Abstenção não afetará todos da mesma maneira

Apoio ao atual Presidente cresce com a idade. Ventura menos dependente do voto sénior.
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As eleições deste domingo terão sempre um vencedor, mas a verdadeira notícia pode vir a ser outra: o recorde abstenção é um dado quase adquirido. Os barómetros da Aximage para o DN, o JN e a TSF apontam, desde novembro, para uma taxa a rondar os 60%, superando em quase dez pontos, quer o nível de abstenção das últimas presidenciais (51,3% em 2016) quer o das últimas legislativas (51,4% em 2019).

As atuais projeções de resultados eleitorais já têm em conta esse elevado nível de abstenção, mas é impossível prever, por exemplo, se o descontrolado avanço da pandemia até domingo poderá alterar o comportamento de cada um dos segmentos da amostra. E é fundamental perceber, por exemplo, as diferenças geracionais no que diz respeito à mobilização para votar.

Assim, quanto mais jovens os eleitores, maior é a previsão de taxa de abstenção. E o fosso é assinalável: o escalão dos 18 aos 34 anos já teria nesta altura uma taxa a ultrapassar os 70 pontos percentuais, o dobro da taxa entre os eleitores com 65 ou mais anos, que ficariam pouco acima dos 35 pontos.

A pergunta de um milhão de dólares é a de saber até que ponto é que a abstenção entre os mais velhos (historicamente mais mobilizados para votar) pode subir e quem sai prejudicado. Até porque os candidatos não serão afetados todos da mesma maneira. E quem mais tem a perder com a fuga dos mais idosos é precisamente Marcelo Rebelo de Sousa, uma vez que o apoio ao atual presidente cresce à medida que envelhece o eleitor: os mais velhos dão-lhe mais 13 pontos percentuais do que os mais novos.

Nada de conclusões precipitadas, no entanto. Mesmo com uma deserção em massa dos mais velhos, Marcelo tem a vitória quase assegurada e provavelmente à primeira volta: de acordo com a sondagem da Aximage, tem resultados acima dos 50 pontos percentuais em todos os escalões etários.

Mais perverso pode ser o efeito na posição relativa dos restantes candidatos. Ana Gomes é a segunda candidata que mais depende do eleitorado sénior (marcava 19%), enquanto André Ventura tem neste escalão o seu pior resultado (6,2%). Se a abstenção disparar neste segmento etário e se combinarmos esse facto com a tendência atual de descida de Ana Gomes e de subida de André Ventura, é maior a probabilidade de o líder do Chega alcançar o segundo lugar.

Na luta particular de João Ferreira e Marisa Matias pelo quarto lugar, é o comunista quem tem mais a perder se abstenção entre os eleitores mais velhos se aprofundar. O seu apoio entre os dois escalões mais velhos está em média dois pontos percentuais acima do que consegue nos dois mais novos. No caso da bloquista, é exatamente ao contrário: o apoio é bem maior nos 18/34 anos do que na faixa dos 65 ou mais anos (uma diferença de quase sete pontos percentuais).

O trabalho de campo desta sondagem decorreu entre os dias 9 e 15 de janeiro, na véspera do período de grande crescimento dos números da pandemia para os níveis atuais. A preocupação dos eleitores com a sua saúde e a dos seus compatriotas foi um dado evidente da nossa sondagem. Assim, é muito provável que a abstenção seja superior ao valor modelado. A abstenção afetará de forma desigual as diferentes candidaturas, mas não cremos que o quadro geral sofra tão grande transformação que os resultados fiquem fora da margem de erro da sondagem. Deixamos este alerta aos leitores desta sondagem para o atual contexto de aumento da incerteza, verdadeiramente, sem paralelo na nossa história recente.

Hugo Mouro

Aximage

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