A personagem Jair Bolsonaro, agora presidente de um país com que partilhamos tanta história comum e tanto afeto, só pode causar tristeza e náusea a quem professa os ideais da democracia, da tolerância, dos direitos humanos, do Estado de direito..Se cumprir as suas promessas, adivinha-se um período negro de intolerância para as minorias, os dissidentes, a cultura. Mas, pelo contrário, o seu programa económico, de forte pendor liberal, pode ter sucesso e inverter a situação calamitosa em que o país se encontra. Tal como sucedeu no Chile de Pinochet, e está a suceder em países que seguem uma via autoritária para impor reformas de cariz liberal na economia, aliviando o peso asfixiante do Estado e dos seus impostos e com isso promovendo o investimento, o emprego, o aumento da riqueza..Os empresários brasileiros e os investidores internacionais apostaram nesta política e acredito que até a Lava-Jato, agora que Lula está fora de combate, vai travar a perseguição a políticos e empresários que se mostrem dóceis com o novo regime. A "normalidade" vai impor-se..Ora, o sucesso económico desta democracia "iliberal" é a maior ameaça às democracias liberais. Os sistemas democráticos que se foram implantando a seguir à última guerra, na Europa, na América do Sul, na Ásia, foram-se debilitando com a perda de autoridade dos governos, com a multiplicação de contrapoderes, que na prática ficaram impotentes para levarem a cabo as reformas necessárias para se adaptarem às mudanças que as novas tecnologias e a globalização impõem, para se manterem competitivas e gerarem riqueza..As democracias europeias estão a gripar, a perder influência, ameaçadas por forças políticas de cariz autoritário de extrema-direita..Emmanuel Macron surgiu como esperança numa reforma em liberdade, mas a França parece irreformável, a Itália está a ser governada por uma coligação absurda, a Espanha tem um governo periclitante sem consistência política nem temporal..E Portugal? Vivemos um tempo de aparente exceção; causticados por um período de fortíssima austeridade, a melhoria do ambiente económico e social conduziu-nos a uma sensação de alívio e confiança..Mas a nossa recuperação é muito frágil e as corporações que vivem do Estado e dos impostos dos contribuintes ameaçam-nos com um 2019 agitado. As coisas vão complicar-se. A coligação que nos governa não tem a coerência necessária às reformas de que precisamos para atrair investimento e promover o crescimento económico que consolidasse a nossa posição nos mercados que financiam a nossa dívida..E a oposição parece refém do statu quo e do politicamente correto..Não há um projeto para o país. Também a nossa democracia corre perigo..Advogado