Um terço das empresas públicas está em falência técnica, fundo do ex-BPN é o pior caso
Um terço das empresas públicas portuguesas está numa situação financeira e económica muito grave, com capitais próprios altamente negativos e a acumular prejuízos sucessivos, ano após ano, indica um novo estudo do Conselho das Finanças Públicas (CFP) sobre o Setor Empresarial do Estado (SEE), ontem divulgado. O pior caso é, de longe, o da Parvalorem, um dos três veículos criados na sequência da nacionalização do Banco Português de Negócios (BPN), em 2008.
A Parvalorem ficou com os restos do BPN, com muitos ativos problemáticos, tóxicos, imparidades. Até hoje, não parou de acumular dívida (que contrai junto do Estado, ou seja, às custas dos contribuintes) e a dar prejuízos de centenas de milhões de euros todos os anos.
O trabalho da entidade que avalia as Finanças Públicas, que vai até ao final de 2023, “analisa 86 empresas não financeiras e seis financeiras do SEE”, as maiores e mais representativas num universo de 147 entidades, dando emprego a mais de 160,6 mil pessoas. Destas, 29 empresas estavam em “falência técnica”, ou seja, um terço do total, diz o CFP.
Segundo o Conselho presidido por Nazaré da Costa Cabral, “no final de 2023, identificam-se 29 empresas não financeiras do SEE com capitais próprios negativos, o que corresponde a aproximadamente um terço do universo considerado”.
O CFP explica que “a presença de capitais próprios negativos significa que estas empresas se encontram numa situação que pode ser categorizada como de falência técnica”, sendo que “cinco destas empresas concentram mais de 90% do valor negativo global do setor, com destaque para a Parvalorem”. “As restantes 57 empresas não financeiras consideradas nesta análise apresentavam capitais próprios positivos, com cinco delas a concentrarem 79%” desse valor.
Só para se ter uma ideia do descalabro que a Parvalorem significa e pode ainda vir a significar para as contas portuguesas, o seu capital próprio negativo ascende a 4,9 mil milhões de euros.
Segundo o próprio Ministério das Finanças, no relatório da proposta de Orçamento do Estado para 2025 (OE 2025), a Parvalorem tem por pagar (ao Estado) empréstimos na ordem dos cinco mil milhões de euros (situação no final do primeiro semestre deste ano). A Parparticipadas, outro veículo com ativos tóxicos do antigo BPN, devia mais 125 milhões.
A escala de falência técnica da Parvalorem contrasta com a segunda pior, a TAP, SGPS, que tinha um capital próprio negativo muito mais baixo, na ordem dos 1,3 mil milhões de euros, no final do ano passado, segundo o CFP.
A Saúde “foi o setor que acumulou mais prejuízos em 2023, num total 993 milhões de euros, 76% do resultado líquido negativo do SEE”, indica o CFP.
Do outro lado do ranking, as empresas públicas que atualmente mais sólidas em termos de capital são a Infraestruturas de Portugal (rede de estradas públicas e ferrovia), com 12,9 mil milhões de euros em capital próprio. E, segundo o mesmo critério, logo a seguir surge o Metropolitano de Lisboa, com 1,9 mil milhões de euros em capital próprio.
Estes valores muito elevados explicam-se pela necessidade de as referidas empresas terem atualmente em curso planos de expansão e investimento de grande magnitude.
O CFP refere ainda que “apenas 33 das 86 empresas (ou grupos de empresas) registaram resultados líquidos positivos, num total de 517 milhões de euros”, sendo que “as restantes 53 registaram prejuízos de 1,3 mil milhões de euros (dos quais 98,5 milhões de euros decorrentes da Parvalorem, a empresa com o maior prejuízo em 2023)”.
Este ano, Nazaré da Costa Cabral foi ao Parlamento falar deste tema difícil. Disse coisas como “a Parvalorem e a Parups são sorvedouros de dinheiros públicos - não há outra forma de o dizer - com permanentes injeções de capital, desde logo empréstimos”, são “uma herança que tarda em resolver-se”, “ uma ferida nas nossas finanças públicas”.
Segundo o Tribunal de Contas, o prejuízo global acumulado até agora imputado aos contribuintes e decorrente da falência do BPN ascende a seis mil milhões de euros, uma fatura que ainda está bem longe de ser fechada.