Tuvalu. A fortuna do domínio ".tv"
Mala de viagem (184). Um retrato muito pessoal de Tuvalu.

De um Estado independente formado por quatro recifes de coral e cinco atóis localizados no sul do oceano Pacífico chegou uma delegação à Nova Zelândia, composta por nove mulheres, para participar no encontro de peritos em turismo. Este número não era despiciendo, pois o nome do país significa "grupo dos nove", na língua tuvaluana. O norte-americano Arent Schuyler de Peyster, capitão do bergantim armado Rebecca que navegava sob as cores britânicas, visitou as ilhas. Consta que, em maio de 1819, Peyster passou pelas águas do sul de Tuvalu e avistou o arquipélago. Denominou-o "Ilhas Ellice", em homenagem a um político inglês, Edward Ellice, que era membro do Parlamento por Coventry e proprietário da carga do bergantim. O arquipélago ficou conhecido assim até à sua independência (1978) das ilhas Gilbert (atual Quiribati). Tal como os restantes países insulares da Oceânia presentes naquele encontro, a porta-voz de Tuvalu transmitiu o atual foco de preocupação de muitos ambientalistas que acreditam que um eventual aumento do nível do mar, causado pelo fenómeno do aquecimento global, possa atingir o arquipélago em cheio, submergindo-o. Devido a todos estes fatores, o Governo tuvaluano, já associado a outros países vizinhos, desenvolve uma campanha de consciencialização. Com apenas 5 metros de elevação do nível do mar, estas ilhas tendem a desaparecer dentro de 30 anos, se nada for feito à escala mundial. As nove participantes do país fizeram uma apresentação bizarra. Falaram-nos dentro de nove aquários e com água pelos joelhos. A sua porta-voz disse em bom inglês que os grandes poluidores mundiais deveriam indemnizar o seu país, em virtude dos impactos das mudanças climáticas no arquipélago, designadamente a partir dos impostos sobre viagens aéreas de pessoas e transporte de cargas marítimas. Todas as representantes de Tuvalu eram provenientes de Funafuti, a capital, que consiste numa faixa estreita de terra entre 20 e 400 metros de largura, circundando uma grande lagoa. Os navios de carga podem entrar na lagoa e atracar nas instalações portuárias. A economia é muito limitada e as exportações são escassas, designadamente em copra (polpa seca do coco), na pesca e na emissão de selos postais para colecionadores. Não há terrenos cultiváveis. Só que os tuvaluanos recebem todos os anos cerca de 10 milhões de euros "para não fazer nada". Uma grande parte da fortuna do arquipélago vem do licenciamento do domínio de Internet ".tv", existente desde a década de 1990, quando a União Internacional de Telecomunicações atribuiu aos países uma sequência de caracteres para colocar no final dos seus endereços de "web". O domínio de Tuvalu passou a ser um dos recursos mais valiosos do país. Não é necessário viver ou estar registado ali para adquirir o domínio, com exceção dos domínios reservados de terceiro nível (.com.tv, .net.tv, por exemplo). As receitas adquiridas por esse domínio são esse pacote destinado ao Governo, mas, se Tuvalu acabar, o domínio também.
Jorge Mangorrinha, professor universitário e pós-doutorado em turismo, faz um ensaio de memória através de fragmentos de viagem realizadas por ar, mar e terra e por olhares, leituras e conversas, entre o sonho que se fez realidade e a realidade que se fez sonho. Viagens fascinantes que são descritas pelo único português que até à data colocou em palavras imaginativas o que sente por todos os países do mundo. Uma série para ler aqui, na edição digital do DN.