"Quantos é que não sabiam andar de bicicleta e agora já sabem?", pergunta Paulo Vaz, diretor da escola de ciclismo de Lisboa Coelhinhos. Quatro dos 23 alunos da turma de 2.º ano da Escola Básica dos Coruchéus, em Lisboa, levantam os braços. "E esta [turma] não é uma das piores. No ano passado, tivemos uma turma de 4.º ano com 25 alunos, 80% não sabiam andar de bicicleta. E estas crianças estão no limiar da aprendizagem, a partir daí entram na idade da vergonha", diz o instrutor..Esta é a última das quatro aulas anuais de ciclismo da turma, nas quais os miúdos trabalham o equilíbrio e aprendem a contornar obstáculos. No ano passado, a escola Coelhinhos ensinou 1545 crianças de 14 escolas a andar de bicicleta. Fazem-no de forma gratuita para os alunos, uma vez que estas aulas resultam de um protocolo com a Junta de Freguesia de Alvalade..Uma petição já com dez mil assinaturas.Pedalar de forma segura é o que se pretende. Tal como estão a pedir a Federação Portuguesa de Ciclismo e a Associação pela Mobilidade Urbana em Bicicleta numa petição, que já conta com mais de dez mil assinaturas e que motivou propostas do PAN, do CDS-PP e do Partido Ecologista "Os Verdes" (PEV) sobre esta temática..Segundo Delimino Pereira, presidente da Federação Portuguesa de Ciclismo, o objetivo da petição é que "seja cumprida a lei, porque quando se atropela um ciclista, quando não se cumpre a distância correta entre os ciclistas e os automobilistas, não é cumprida a lei. E depois é preciso divulgar mais a lei".."É preciso educar e criar um bom entendimento entre o ciclista e o automobilista. É preciso ensinar a andar de bicicleta: temos muitas crianças na escola que não sabem andar, que não sabem utilizar corretamente os travões, que não conseguem andar numa linha direita. E quando se aventuram e vão para a estrada a coisa pode correr mal", continua Delimino Pereira..Levar a bicicleta para a estrada faz parte do programa da escola de ciclismo Os Coelhinhos para os 3.º e 4.º anos do 1.º ciclo. Até lá, os exercícios envolvem conhecer a bicicleta, andar a direito, contornar obstáculos, fazer sinais para a direita, para a esquerda e percorrer o recreio desviando-se de Paulo Vaz ou de um dos outros dois instrutores que se vão colocando à frente das bicicletas para simular peões mais desatentos. "Com isto podem ser adultos com outras capacidades para andarem de bicicleta na via pública", comenta a professora da turma, Helena Lourenço, enquanto assiste à atividade..A aprendizagem tem curvas e às vezes os alunos escorregam. "Isto é difícil", diz uma rapariga que se desequilibrou e acabou no chão, mas não tardou muito a pôr-se de novo em movimento. O treino evita as quedas. "No ano passado fizeram este exercício, neste ano estão melhores. Eu fiquei admirada com a evolução deles", reconhece Susana Carrasco, da escola de ciclismo..As propostas de CDS, PEV e PAN.A pensar nos alunos que se deslocam para a escola desta forma, o grupo parlamentar do CDS-PP apresenta nesta sexta-feira, na Assembleia da República, um projeto de resolução para pedir uma atualização do regulamento do seguro escolar para que estejam incluídos acidentes com velocípedes sem motor.."A ideia é estender às bicicletas aquilo que já existe na deslocação dos alunos para as escolas a pé e em veículo motorizado. Nós entendemos que não faz sentido nenhum que quem vai de bicicleta seja penalizado e que não tenha a cobertura que têm outros meios. Por um lado é a proteção dos alunos, por outro é a promoção de boas práticas", explica ao DN o deputado do CDS João Almeida..Também o PEV indica que "não faz sentido que o seguro escolar não cubra acidentes ocorridos com este meio de transporte utilizado por alunos nas deslocações pendulares entre as suas casas e a escola que frequentam", numa resolução sobre o mesmo tema. O DN tentou obter mais informações junto do grupo parlamentar sobre a recomendação que vão apresentar ao governo, mas não obteve resposta em tempo útil..Já o PAN vai defender a criação de um grupo de trabalho que "promova a criação de estratégia