Web Summit foi montra para estratégia verde e digital da União Europeia
António Costa e Fernando Medina deram o tiro de partida da cimeira tecnológica, dando o tom português a um evento que neste ano decorre online por causa da pandemia. Nesta edição, o palco principal da Web Summit não foi no Parque das Nações, em Lisboa, como é habitual, mas em São Bento, nos Paços do Concelho, na capital, e nas múltiplas geografias de origem dos vários participantes remotos. A ver pelos ecrãs as intervenções dos políticos portugueses estiveram cerca de seis mil pessoas, num evento que promete mais de cem mil visitantes virtuais.
Numa mensagem gravada, o primeiro-ministro disse que "2020 é um ano marcado pela pandemia de covid-19", mas não apenas isso: "Foi um ano em que Portugal passou para a liga dos campeões da inovação", sublinhou.
"O ano em que, mesmo antes do início da pandemia, Portugal lançou o plano de ação para a transição digital visando a capacitação digital de pessoas, empresas e organismos do Estado. E também aquele em que Portugal registou 14% de aumento no número de estudantes nas áreas de investigação e tecnologia."
Já o presidente da Câmara de Lisboa disse que, "mais do que nunca, precisamos de eventos impactantes como este, eventos que mudam a forma como pensamos e ultrapassam os limites nestes tempos desafiantes". Para Medina, este evento ajudou Lisboa "a posicionar-se como uma das capitais do mundo que mais impulsionam as startups", através de "ideias e projetos incríveis" .
O autarca frisou que nos próximos meses "é preciso garantir uma recuperação rápida para mitigar os impactos sociais da pandemia e da crise económica". E prometeu que a cidade vai continuar a trabalhar na descarbonização, "com um sistema verde e mais sustentável, melhores transportes públicos e melhor infraestrutura ciclável".
Este primeiro dia de Web Summit serviu de verdadeira montra para a Comissão Europeia (CE) expor a sua estratégia ambiental e tecnológica para o espaço da União Europeia (UE). A presidente Ursula von der Leyen destacou que a Europa tem o potencial para liderar no digital, mas que é necessário ultrapassar vários obstáculos, nomeadamente na área da regulação.
O ano de 2020 trouxe uma crise económica sem precedentes à Europa, mas também trouxe "uma pandemia que foi um catalisador e um acelerador da mudança", disse von der Leyen. Mas se a líder da CE sublinhou o significativo crescimento das tecnológicas europeias ao longo deste ano, também não deixou fugir a ideia de que a UE continua a ficar aquém de todo o potencial que tem na área do digital. "Só em 2020 o valor das empresas tecnológicas europeias cresceu quase 50%. Está a atrair mais investimentos de venture capitalists do que nunca."
Além disso, destacou que "nos últimos cinco anos o valor das empresas tecnológicas europeias quadruplicou". A nível de recursos humanos, também referiu que a Europa concentra mais criadores de software do que os Estados Unidos.
"A Europa tem todo o poder para ser o próximo líder no digital", indicou a líder da Comissão Europeia, que também destacou que ainda há arestas a limar, nomeadamente no uso de dados. "80% dos dados que as nossas empresas recolhem não são utilizados. E isso é um tremendo desperdício", afirmou.
Além dos dados, também lamenta que o contexto regulatório e a burocracia tenham levado várias organizações a rumar a outros territórios, com regras mais leves. "Queremos dar mais poder à inovação", explicou, destacando a importância de haver um conjunto de regras uniformes na União Europeia.
"Quero que as empresas saibam que em toda a UE haverá um único conjunto de regras", sublinhou, destacando que a Europa quer disponibilizar as mesmas regras para todos, "de Lisboa à Lapónia".
Já o seu braço direito, o vice-presidente executivo da CE para o Pacto Ecológico Europeu, disse que "ninguém pode ficar para trás" com a transição verde, sublinhando que "não pode ser só para os ricos ou só para os jovens" e que "é decisivo" abarcar toda a gente.
