Lições para não esquecer
1 Em 2020 vivemos dos tempos mais dramáticos das nossas existências. Perdemos valor na economia, esteve em risco a sobrevivência de muitas pessoas, famílias e empresas, a morte rondou. Ao mesmo tempo abriram-se oportunidades: demos passos enormes numa digitalização mais inclusiva, voltámos a ter consciência da importância da vida, percebemos que há mais maneiras de viver.
Todas as crises trazem lições. Temos agora a oportunidade de recriar o nosso futuro com base na experiência feita. Quem enfrenta a morte sabe valorizar melhor a vida.
Em 2020 deixámos que o medo tomasse conta das nossas decisões. Nem sempre acreditámos que a solução passa por confiar mais nos indivíduos. Deixámos muitas vezes que fosse o Estado a marcar caminho, num processo de infantilização das pessoas e da sua vontade que muitos querem impor. E que temos de contrariar.
Quem faz a história são as pessoas e a vontade de cada um na recusa de seguir os ditames do momento. Assim, aquilo que vos proponho para o ano de 2021, ano da esperança, é que criemos um futuro mais inclusivo, mais humanizado, assente no poder de cada um. Em que a economia seja vista como um instrumento e não um fim. A economia é uma ferramenta de criação de riqueza, que apenas se justifica se essa riqueza se destinar a promover o nosso crescimento como pessoas e a criar caminho para atingir patamares de vida dignos. O objetivo de vida de cada pessoa é ser feliz e hoje aprendemos que somos cada um responsável pela felicidade de todos. De resto, duvido de que na equação do PIB real este critério já esteja a ser considerado.
2 É certo que nem tudo o que veio do Estado foi nefasto. Graças a uma rápida consciencialização do tamanho dos perigos, governos e organizações internacionais entenderam-se no essencial para criar plataformas de ajuda como nunca tínhamos visto. E assistimos a uma excelente articulação entre ciência, indústria e estados que permitiu a vacina em tempo recorde: cientistas e indústria descobriram e desenvolveram, o Estado aprovou. Talvez deva ser este o modelo que nos deve inspirar, é isto que devemos querer. Iniciativa privada forte, responsável, com disponibilidade para investir, sabendo que o Estado está lá para não criar dificuldades. Imagine, caro leitor, esta prática levada ao limite e aplicada, por exemplo, ao licenciamento industrial. Imagine que cada autarca, cada burocrata deste país, entendia a criação de emprego como prioridade de vida ou morte; imagine que a administração pública passava a responder em dias ou poucas semanas aos requerimentos, porque se não o fizesse teria uma opinião pública forte a exigir prazos e responsabilidades. Imagine que poderia votar nas presidenciais de 24 de janeiro a partir de casa; imagine que o ministro da Economia era obrigado a fazer conferências de imprensa diárias para prestar contas sobre empregos e empresas nascidas, mortas ou recuperadas.
Portugal precisa de escolher o seu caminho para este novo futuro. Temos de pôr a tecnologia ao serviço dos processos, ganhar competitividade, diminuir a burocracia, exigir responsabilidade, aumentar a produtividade, para que se possa distribuir por todos os ganhos obtidos.
Há muitos anos que defendo que não haverá futuro se o rendimento de cada um não melhorar significativamente. A covid e as desgraças que trouxe não podem ter sido em vão. Aproveitemos as lições.
PS. Permitam-me uma palavra a todos os que não desistiram e souberam resistir. O regresso da edição diária em papel do Diário de Notícias é a demonstração de que há sempre caminho quando há vontade.
bruno.bobone.dn@gmail.com