Foi o projeto de Moedas que os lisboetas escolheram
Fernando Medina entregou a Câmara de Lisboa a Carlos Moedas, com grande dignidade, depois de a realidade do cansaço dos lisboetas relativamente aos seis anos da sua governação na capital ter transformado a quase certa maioria absoluta numa fria derrota eleitoral. Mas a família socialista que se manteve na gestão da autarquia não se conforma com a vontade da maioria dos habitantes da capital e está pronta para tentar fazer cumprir o seu programa mesmo depois de os lisboetas o terem chumbado e rejeitado liminarmente.
Com o mesmo número de vereadores do que a coligação de Carlos Moedas e maioria na Assembleia Municipal, o PS revela uma atitude de oposição cega a qualquer coisa que não venha de trás, dos tempos das ciclovias a rasgar as ruas mais improváveis, das árvores derrubadas para dar lugar a plantinhas, do eterno projeto de tornar a Segunda Circular num jardim. Não que o assumam nestes termos, mas é o que se torna óbvio pelo comportamento dos representantes dessa ala nos fóruns da capital. Como se vê na contestação ao excesso de pastas entregues aos vereadores dos partidos da direita depois de socialistas, bloquistas e comunistas rejeitarem todos os convites do atual presidente da Câmara para assumirem pelouros executivos no novo mandato. Ou a ideia de que Moedas tem o dever de cumprir o que prometeu aos lisboetas, mas o PS não irá aceitar nada que fuja ao que está definido no programa deixado por Medina - e chumbado pelos lisboetas nas autárquicas. Ou ainda os dedos apontados à falta de atividade desde que se sentou à cabeceira quando apenas neste fim de semana se cumpre um mês desde a tomada de posse.
Carlos Moedas é um homem ponderado, adepto do valor da partilha, da negociação e dos consensos alargados. Como aliás o demonstrou nessa tentativa de entrega de pastas, bem como na manutenção de todo o pessoal técnico e administrativo que vinha do anterior executivo. Só saiu quem quis fazê-lo pelo próprio pé e vontade. Não será difícil vê-lo procurar caminhos de comunhão com os representantes eleitos dos outros partidos. A isso mesmo assistimos na última semana com a votação ao lado de PCP e BE contra a linha circular do Metro.
Com um relativo equilíbrio político nos órgãos de gestão autárquica, seria este o momento ideal para virar a cidade para fora das instituições dirigentes, para quem nela vive, escutando propostas, trabalhando-as com contributos de todos os lados e criando soluções de valor acrescentado. Como acontece nas democracias. Mas isso será muito mais difícil se o segundo partido mais votado das últimas eleições persistir na fuga à realidade. Se o maior representante da oposição mantiver a crença de que o resultado eleitoral foi apenas um engano e não a expressão da vontade da maioria contra o projeto que conduziam. Se o PS continuar a comportar-se como o dono da bola que não deixa ninguém jogar se não for ele a mandar no jogo. Eventualmente, os restantes vão entender-se. Mas será uma pena que se perca esta oportunidade de civismo pelo bem maior.