Precipitados jogos de poder
Eis que chegou a liberdade! Já cortámos a meta do dia 1 de outubro e nada mudou. Nas últimas 24 horas mais 696 casos e quatro mortos em Portugal. A pandemia teima em resistir. Ainda assim há 18 meses que não estávamos tão próximos da vida em pré-pandemia. Na quinta-feira e na sexta-feira à noite as esplanadas encheram-se de dia e de noite, as jantaras de amigos entoaram nas velhas ruas de Lisboa e a dança está agora permitida em discotecas. Os portugueses precisam de uma certa normalização, de rir, chorar, partilhar a gestão de uma dor que já leva ano e meio. A boa notícia é que, apesar das ruas cheias, muitos cidadãos continuam a usar máscara dentro e fora dos recintos, com a consciência que a conjuntura exige. Há exceções, mas há também um sentido de maior responsabilidade, até para que não se repita o último Natal. Avançamos seguros pelas ruas, agora que estamos vacinados.
Foi exemplarmente liderada a vacinação contra a covid-19 pelo vice-almirante Gouveia e Melo. E foi lamentável que nesta semana tenha visto o seu nome envolvido na polémica relacionada com a exoneração do almirante Mendes Calado do cargo de chefe de Estado-Maior da Armada (CEMA). A precipitação no anúncio da exoneração por parte do governo, neste caso o Ministério da Defesa, levou a que o Presidente chamasse a Belém o primeiro-ministro para uma reunião que foi percecionada pela opinião pública como uma espécie de "puxão de orelhas". Marcelo Rebelo de Sousa não se ficou. Mostrou quem manda, ou seja, quem é o chefe supremo das Forças Armadas. Não só foi um ato de coragem política, como soube ler nas entrelinhas todo o mal-estar que a saída antecipada do almirante Mendes Calado estava a provocar entre os militares.A saída já estaria acordada, bem como o nome de Gouveia e Melo sinalizado para o cargo, mas no timing definido. Sem mudar as regras do jogo a meio da partida. Marcelo é implacável perante situações deste tipo. Institucionalista por natureza, colocou o respeito e o dever perante as instituições militares onde deveriam sempre ter estado, no topo das prioridades.
No meio de tanta guerra política, egos e protagonismos, táticas e jogos de poder, parece-me que o mais importante é discutir o que é realmente melhor para as Forças Armadas e, já agora, não permitir que, depois de tanto esforço na task force, a imagem e a credibilidade de Gouveia e Melo saia beliscada de tudo isto. Contrariando Maquiavel, nem todos os fins justificam os meios.