O risco para a liderança

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A hegemonia é mais uma circunstância da retórica, como foi observado por Bertrand Badie, do que um conceito chamado científico, com dispensa de o excecionar pela ética das relações internacionais.

A situação atual dos EUA, que habitualmente têm atenção ao direito internacional, tem hoje uma breve história em busca de novos valores da redação internacional. A perspetiva, tantas vezes lembrada, da relação amiga, pessoal e competente, entre Abade Correia da Serra e o seu íntimo amigo Jefferson, deixou lembrança da atitude proposta dos EUA e do Brasil na definição da orientação esperada e preferida de resposta às exigências entre o norte e o sul do continente americano, em que entendiam que esse norte e esse Sul aceitassem a responsabilidade respetiva e semelhante dos EUA e do Brasil.

A Europa, que perdeu a função chamada Luz do Mundo, ficou a dever aos presidentes dos EUA, em cada uma das guerras mundiais, uma intervenção responsável a cobrir, com intervenção e responsabilidade de associado, a reforma com êxito dos resultados dos terríveis desastres de ambas as guerras mundiais, e exercer pessoalmente uma criatividade e uma responsabilidade para ajudar a redefinir uma relação internacional criativa, e largamente exigente, tal era a dimensão de ambos os desastres militares das duas guerras mundiais.

Teve fundamento depois da vitória, na Segunda Guerra, contra o nazismo, e da segurança até ao ponto final na recuperação em paz da Europa, procurar, tendo a ONU como referência principal, formular a governança do globalismo em criação pelos ocidentais, vindo a ser geralmente reconhecida a sua hegemonia, naquele tempo visivelmente militar, mas deixando valores consagrados para governantes, chefes militares e gestores das várias governanças.

É sabido que a evolução implicou oscilações frequentes, designadamente a contradição com a União Soviética, de 1949 a 1967, mas talvez a eleição de Donald Trump, cuja intervenção cria um panorama diferente da histórica intervenção dos anteriores estadistas que ocuparam a Casa Branca até ao seu aparecimento.

Tem-se verificado seguramente, e depois da consagração, que entretanto mudou profundamente o conceito de segurança, que os próprios EUA orientaram depois da paz, com especial peculiaridade para a reaparição da novidade da China de Xi Ping, ou da Rússia de Putin, ou a novos desafios de conflitos como os da Síria, do Sahel, do Iémen, com crescente importância para os procedimentos da Arábia Saudita ou de Israel, e o exemplo mais preocupante, a relação dos EUA com o Irão, o Iraque, e a inquietação entre todas as potências responsáveis no sentido de impedir ser causa da perda da paz.

Provavelmente nem a população americana aprova que as decisões militares do presidente impliquem tal violação da paz, mas também não é o resultado do tradicional impeachment, de regra impedido de atingir um presidente com responsabilidades de segurança, que vai modificar, alterar, pelo êxito a frequente liberdade criativa do presidente, além das que são militarmente mais perigosas. O que não pode seguramente extinguir quaisquer novas inquietações da próxima reeleição, no caso de o populismo continuar dominante.

Como recentemente sublinhou o respeitável Bertrand Badie, "esta sua política de intervenção seletiva mistura-se com uma espécie de 'diplomacia eleitoral', obedecendo às regras populistas tendo por função dirigir-se prioritariamente aos seus eleitorados". Por isso não perde a oportunidade de chamar pessoalmente a atenção para a complexidade da sua "intervenção hegemónica", sem notar a fragilidade que a acompanha, tornando criativa e complexa a ainda chamada "política estrangeira americana".

Um desígnio excessivo tornado conhecido pelas suas reuniões com a Coreia do Norte, com o exagero do chamado primeiro ataque ao Irão, quando o suspendeu minutos antes, para o tornar efetivo mais tarde acarinhando a liberdade com que estabeleceu a nova relação entre Israel e os EUA fixando ali a sua embaixada sem contar com a importância internacional de Jerusalém.

Por isso, inquieta, mas não surpreende, a sua atitude sobre o desafio climático, travando o Acordo de Paris. Não é também fácil admitir que esquece o respeito perdido pelo Tribunal Penal Internacional, cuja perda de intervenção considerou um triunfo. Uma distração do método de que a justiça natural não vai ter relevo no programa eleitoral que venha a recuperar.

É evidente que a mudança das circunstâncias encaminha para a necessidade de um estadista ter a criatividade necessária para arriscar a autoridade da resposta. Mas a criatividade sem saber da nova circunstância, que altera a experiência histórica do passado, assume um futuro livre que ignora e por vezes antecipa a decisão. Por isso se discute se os EUA perderam a liderança. Os setenta anos da NATO apontam para a gravidade do facto, para o esquecimento de que o mar Atlântico foi o da batalha de 1939-45, que é talvez necessário não pensar apenas no Pacifico. A história dos EUA foi de ambos.

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