Redução de emissões, novas políticas energéticas, mudanças nos transportes, veículos elétricos, painéis solares, reforma da Política Agrícola Comum - as metas são muitas e diversificadas, mas todas precisam de tecnologia para acontecerem. "A digitalização vai desempenhar um papel muito importante, mas tem de ser combinada com o ambiente", frisou.
O comissário vê em Portugal um exemplo "encorajador" do ponto de vista ambiental e energético. "Portugal é uma das forças motrizes do Pacto Ecológico Europeu", assinalou, referindo os "ativos incríveis" de que o país dispõe para levar a cabo a transformação.
"A única coisa que lhe falta é centralidade [geográfica] e, por isso, tem de apostar em conectar-se ao resto do mundo."
Os recursos naturais (sol, vento, mar) "colocam Portugal na pole position para a transição energética", defendeu, mencionando o caso concreto do hidrogénio, "uma enorme oportunidade [para Portugal], porque já tem alguma experiência" na área.
Mas a participação da Comissão não ficou por aqui. A portuguesa Elisa Ferreira também fez uma intervenção. E numa altura em que em Portugal as maiores empresas de telecomunicações e o regulador (Anacom) andam às avessas por causa das condições de construção, custos de investimento e de acesso à futura infraestrutura de comunicações móvel ultrarrápida 5G, na Europa o sucesso e o excelente funcionamento deste mercado já é um dado adquirido, segundo a comissária europeia da Coesão e Reformas.
Num dos painéis da Web Summit, Elisa Ferreira defendeu que mais do que estar simplesmente pronta, "a Europa está pronta para ser a líder mundial no 5G".
A comissária portuguesa declarou que está em curso "uma revolução, mas não devemos fazer esses avanços com as mesmas técnicas do passado, porque assim estaremos a repetir-nos", o que limita o potencial de crescimento e de coesão territorial.
Elisa Ferreira recordou que os próximos sete anos vão ser marcados por uma nova abordagem em termos de investimentos. Tem tudo de ser "verde". É o Pacto Ecológico europeu. A alta responsável de Bruxelas recordou que na política da coesão (a sua tutela direta) "dois terços dos investimentos previstos serão canalizados para inovação e projetos ecológicos". Segundo a ex-administradora do Banco de Portugal, estaremos a falar de "200 mil milhões de euros em subsídios a fundo perdido (grants) entre 2021 e 2027".
Numa sessão focada em como desenvolver a economia digital da União Europeia, o ministro da Economia, Pedro Siza Vieira, avançou que durante a presidência portuguesa do Conselho da União Europeia será preparada "uma declaração onde serão definidos os valores que devem organizar a sociedade digital".
Na mesma intervenção, onde também esteve presente Thierry Breton, o comissário europeu para o Mercado Interno, destacou a necessidade de a Europa desenvolver as infraestruturas que permitam tirar o maior partido da tecnologia. O foco nos dados pautou muitas das intervenções feitas por representantes da CE na Web Summit deste ano. Siza Vieira também abordou o tema dos dados, já no final da intervenção, sublinhando a necessidade de garantir que as instituições trabalhem com a indústria para "tirar valor de todos os dados".
Gwyneth Paltrow, atriz mas não só, também empreendedora, dona do marketplace Goop, protagonizou a última conferência do dia.
A atriz explicou como "a intersecção de conteúdo com o retalho é a chave - todas as marcas devem fazer conteúdo, é a forma como podemos encontrar a nossa tribo".
Já sobre o seu programa na Netflix - Goop Lab (que terá segunda temporada), admitiu que "que nem todos podem ter um programa que promove a sua marca", mas sugeriu que os empreendedores sejam criativos em "formas de chegar de forma orgânica aos seus clientes com conteúdo".
Para isso devem partir de valores e princípios que valorizam, fazer conteúdos e eventos que os promovam e esperar que "pessoas apaixonadas pelas mesmas ideias espalhem depois a palavra da nossa marca".