A guerra só havia de começar, oficialmente e para registo nos livros de história, três dias depois, a 19 de julho, uma terça-feira. Mas naquele sábado, ou sabbado, como aparece no canto superior direito da primeira página do Diário de Notícias, logo abaixo do preço - dez réis -, já os jornalistas do DN tinham regressado à redação, na Rua dos Calafates, com notícia de uma cidade em sobressalto, suspensa nos boatos de mais uma guerra..Numa coluna com o título "Assumptos do dia", contava-se que "reinava viva anciedade em Lisboa" e que "circulava o boato de que estava declarada a guerra entre a França e a Prússia". Ora, boato não é e não era notícia e na mesma frase o repórter justificava-se: "Boato de confirmação probabilíssima, pois um telegramma de Paris nos noticiava, horas antes, que se esperava que o governo do imperador pedisse de tarde auctorização ao corpo legislativo para ajustar em campo de batalha as suas divergências com a nonarchia de além Rheno.".Na mesma coluna, debaixo do subtítulo "Conflicto franco-prussiano. Declaração de guerra? Grandes preparativos militares, Notícias bellicas", dava-se conta de que estaria iminente uma declaração de guerra entre o império napoleónico e o reino prussiano. Sinais disso? "Communicações telegraphicas, que os nossos leitores conhecem bem." Quais? O facto, por exemplo, de o rei Guilherme se recusar a receber o embaixador francês Benedetti, que, "a confirmar-se, seria por si só uma declaração de rompimento de paz entre as duas potencias rivaes". Na redação do Diário de Notícias a convicção era a de que, fosse por esse ou por outro qualquer motivo, a França imperial entraria em guerra com a Prússia..Em julho de 1870 os sinais de guerra eram muito diferentes. O DN contava, por exemplo, que um dos indicadores que melhor demonstravam as intenções hostis e não simplesmente previdentes" da França era a notícia, nos jornais de Marselha, da compra massiva de feno e forragens, expedidas depois por vias rápidas para as fronteiras leste do país. As forragens e animação no porto de Cherburgo, na Normandia. Contavam os jornais locais, citados pelo DN, que o movimento de navios de guerra e o arsenal era de "grande animação", e que "não se via nada semelhante desde a Guerra da Crimeia"..A Guerra Franco-Prussiana havia de durar até maio de 1871 e acabaria com uma clara derrota das forças francesas. A vitória clara dos alemães foi o último passo da unificação da Alemanha e marcou a queda de Napoleão III, o fim do Segundo Império e o nascimento da terceira república francesa. Nesse quase ano de guerra, a França perde o território da Alsácia-Lorena, anexado pela Alemanha, que só viria a recuperar depois da derrota alemã na Primeira Guerra Mundial..Nesta edição do Diário de Notícias, de 16 de julho de 1870, dá-se ainda conta da prisão de M. do S., criado do padeiro, Sr. V.G., que, tendo recebido um cesto de pão para vender, conseguiu "apurar 7$800 réis" e ficou com eles. "A polícia caiu-lhe em cima com todo o seu peso, prendeu-o, e agora lá está M. do S. na cadeia, vergado ao peso de tão feia acusação.".E festivais de verão? Também os havia, mas numa outra escala..O DN conta que há duas noites estiveram no passeio público - atual Av. da Liberdade - 2375 pessoas a assistir ao lançamento de dois balões de ar quente. "Arderam ambos os balões, caindo logo um d'elles na rua central." Quem escreve remata curta nota com um conselho: "Parece-nos que o melhor local para a ascensão é no terraço por cima da cascata, do lado norte; assim ficam livres os balões de tocar nas árvores e o público desfructa melhor.".Na mesma noite do triste espetáculo dos balões no passeio público, houve "um grande concerto vocal e instrumental", no "elegante kioske do acreditado hotel União". O DN publica o programa do concerto e conta que "tomaram parte muitos dilettanti de um e outro sexo que buscam nas harmonias da música afugentar a melancolia, gozando horas de prazer innocente e suave". E suave não quer necessariamente dizer que a festa tenha sido breve, o DN conta que "o concerto acabou à 1 e 1/2 hora. Passou-se uma noite agradabilíssima".