Muro, Kim e o fim da transmissão da sida até 2030. Trump fala hoje à nação

O presidente americano fala aos americanos diante das duas câmaras do Congresso no seu segundo Estado da União. Discurso, que foi adiado devido ao shutdown, é feito em horário nobre - 21.00 - nos EUA, madrugada de quarta-feira em Lisboa.

"Otimista", "visionário" e "tradicional". Segundo a Casa Branca, vai ser assim o segundo discurso do Estado da União de Donald Trump. O presidente (que em 2017, ano da sua posse, fez uma intervenção diante das duas câmaras do Congresso, mas não um discurso oficial) fala aos americanos às 21.00 desta terça-feira, madrugada de quarta em Lisboa.

E, para aquele que é o seu primeiro Estado da União diante de uma Câmara dos Representantes de maioria democrata, Trump já começou a jogar com a antecipação. Recusando avançar pormenores sobre aquele que será o seu segundo encontro com o líder da Coreia do Norte, Kim Jong-un, o presidente americano remeteu os jornalistas para o seu discurso no Congresso. "No início da semana, provavelmente no Estado da União", disse aos repórteres que lhe pediam detalhes do seu encontro com Kim, anunciado para finais de fevereiro.

Previsto originalmente para 29 de janeiro, o discurso acabou por ser adiado devido ao shutdown, o encerramento parcial do governo federal que durou mais de um mês e manteve 800 mil funcionários sem salário durante esse tempo. Na altura, a presidente da Câmara dos Representantes, a democrata Nancy Pelosi, enviou uma carta a Trump na qual se mostrava intransigente: Estado da União só quando o shutdown terminasse.

Emergência nacional?

Então o que podemos esperar deste discurso, além de mais pormenores sobre o encontro com Kim? Em plena guerra com os democratas sobre o financiamento do muro na fronteira com o México - o motivo que levou ao último shutdown - e com uma nova paralisação do governo à vista (o acordo a que chegaram só resolveu a situação até dia 15), uma das hipóteses é Trump usar a intervenção para declarar uma emergência nacional. Isto mesmo sabendo que 66% dos americanos estão neste momento contra essa declaração - segundo uma sondagem da CBS.

Trump e os democratas entraram em choque por causa dos 5,6 mil milhões de dólares que o presidente quer para construir o muro com o México - a sua principal promessa de campanha em 2016. Ora, declarar uma emergência nacional permitiria ao chefe do Estado tomar medidas extraordinárias e ter acesso a fundos sem precisar da aprovação do Congresso - onde os republicanos reforçaram a maioria no Senado nas eleições intercalares de novembro, mas onde perderam a maioria na Câmara dos Representantes.

Os últimos tweets de Trump são bastante elucidativos sobre o seu estado de espírito. "Com caravanas a marchar pelo México e em direção ao nosso país, os republicanos têm de se preparar para fazer o que for necessário para termos uma segurança fronteiriça forte", escreveu na segunda-feira. "Os democratas não fazem nada. Se não houver um muro, não há segurança. Tráfico humano, drogas e criminosos de toda a espécie - fora daqui", acrescentou na mesma mensagem na sua rede social favorita.

Com a popularidade em queda (anda nos 37% de aprovação, segundo a Gallup) devido à cedência que teve de fazer para pôr fim ao shutdown e com a investigação à ingerência russa nas presidenciais de 2016 cada vez mais perto da Casa Branca, seria de esperar que Trump aproveitasse o Estado da União para apelar... à união.

Mas, tratando-se de Trump, nada é menos certo. É verdade que pode sempre contar com os números da economia para convencer uma audiência que em 2018 chegou aos 46 milhões de que deve votar para o manter na Casa Branca em 2020. Afinal, o desemprego, se em dezembro subiu de 3,7% no mês anterior para 3,9%, continua nos níveis mais baixos dos últimos 50 anos. E a economia americana cresceu 3% em 2018. Uma conjuntura que pode não durar muito mais: as previsões apontam para um abrandamento do crescimento em 2019 - para 2,3%.

Fim da transmissão da sida em 2030

Os discursos do Estado da União são muitas vezes usados pelos presidentes para fazerem anúncios sobre questões de saúde pública. E Trump não deverá ser exceção. Segundo altos responsáveis da saúde citados pelo Politico, o presidente está a ser pressionado para anunciar esta noite o fim das transmissões do vírus da sida em 2030.

Segundo a estratégia a dez anos desenvolvida pela administração Trump, os responsáveis do setor da saúde vão trabalhar com as comunidades de indivíduos infetados com o vírus da sida de forma a reduzir as novas transmissões, até estas ficarem reduzidas a zero.

Segundo dados do Centro para a Prevenção e Controlo de Doenças, há hoje um milhão de americanos infetados com o vírus da sida.

Em 2016, o democrata Barack Obama usara o seu último discurso do Estado da União para lançar um apelo à erradicação do cancro. Uma declaração ambiciosa e que não encontra, tal como a pretensão de Trump, correspondência na realidade - se é verdade que a incidência do cancro continua a baixar, mais de 600 mil americanos morreram devido a esta doença no último ano.

Resposta democrata: pela primeira vez uma mulher negra

Neste ano, a resposta ao discurso do Estado da União caberá a Stacey Abrams. Estrela em ascensão no Partido Democrata, Abrams perdeu em novembro a corrida para governadora da Georgia, numa eleição disputadíssima e após várias recontagens.

Primeira mulher negra a dar a resposta a um Estado da União, Abrams disse-se "honrada" com a escolha do partido. "Numa altura em que a nossa nação precisa de líderes capazes de unir o povo num propósito comum, sinto-me honrada por dar a resposta democrata ao Estado da União", escreveu no Twitter.

A versão em espanhol da resposta democrata, essa, ficará a cargo de Xavier Becerra, antigo congressista e atual procurador-geral da Califórnia.

Dar a resposta ao Estado da União é uma honra que cabe muitas vezes a estrelas em ascensão nos partidos. Em 2018 ficou a cargo do congressista do Massachusetts Joe Kennedy III, sobrinho-neto do presidente John Kennedy.

Mas, se dar esta resposta garante exposição mediática, nem sempre acaba bem. Em 2013, a escolha dos republicanos para responder a Obama recaiu sobre o senador da Florida Marco Rubio. E se, além da versão em inglês, este, filho de imigrantes cubanos, também fez a versão em espanhol, ficou na memória dos americanos sobretudo por ter interrompido o discurso para beber água de uma garrafa de plástico. É verdade que entretanto se reabilitou, tendo sido candidato às presidenciais em 2016 e tendo hoje um lugar de destaque no Senado.

Pior acabou Bob McDonnell. O ex-governador da Virgínia foi o escolhido para a resposta republicana em 2010. Mas o político promissor acabou detido quatro anos depois e condenado a dois anos de prisão por corrupção.

O futuro de Stacey Abrams, esse, é uma incógnita. Mas para já, ao saber da sua escolha para lhe responder, Trump garantiu: "Respeito-a." Palavras que contrastam com as que proferiu em novembro quando considerou a então candidata a governadora "sem qualquer qualificação", tendo afirmado: "Olhem para o seu passado, olhem para a sua história."

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