Tirar as lentes das ideologias e olhar os corredores da morte
A coragem física e determinação de Ursula von der Leyen merece a admiração de todos nós e é uma inspiração para outras mulheres, que, tal como ela, querem fazer mais pelos outros e deixar a sua marca no mundo. A presidente da Comissão Europeia envergou o colete antibalas e percorreu as ruas de Bucha, na Ucrânia, onde aconteceu um autêntico massacre. "Aqui vimos a crueldade do Exército de Putin, a imprudência e a frieza com que têm ocupado a cidade. Aqui em Bucha vimos a nossa humanidade ser despedaçada e o mundo inteiro está de luto com o povo de Bucha", declarou a líder europeia. Os crimes nesta cidade chocaram o Ocidente e "é impensável o que aconteceu aqui", afirmou. E mais acrescentou quando escreveu na sua conta do Twitter "que os responsáveis pelas atrocidades sejam levados à justiça".
Se dúvidas houvesse sobre os crimes de guerra que têm sido cometidos em território ucraniano, o horror está agora, e de novo, à vista de todos os que quiserem tirar as lentes dos preconceitos, das ideologias, dos extremismos. Percorrer as ruas, as casas, as igrejas, os teatros ou a estação de comboios de Kramatorsk é o mesmo que percorrer os corredores da morte. "O povo ucraniano merece a nossa solidariedade", sublinhou a líder do executivo comunitário. E merece, mesmo! Depois seguiu para Kiev, sem medo, para expressar o "apoio inabalável" à Ucrânia na sua luta contra a invasão. Na capital serão discutidas com o presidente ucraniano as últimas medidas adotadas pela União Europeia para pressionar a economia que sustenta a "máquina de guerra" de Moscovo, entre as quais o pacote de sanções aprovado ontem, que inclui o embargo às importações de carvão.
O cenário macroeconómico é de grande incerteza, e Portugal tem sentido os impactos da guerra nos preços dos combustíveis e outras matérias-primas, bem como no valor dos alimentos. Na quinta e sexta-feira, o governo anunciou algumas medidas para mitigar os efeitos nefastos da escalada de preços e da subida da inflação que estão a empobrecer as carteiras dos portugueses, mas poderão não ser suficientes para conter uma nova crise. Após a pandemia, a guerra veio incendiar as previsões de crescimento económico. E depois da inflação a ameaça chega agora do lado dos juros. Portugal emitiu 3 mil milhões de euros de dívida com juros mais altos, ou seja, a tocar os 1,7%. As taxas estão a subir devido à atuação dos bancos centrais, que estão a utilizar uma espécie de faca de dois gumes: para travar a inflação sobem os juros. Depois da dívida pública, será a vez de as famílias e de as empresas sentirem quão afiada está essa faca.