Tribunal de Contas declara "não conformidade" da CGE de 2023 com Lei de Enquadramento Orçamental

Tribunal de Contas declara "não conformidade" da CGE de 2023 com Lei de Enquadramento Orçamental

Tribunal de Contas emitiu juízo de "não conformidade" da Conta Geral do Estado 2023 com a Lei de Enquadramento Orçamental, por não integrar as demonstrações orçamentais e financeiras consolidadas da Administração Central e da Segurança Social.
Publicado a
Atualizado a

O Tribunal de Contas (TdC) emitiu esta quarta-feira um juízo de "não conformidade" da Conta Geral do Estado 2023 com a Lei de Enquadramento Orçamental, por não integrar as demonstrações orçamentais e financeiras consolidadas da Administração Central e da Segurança Social.

Num comunicado divulgado no dia em que entregou ao Presidente da Assembleia da República, José Pedro Aguiar-Branco, o parecer sobre a Conta Geral do Estado (CGE) do ano passado, o TdC sustenta que "este incumprimento compromete o objetivo de a Conta proporcionar uma imagem verdadeira e apropriada da execução orçamental e financeira", impossibilitando a sua certificação por parte do Tribunal.

O juízo do TdC inclui ainda "reservas, por omissões e erros materialmente relevantes", tendo sido emitidas 67 recomendações ao Governo e à Assembleia da República, com vista a "suprir as fragilidades detetadas".

Segundo o Tribunal, "os atrasos na implementação da Lei de Enquadramento Orçamental não permitem complementar a contabilidade orçamental com informação financeira e de gestão", apontando o Ministério das Finanças "para uma implementação gradual e faseada da Lei, o que torna necessária a adequação dos prazos legalmente definidos e já ultrapassados".

Adicionalmente, refere, "o estado de desenvolvimento dos projetos de implementação da Lei de Enquadramento Orçamental indicia que, mesmo que seja possível concretizar os investimentos previstos em sede de financiamento do Plano de Recuperação e Resiliência [PRR] e operacionalizar os sistemas de informação, existem riscos que condicionam as condições de produção da informação de gestão e de prestação de contas nos moldes previstos, em 2026 (ano indicado pelo Ministério das Finanças para a preparação da Conta nos termos da lei)".

De acordo com o TdC, os atrasos na implementação da Lei de Enquadramento Orçamental "prejudicam uma contabilidade orçamental mais rica, uma contabilidade financeira mais avançada e uma contabilidade de gestão orientada para a transparência", derivando estes atrasos "da inexistência de condições essenciais".

O parecer do TdC dá ainda conta de um "retrocesso face ao ano anterior" do reporte da execução das medidas de política, não sendo divulgada a execução "de uma parte significativa" das medidas, "em prejuízo da transparência da informação", permanecendo o seu enquadramento plurianual "limitado".

"Algumas componentes da receita e da despesa apresentam recorrentemente, desde 2017, desvios entre as previsões orçamentais e a execução", traduzindo-se estes desvios "na suborçamentação da receita fiscal [em 159 milhões de euros] e de contribuições sociais e na sobreorçamentação da receita de fundos europeus e da maioria das rubricas de despesa, em especial o investimento, que, em 2023, ficou 2.202 milhões de euros abaixo do previsto", refere.

No parecer hoje divulgado, o TdC alerta para a necessidade de acelerar a execução do PRR, detalhando que no final de 2023 "apenas 16% do valor total programado havia chegado efetivamente aos executores dos investimentos" e que "se encontrava por executar/validar um montante avultado (18.579 milhões de euros)".

Destaca também as despesas com a habitação, "que têm vindo a crescer desde 2019, mas cujas limitações de reporte não possibilitam uma avaliação sobre a intervenção do Estado neste âmbito".

Segundo o TdC, entre 2019 a 2023 a despesa com habitação aumentou 188,6% devido à subida dos preços da habitação e dos valores das rendas, atingindo 303 milhões de euros, o que "fez acelerar a intervenção do Estado no apoio à habitação".

Ainda salientado pelo Tribunal é o não apuramento da despesa fiscal para um terço dos benefícios fiscais, assim como "fragilidades" no subsídio social de mobilidade, no apoio extraordinário à renda e no controlo das dívidas fiscais na atribuição de benefícios fiscais, designadamente no caso dos residentes não habituais, que representa 62,8% da despesa fiscal em IRS.

