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02 dezembro 2021 às 00h19

Requalificação do Mosteiro de Odivelas está em marcha e promete dar "sangue novo" à cidade

Numa visita guiada ao histórico monumento nacional, o autarca Hugo Martins explicou ao DN o projeto que deverá estar concluído no final de 2023. Apresenta a remodelação do mosteiro fundado pelo rei D. Dinis como "uma revolução" que visa o relançamento cultural do concelho e dará à população novas áreas de lazer e de conhecimento.

Odivelas prepara-se para ganhar nova vida através do projeto de revitalização do Mosteiro de São Dinis e São Bernardo. Estão em marcha profundas obras de remodelação neste Monumento Nacional, onde vai surgir uma vasta gama de serviços e entretenimento para a população, dos quais se destaca o Parque da Cidade. O investimento total previsto é de cerca de 18 milhões de euros, dos quais perto de 11 milhões a cargo do município de Odivelas, com apoio de candidaturas a fundos nacionais e comunitários. Os restantes sete milhões serão suportados por algumas entidades privadas que ali vão ter as suas instalações. O final das obras está previsto para o final de 2023.

Hugo Martins, presidente da Câmara Municipal de Odivelas, recebeu o DN em pleno Mosteiro e, durante uma visita guiada ao local, começando por fazer as história do projeto. "Recebemos o Mosteiro sem qualquer planta e projeto e nem sabíamos onde passava a rede de esgotos e de águas. Houve todo um trabalho de estudo para podermos começar a delinear a estratégia", começou por referir.

O projeto começou a desenhar-se em 2019, depois do acordo entre a Câmara Municipal de Odivelas, a Direção-Geral do Tesouro e Finanças e a Direção-Geral de Recursos da Defesa Nacional. Este Monumento Nacional passou a estar sob gestão municipal, através de um acordo de cedência com um prazo de 50 anos em que, para além do já referido investimento previsto por parte da autarquia, existe lugar ao pagamento de uma renda mensal de 23 mil euros, anualmente atualizável.

"O objetivo é transformar este património num polo de conhecimento, cultura e lazer", explica Hugo Martins. Para além do Parque da Cidade, o conjunto edificável comportará o novo Centro Interpretativo do Mosteiro de Odivelas (CIMO), um Campus Académico e Cultural, a instalação dos Serviços Municipais e um grande auditório.

O líder do executivo odivelense sublinha que "a população sempre viu o Mosteiro como algo que não lhe pertencia e cujo acesso lhe estava vedado". Foi por isso, sustenta, que sempre quis envolver os munícipes no futuro deste monumento. "O Mosteiro tem uma grande centralidade, pois permite fazer a coesão entre a Odivelas antiga e histórica e a nova cidade, na qual se destaca a urbanização Colinas do Cruzeiro e o Pavilhão Multiusos. Tínhamos ali o elemento-chave para fazer este cruzamento histórico e lançámos o desafio às entidades e à população para perceber quem queria dar uma nova vida ao Mosteiro", revela. Foi criado um regulamento e apareceram diversos parceiros, entidades privadas que ali vão ter as suas instalações.

Nas traseiras do Mosteiro, onde ficava um terreno agrícola, vai nascer o Parque da Cidade, zona que terá entre sete a oito hectares e que será uma zona de recreio e lazer, fazendo a travessia para a "nova Odivelas". Haverá piscinas, parque infantil, um grande palco para eventos, um lago, pontes suspensas e 435 lugares de estacionamento. E ainda uma praça com 2500 metros quadrados dedicada à restauração, com vários cafés e restaurantes, numa zona com muita sombra, proporcionada por árvores de grandes dimensões.

Destaca-se ainda a recriação do Jardim da Princesa, um dos locais mais emblemáticos do antigo Mosteiro e cuja requalificação irá valorizar os seus elementos históricos, nomeadamente o pequeno templo e o tanque de rega com os seus ornamentos do século XVIII. Refira-se que existiu o cuidado de preservar a grande pérgula que atravessa todo o parque, adaptando a paisagem às novas componentes lúdicas.

O parque será sustentável do ponto de vista ambiental e da iluminação pública. Na área designada por vale, no término de um grande relvado, será construído um riacho com cascatas e um lago que, para além dos benefícios ambientais, permitirá aproveitar as águas subterrâneas para a rega do parque. A escolha do nome do parque decorrerá de um concurso de ideias que será lançado pela autarquia.

De acordo com o autarca de Odivelas, o CIMO "consistirá num roteiro visitável com a integração dos espaços emblemáticos do Mosteiro num espaço museológico que engloba a igreja (túmulo de D. Dinis), a sala do capítulo, a receção, os claustros, a cozinha e refeitório das monjas, a sacristia e o espaço de conservação e restauro".

