O passado de jogador de Bruno Lage. O extremo-direito "acima da média" que só queria ser treinador

Bruno Lage, 42 anos, o fenómeno do momento, o treinador que no último fim de semana venceu o FC Porto no Dragão e conseguiu pôr o Benfica na liderança do campeonato, também jogou futebol. Este passado de futebolista do agora treinador do clube da Luz é praticamente desconhecido, pois a imagem que sempre passou foi a de um jovem estudioso sempre ligado ao treino, que tinha iniciado a sua carreira de técnico com vinte e poucos anos nos juvenis do Vitória de Setúbal..Recuemos à década de 1990. Bruno Lage, que nasceu em Setúbal, era ainda um adolescente, filho de Fernando Lage, antigo jogador de equipas dos distritais daquela região. A paixão pelo futebol vinha quase do berço e o jovem Bruno começou por jogar na equipa de juniores do Independente, uma coletividade da cidade sadina, na temporada 1990-91. Mas foi no Praiense, também da região do Sado, que chegou aos seniores.."O Bruno jogou dois anos nos juniores do Praiense, depois mais três anos como sénior nos campeonatos distritais da região de Setúbal. E juntos ainda atuámos mais três anos numa equipa de futsal muito conhecida aqui de Setúbal. Eu, ele e o irmão [Luís Nascimento], que também é treinador da formação do Benfica. Chamava-se O Quintal, era patrocinada por um restaurante com o mesmo nome muito conhecido aqui de Setúbal", recorda ao DN Cláudio Saúde, amigo de longa data de Bruno Lage..A etapa do Praiense foi a mais importante. "Ele jogava a médio direito, extremo e por vezes a avançado. Era um bom jogador, acima da média para uma distrital, muito esforçado, dedicado, e na altura já se via alguma coisa do que ele queria ser. Éramos os dois jogadores, mas estávamos a estudar Educação Física ao mesmo tempo, embora em faculdades diferentes", prosseguiu Cláudio, hoje com 44 anos e vice-presidente da Associação de Treinadores da região de Setúbal, que tem como líder o pai de Bruno Lage..Ou seja, contas feitas, Bruno Lage ainda atuou uns anos como jogador. Começou então no Independente (1990-91) nos juniores; depois saltou para os juniores do Praiense (1993-94), onde na segunda época atuou como na equipa sénior (1994-95): "Depois fez um interregno e ainda fez mais uma temporada no Praiense [1999-2000]. Ainda jogou um ano no Quintajense, também aqui dos distritais de Setúbal. Foi para lá por outras amizades também ligadas ao futebol. Nesta altura já se notava muito o gosto que ele tinha pelos treinos. Era uma altura em que estava na moda a famosa escola do Ajax dos anos 1990. Falávamos muito disso, trocávamos artigos e partilhávamos conhecimentos", descreve Cláudio..Próximo dos jogadores e muita humildade.Para Cláudio Saúde, contudo, esta etapa de jogador na carreira de Bruno Lage não foi assim tão determinante para o seu futuro como treinador. "Não creio, era mais por amizade e para praticar desporto. Ele nunca teve o sonho de ser jogador. Queria ser treinador. Comentávamos na altura que o nosso objetivo era continuarmos os estudos e seguirmos a carreira de treinador. Eu fui jogador alguns anos, alguns amigos até dizem que passei ao lado de uma grande carreira. Mas nós queríamos mesmo era a área do treino, estudar, e o objetivo era muito claro e não passava por ser jogador. O irmão dele, sim, ainda jogou numa III Divisão Nacional, ainda pensou um bocadinho nisso, mas rapidamente seguiu também pela carreira de treinador", referiu Cláudio..Nessa altura dos seniores do Praiense, Cláudio e Bruno já estavam a tirar os respetivos cursos de Educação Física. Mas apesar de pensarem em certos métodos diferentes, nunca foram de interferir no trabalho dos treinadores: "Estamos a falar de uma altura em que não era exigido o curso de treinador a quem liderava uma equipa. A maioria dos treinadores eram