É verdade que as cidades têm uma "alma"? É uma boa pergunta (descontraída) para o verão e para uma viagem. Identidade têm, quanto mais não seja a administrativa, a geográfica e a histórica. Há, claro, cidades sobre as quais paira já uma perceção coletiva. No nosso caso, até já o turista estrangeiro que não conheça Lisboa, Setúbal ou o Porto criou de certeza algumas expectativas..À partida e à boa maneira portuguesa, acho que todos concordamos em que, de uma forma ligeira, se alguma alma uma cidade tem ela passará também por algo que tenha que ver com comida. A cultura gastronómica não é claramente um ícone lusitano? Podemos não ter tanta preocupação com o requinte gourmet (até temos cada vez mais) como França ou Itália, mas não pode haver dúvida de que em Portugal a mesa é idiossincrasia e, definitivamente, algo que nos particulariza. No Porto, temos a francesinha e o vinho do porto, em Setúbal o choco "frrite" e o moscatel. E em Lisboa? Sugiro o bacalhau à Brás e a ginjinha. Admito que nenhuma das minhas escolhas seja consensual... Até porque a globalização, a fusão cultural, as novas opções e os novos estilos de vida também chegaram à nossa mesa e todas as três cidades, como polos cosmopolitas que são, não lhes escaparam. Quando falamos da alma de uma cidade, pensamos também na dimensão da vida quotidiana, da rua, das compras e dos transportes, do espaço público e da oferta cultural. Esta é uma forma de conhecer uma cidade - pela sua fruição e degustação a todos os níveis..No entanto, temos também outra perspetiva. Uma perspetiva necessariamente mais séria: a do responsável político, em todas as suas valências. A esse, para conhecer uma cidade, não chegam o blogue nem os sites de viagens ou o restaurante de referência. Aos responsáveis políticos, para conhecer a realidade de um local, é mais útil fazer até um pouco o que fazia Anthony Bourdain nas suas viagens gastronómicas - procurava perceber também as vulnerabilidades e as dificuldades das pessoas. Isso, claro, só se consegue não só pelo contacto direto, mas também pela nossa capacidade de, conjuntamente, privilegiarmos o debate dos programas eleitorais e não a espuma das polémicas..No caso concreto de Setúbal, só entre 2015 e 2018, o distrito aumentou a exportação de bens em 84,4%. Só este fator poderia traduzir uma baixa incidência de desigualdades sociais e de assimetrias de oportunidades. Mais ainda quando aliado à forte presença da indústria transformadora, de que a Autoeuropa é símbolo, às potencialidades das suas praias e à sua posição geográfica estratégica, com Sines e não só. Mas a realidade será mesmo essa? Setúbal, no conjunto de todo o seu potencial, tem capacidade para se tornar muito mais do que apenas a outra face de Lisboa. Vou matutar no assunto..Deputada do PS