a um crescimento da produção saudita (9,8 milhões de barris diários contra pouco mais de oito milhões no início da década) como também a uma forte escalada da produção americana, que atinge neste ano os 12,1 milhões de barris diários - o dobro da produção registada no início da década. Para João Queiroz, "as sanções impostas a Teerão ajudam a manter esta posição, e o reforço pela Arábia Saudita pode minar a integridade do cartel da OPEP".

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