Durante a visita guiada com o presidente da autarquia odivelense, foi possível visitar sítios emblemáticos como a igreja, onde se encontra o túmulo de Dom Dinis - neste momento resguardado, mas observável através de um pequeno orifício - a Casa do Capítulo e o Claustro Novo, constituído por duas naves de estilo neoclássico. E ainda a cozinha, onde as monjas preparavam a famosa marmelada branca, que se encontra revestida a azulejos azuis e brancos. Aqui é possível encontrar um forno, uma pia de lavagens em pedra calcária e a roda giratória por onde passavam as refeições para o refeitório.

Está a ser feito um estudo exaustivo do túmulo de D. Dinis, numa parceria entre a Câmara Municipal de Odivelas e a Direção Geral do Património Cultural. "O rei está a ser estudado na dimensão antropológica, nas suas vestes e a forma como foi exumado. Vai ser possível conhecer como era o Rei, a sua estatura, dentição, altura. Já houve um investimento municipal de mais de 300 mil euros no estudo deste túmulo", revela Hugo Martins. No final do estudo, será publicado um relatório que poderá mostrar como era o rosto do rei conhecido como "O Lavrador", que tipo de alimentação mantinha e até se terá alguma marca nos ossos da luta com o urso, de acordo com a lenda que está na origem da construção do Mosteiro.

O ISCTE vai instalar, na zona da camarata das antigas alunas do Instituto de Odivelas, uma residência para estudantes com capacidade para 200 pessoas. Esta universidade também irá aqui realizar Escolas de Verão e de Inverno, bem como workshops. Por outro lado, no campus universitário do ISCE - um politécnico privado do concelho - destaca-se a dinamização e o alargamento do projeto da Universidade Sénior já existente. Aqui ficará ainda instalado o Conservatório D. Dinis, o segundo maior conservatório da "Área Sul e Ilhas de Portugal" e que terá um papel de formação e dinamização da arte e da cultura no município. "O objetivo é trazer de volta o ADN do Mosteiro, que sempre foi uma casa de cultura e de conhecimento", sustenta Hugo Martins.

Também os serviços da Câmara Municipal de Odivelas passarão a estar neste local, nomeadamente os serviços do turismo, cultura e o gabinete do presidente e dos eleitos. Existe ainda um grande auditório, onde as antigas alunas faziam teatro, ginástica e festas de carnaval, que será renovado e aproveitado como centro de congressos, mas num local onde se podem realizar peças de teatro e concertos.

De acordo com o presidente da Câmara de Odivelas, "apenas em Évora é que haverá um campus histórico dentro da cidade com esta dimensão". E destaca: "Estamos a falar de um parque da cidade, de um circuito visitável num espaço museológico, de serviços municipais para receber os utentes, de 200 alunos do ISCTE que aqui vão residir, dos cursos do ISCE e do Conservatório de Música."

"Este projeto dará um sangue novo à cidade, com cultura, lazer e conhecimento. Será sem dúvida um projeto transformador na Área Metropolitana de Lisboa, uma revolução no concelho de Odivelas e que servirá como fator de revitalização económica", antevê Hugo Martins. Reconhecendo que se trata de "um enorme desafio", o seu único receio é que a pandemia seja o grande inimigo, acabando por atrapalhar e atrasar a implementação do calendário previsto.

Fundado por El-Rei D. Dinis em 1295, na sua Quinta de Vale de Flores, em Odivelas, o Mosteiro foi construído entre 1295 e 1305. A hipótese mais forte para a sua edificação tem a ver com uma lenda, segundo a qual o monarca terá sofrido o ataque de um urso quando caçava perto de Beja. Numa ação de graças por ter sobrevivido, terá prometido construir uma capela no Convento de São Francisco, em Beja e, depois, a edificação de um mosteiro cisterciense.

Depois da sua edificação, o Mosteiro foi doado às monjas Bernardas da Ordem de Cister. De estilo gótico primitivo cisterciense, foi construído de acordo com o modelo estabelecido pelo reformador da Ordem, São Bernardo de Claraval, mentor espiritual da Ordem de Cister. Após o terramoto de 1755 sofreu uma reconstrução que alterou profundamente a traça primitiva do edifício, com a introdução do estilo neoclássico, quer na igreja, quer nos lanços do Claustro Novo.

Em 1888, o Mosteiro encerrou definitivamente na sequência da legislação que ordenou a extinção das Ordens Religiosas. Nas instalações do Mosteiro funcionou, até ao fim do ano letivo de 2014/15, o Instituto de Odivelas, propriedade do Ministério da Defesa, tendo depois sido transferido para Lisboa. Em 2019, a gestão do Mosteiro passou para a Câmara Municipal de Odivelas.

dnot@dn.pt