nacional, integrada e abrangente, para a mobilidade em bicicleta, que aborde, nomeadamente, além de infraestruturas, questões como a intermodalidade com os transportes públicos, a sinistralidade rodoviária, a qualidade do espaço urbano, a educação para a mobilidade sustentável, incentivos à utilização da bicicleta e mudança de comportamentos", indicou ao DN o deputado do PAN, André Silva..Mais ciclistas e mais acidentes.A necessidade de pensar em medidas de combate aos riscos inerentes à utilização de bicicletas acontece numa altura em que o número de ciclistas está a aumentar, tal como o número de acidentes neste meio de transporte..Em 2018, houve 1052 acidentes com bicicletas, que resultaram em dois mortos, 39 feridos graves e 868 feridos ligeiros, segundo dados cedidos ao DN pela Direção Nacional da PSP.."Tem aumentado o número de acidentes de bicicletas, porque também tem aumentado o número de utilizadores de bicicleta", diz o presidente da Federação Portuguesa de Ciclismo. "Nós nunca tivemos tantos ciclistas a filiar-se. Neste momento, temos 18 mil filiados, mas estimamos que haja mais de 50 mil praticantes regulares e praticantes de fim de semana. De certeza que é um número superior a um milhão de pessoas.".Além da prática desportiva, a bicicleta é cada vez mais usada numa lógica de mobilidade. Este meio de transporte é mais amigo do ambiente, emite menos gases de efeitos estufa e reduz a poluição sonora.."É uma prática desportiva saudável, ecológica e acessível - uma bicicleta dura muitos anos. Depois, o ciclismo é uma prática para todas as idades, desde crianças até idosos. Temos aqui um ciclista que tem 90 anos e ainda faz todas as semanas 200 quilómetros. E a introdução das bicicletas com resistência elétrica veio facilitar muito a questão das subidas", indica Delimino Pereira.."Os países quando apostam nas bicicletas têm de o fazer em todas as frentes. Nós não podemos estar a pensar em gastar 300 milhões de euros em ciclovias até 2030 e depois as pessoas não sabem andar de bicicleta ou os pais não autorizam os filhos a andar porque o risco é elevado. É preciso que haja medidas globais, que seja uma causa nacional, e o nosso país tem muito a ganhar com isso. Até porque temos uma das indústrias mais evoluídas de construção de bicicletas do mundo; portanto, temos aqui um interesse económico associado", diz o presidente da Federação.."Os benefícios socioeconómicos anuais da utilização da bicicleta na União Europeia estão avaliados em mais de 500 mil milhões de euros (cerca de 3% do produto interno bruto da União Europeia). Destes, cerca de um terço corresponde a benefícios de saúde, resultando em consideráveis reduções de custos para os sistemas nacionais de saúde", explica António Pedro, presidente da Associação pela Mobilidade Urbana em Bicicleta, também responsável pela petição sobre os riscos associados à pratica do ciclismo..Bicicletas no Código da Estrada.Com a Lei n.º 72 de 2013, os ciclistas ganharam mais direitos, como poderem circular na estrada e não só nas ciclovias ou a recém-obtida prioridade quando se apresentam pela direita..Os automobilistas devem ainda sempre manter uma distância de segurança de pelo menos 1,5 metros das bicicletas. Caso não cumpram esta diretiva, a sanção aplicada pode ir de 60 a 300 euros.."Os velocípedes podem circular paralelamente numa via, exceto em vias com reduzida visibilidade ou sempre que exista intensidade de trânsito, desde que não circulem em paralelo mais do que dois velocípedes e tal não cause perigo ou embaraço ao trânsito. Os condutores de velocípedes devem transitar pelo lado direito da via de trânsito, conservando das bermas ou passeios uma distância suficiente que permita evitar acidentes.", pode ler-se no artigo n.º 90 do Código da Estrada..Quanto à necessidade de utilizar capacete, este é obrigatório no caso de "dispositivos de circulação com motor elétrico, autoequilibrados e automotores ou de outros meios de circulação análogos" (artigo 82.º). Nas bicicletas sem motor, o capacete não é obrigatório, mas é aconselhado.