Ao nível do património financeiro, o Tribunal refere que as participações do Estado no capital das empresas totalizaram 39.389 milhões de euros em diversos setores, sendo 90% destas participações geridas pela Direção Geral do Tesouro e Finanças e as restantes, maioritariamente, pela Parpública e pelo Fundo de Resolução.

De acordo com o TdC, a despesa com ativos financeiros "continua sobrevalorizada" na Conta da Administração Central e "subsiste a falta de inventário e de uma valorização adequada dos imóveis do Estado".

"O Relatório da Conta apresenta informação incompleta sobre as operações imobiliárias, omitindo 94,5% da receita de alienações e 55,5% da despesa com aquisições de imóveis", precisa, acrescentando que "o reporte sobre as rendas recebidas como contrapartida pela ocupação dos imóveis é incompleto" e que, "do valor devido de rendas, de 2014 a 2023, estão por pagar cerca de 23%". 

Excedente da CGE em 2023 reduzido a metade se excluídas operações excecionais

O excedente orçamental de 7.371 milhões de euros da Conta Geral do Estado em 2023 seria reduzido a metade se excluído o efeito de duas operações excecionais de valor superior a 3.700 milhões, nota o TdC num parecer hoje divulgado.

No "Parecer sobre a Conta Geral do Estado de 2023" hoje entregue ao presidente da Assembleia da República pelo presidente do Tribunal de Contas (TdC), José Tavares, e pela juíza conselheira relatora, Ana Furtado -- em que emite um juízo de não conformidade com a Lei de Enquadramento Orçamental --, o Tribunal nota que a Conta Geral do Estado inverteu em 2023 "a tendência deficitária dos últimos anos".

Contudo, refere, "excluindo o efeito de duas operações excecionais -- a transferência do Fundo de Pensões do Pessoal da Caixa Geral de Depósitos (3.018 milhões de euros] e a devolução ao Estado de parte do valor transferido em 2022 para apoio ao Sistema Nacional de Gás (700 milhões de euros) --, o excedente seria metade do verificado".

No parecer, o TdC sinaliza que a utilização de excedentes "está limitada a certas finalidades, no caso de 2023, ao pagamento de pensões futuras".

"Parte das receitas que contribuem para o excedente orçamental de 2023 apenas pode ser utilizada para assegurar o pagamento de pensões futuras: a transferência das responsabilidades do referido Fundo de Pensões foi aplicada em dívida pública, constituindo uma reserva para fazer face aos encargos futuros; e o excedente da segurança social (5.477 milhões de euros), quase integralmente gerado no sistema previdencial, deve integrar o Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social para colmatar eventuais défices desse sistema", concretiza.

Segundo o Tribunal de Contas, a redução de 4,6% da dívida pública consolidada face a 2022 "é também reflexo de uma parte importante do financiamento (mais 18.227 milhões de euros do que em 2022) ter sido assegurada junto de entidades do próprio perímetro orçamental".

O TdC alerta que "o elevado 'stock' de dívida, em paralelo com uma eventual diminuição dos programas de compra de ativos por parte do Banco Central Europeu e o prolongamento das tensões geopolíticas, reforça os riscos nesta área, em especial em anos com elevado montante de dívida a refinanciar, como 2027 e 2030".

Relativamente à carteira de dívidas a cobrar pela Autoridade Tributária e Aduaneira, o TdC nota que a dívida incobrável (10.419 milhões de euros) "mais do que triplicou desde 2016", apesar de regimes de apoio como o pagamento de dívidas em prestações e a compensação de créditos.

Segundo refere, em 2023 a dívida incobrável "já representa 38,9% da dívida total (26.758 milhões de euros)", sendo este aumento atribuído às crises financeiras, à pandemia e à crise energética, bem como à alteração da jurisprudência quanto à contagem do prazo que decorre até à prescrição da dívida. No ano passado, acrescem dois processos em validação "de valor excecionalmente elevado" (1.003 milhões de euros).

Ainda referido pelo Tribunal é que, no final de 2023, os pagamentos em atraso há mais de 90 dias totalizavam 228 milhões de euros, "o valor mais elevado desde 2020, interrompendo a tendência decrescente dos últimos cinco anos".

No exercício de 2023, 81% de entidades já prestaram contas no SNC-AP Sistema de Normalização Contabilística para as Administrações Públicas, embora cobrindo apenas 54,2% do volume financeiro da Conta Geral do Estado.

Por sua vez, todas as entidades do subsetor da Segurança Social adotaram em 2023, pela primeira vez, aquele referencial contabilístico.

Artigos Relacionados

No stories found.
Diário de Notícias
www.dn.pt