ex-jogadores. Obviamente que quem como nós já estudava e lia muito apercebia-se de algumas metodologias que não eram as mais corretas. Víamos lacunas, mas por uma questão de humildade não interferíamos.".Por ter sempre acompanhado de perto e até trabalhado com Bruno Lage, Cláudio Saúde não está nada surpreso com o sucesso do treinador que pegou na equipa do Benfica após a saída de Rui Vitória e que vai numa série de nove jogos consecutivos sempre a ganhar no campeonato - com o triunfo no Dragão, no último sábado, ascendeu à liderança, com mais dois pontos do que os dragões.."Na altura ele já revelava grandes conhecimentos a nível do treino. O pai dele foi jogador e treinador na região de Setúbal e ele já ia bebendo muitas coisas do pai. Sempre acreditei que ele ia chegar longe. O Bruno já tinha um percurso invejável no Benfica, pois foi campeão em quase todos os escalões jovens. Ele não consegue ser treinador de bancada. Ele tem de interagir com os jogadores, estar no meio do treino, sempre a incentivar e a corrigir. É muito metódico na abordagem ao treino. Ele é assim, muito próximo dos jogadores e humilde. Basta ver que vai para os jogos de fato de treino e não de fato e gravata. Ele identifica-se com um deles [jogadores].".E ver Bruno Lage fazer do Benfica novamente campeão? É possível já nesta época? "Sinceramente acho que sim. Tem grandes jogadores à sua disposição, tem o plantel do lado dele... a afirmação que ele fez no final do jogo com o FC Porto é de uma humildade extrema: 'Eles estão a fazer de mim um treinador.' Não tem medo de apostar nos jovens. Ele no Benfica é visto como uma pessoa da casa. Os próprios jogadores sentiram que ele não ia ser mais um que os ia treinar. Sentem que é um deles.".O percurso como treinador.O resto da história já é conhecida. Aos 21 anos já treinava os juvenis do Vitória de Setúbal - antes tinha trabalhado com Cláudio Saúde nas escolinhas de Quinito. Em 2000 começou como treinador adjunto no Fazendense, clube de Almeirim, e depois passou a orientar as camadas jovens do 1.º de Maio, de Setúbal. Teve ainda passagens pelo Estrela de Vendas Novas, Comércio e Indústria e Sintrense..Em 2004 entrou pela primeira vez no Benfica pela mão de Jaime Graça (ainda não existia o centro de estágios do Seixal). Ficou ligado à formação do clube da Luz (dos escalões mais jovens até aos sub-19) até 2012. Nesse ano aceitou um convite de Carlos Carvalhal para rumar à Arábia Saudita para orientar os juniores do Al Ahli e posteriormente treinou os sub-23 do clube..Terminada a aventura na Arábia, em 2015 juntou-se novamente à equipa técnica de Carlos Carvalhal, como um dos adjuntos do Sheffield Wednesday, do Championship (o segundo escalão do futebol inglês). E mais tarde integrou, também como adjunto de Carvalhal, a equipa técnica do Swansea, na Premier League..Terminada a aventura em Inglaterra, após o Swansea ser relegado para a II Liga, regressou ao Benfica, novamente com destino à formação, mas desta vez para orientar o Benfica B. Esteve durante 13 jogos no comando dos B das águias, até que a saída de Rui Vitória, em janeiro, precipitou tudo. Subiu à equipa principal do Benfica ainda na condição de interino, mas rapidamente o seu grande trabalho confirmou-o como treinador da equipa principal. E a 19 de fevereiro Luís Filipe Vieira renovou-lhe o contrato que era já era válido até 2023, melhorando substancialmente as condições financeiras. Os resultados estão à vista: 14 jogos em todas as competições oficiais, e apenas um empate (na Liga Europa com o Galatasaray) e uma derrota (com o FC Porto na meia-final da Taça da Liga). Além disso, é unânime a qualidade do futebol praticado pela equipa.

O passado de jogador de Bruno Lage. O extremo-direito "acima da média" que só queria ser treinador

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