Maior procura, mais rotas e constrangimentos nos aeroportos, principalmente na Portela. A lista de ingredientes para a época alta na aviação não é nova. As variáveis complexas, que se somam ao habitual pico da afluência nesta altura do ano, levam a TAP a antecipar a exigência da operação. “Será desafiante, tendo em conta a perspetiva de um aumento de tráfego no verão e considerando a infraestrutura atual. Como atuamos numa lógica de hub, Lisboa tem um peso relevante, aliás, como sempre”, admite a companhia ao DN.A transportadora aérea liderada por Luís Rodrigues nota que há um peso acrescido por via das cinco novas rotas lançadas neste verão IATA [definido pela Associação Internacional de Transportes Aéreos, entre 30 de março a 25 de outubro], nomeadamente com as ligações entre Lisboa e Los Angeles, Porto e Boston, Faro e Funchal, Terceira e São Francisco e a retoma do trajeto que liga a capital portuguesa a Porto Alegre. A empresa pública garante que ajustou “o quadro operacional para responder ao aumento da atividade”, sem adiantar, no entanto, o número de trabalhadores que contratou. Ao que o DN apurou, a TAP recrutou 100 tripulantes de cabine, 80 pilotos e reforçou ainda a área da Manutenção e Engenharia. Ainda assim, os vários sindicatos ouvidos pelo DN antecipam desafios.O Sindicato dos Técnicos de Manutenção de Aeronaves (Sitema) classifica como positiva a “enorme ambição” da companhia aérea no incremento de rotas e na aposta novos destinos, mas alerta para a “complexidade” da atividade dos próximos meses que irá exigir além de um “planeamento meticuloso” também o reforço do quadro de pessoal. “Se não forem garantidos os meios humanos e logísticos adequados, nomeadamente ao nível dos técnicos de manutenção de aeronaves (TMA), há o risco de pressões operacionais graves, o que pode afetar a fiabilidade da frota e comprometer a segurança e a pontualidade. A operação só poderá correr bem se os recursos forem adequados à sua dimensão”, alerta ao DN o presidente do Sitema, Jorge Alves. Atualmente, a transportadora de bandeira conta com cerca de 850 TMA, um número que o representante da estrutura sindical refere estar “muito próximo do limiar mínimo para garantir a manutenção da frota com segurança e eficácia”, considerando o volume de voos da época alta.Embora a TAP tenha promovido recentemente um curso de formação para os profissionais desta categoria, o impacto nas escalas não será imediato. “Um TMA qualificado demora vários anos até estar plenamente habilitado para o desempenho de funções críticas. Não há hoje um robustecimento que nos permita dizer que os recursos são suficientes”, reitera.Do lado dos tripulantes, o panorama não difere, com a apreensão a emergir no horizonte. “Olhamos para o verão com alguma preocupação, não posso negar. O facto de ter existido um atraso significativo na contratação de novos tripulantes de cabine, e perante o aumento da operação face ao ano anterior, deixa-nos com algumas reticências. Os novos tripulantes devem começar a trabalhar em julho, mas deveriam ter entrado mais cedo”, explica o presidente do Sindicato Nacional do Pessoal de Voo da Aviação Civil (SNPVAC), Ricardo Penarroias.O sindicalista ressalva, no entanto, que há mecanismos que poderão ser acionados, à semelhança do que aconteceu ano passado, de forma garantir o cumprimento do plano de voos. “Uma das medidas é a possibilidade de operar aviões A319, que exigem quatro tripulantes, com menos um elemento. Como é lógico essa medida exigiu compensações financeiras, mas permitiu o não cancelamento dos voos, evitando constrangimentos para a operação e para os passageiros”, relembra. Trabalhar durante o período de folgas e de férias foi outra das soluções encontradas junto desta classe profissional , composta por 3357 tripulantes, que acordou com a TAP “uma majoração superior” nestas circunstâncias. .TAP opera menos voos este verão, mas operação é “mais complexa”.A TAP lançou cinco novas ligações entre abril e o início deste mês, mas o número de voos projetados diminuiu face ao verão de 2024. Contas feitas, considerando o período entre abril e setembro de 2025, a transportadora irá operar cerca de 66 mil voos, o que representa um ligeiro decréscimo homólogo de 0,9%. Na prática, serão menos 305 voos, de acordo com os cálculos realizados para o DN pela SkyExpert. Apesar do recuo, a gestão operacional apresenta desafios acrescidos. “A operação da TAP nos verões de 2024 e de 2025 é sensivelmente a mesma, mas engloba uma maior complexidade e mais tripulantes fora da base - com cinco destinos ultra-longos com poucas frequências semanais e que ocupam mais recursos por isso mesmo”, explica Pedro Castro, diretor da empresa de consultoria de transporte aéreo, aeroportos e turismo. O responsável exemplifica: “As rotas de Porto Alegre, Florianópolis, Los Angeles, São Francisco via Terceira e Manaus via Belém têm uma combinação de poucas frequências e de exigência de maior descanso para a tripulação no destino e quando regressam à base. O uso das tripulações é menos produtivo e menos rotativo do que quando os tripulantes voam para Nova Iorque num dia e regressam no outro, por exemplo.”A companhia aérea opera atualmente com a capacidade limitada a 99 aeronaves, fruto das restrições impostas pela Comissão Europeia no âmbito do plano de reestruturação aprovado em 2021 e que terminará no final deste ano. Para Pedro Castro, a matemática não é difícil de explicar.“Enquanto a TAP não tiver mais aviões, não poderá crescer muito mais em número de voos. Pode apenas densificar um pouco mais o uso do avião, mas terá de considerar sempre a manutenção de um índice rentável de número de tripulantes por avião disponível”, diz.O diretor da SkyExpert sublinha ainda que a operação da TAP no verão “é sempre mais exigente” em comparação com o período de época baixa, particularmente nas ligações para os Estados Unidos e Canadá. “A TAP defende-se dessa sazonalidade incentivando férias fora do período de verão e recorrendo a operações de ACMI [contrato de aluguer de aviões com tripulação, manutenção e seguro, do inglês “Aircraft, Crew, Maintenance and Insurance”], em particular para destinos como Dakar, Oslo e Estocolmo, que são mais exigentes em termos de tripulação, seja pelo tempo de voo, seja pelo horário noturno, pois consomem mais horas de produtividade de tripulação”, elucida. Do ranking de obstáculos que a TAP terá de contornar este verão , destacam-se ainda os atrasos nos processos de recrutamento.“Coincidindo com a sentença Supremo Tribunal de Justiça que condenou a TAP a indemnizar tripulantes despedidos durante a covid, com a obrigação de os readmitir e com o SNPVAC a indicar a existência de vários outros casos nas mesmas circunstâncias, a TAP adiou o recrutamento e os cursos de novos tripulantes previsto para janeiro deste ano que só irá ser realizado agora em junho e que terá efeitos em julho”, frisa. .Número de voos em serviços externos mais do que triplica.Sem possibilidade de aumentar a frota, a TAP vê-se obrigada a recorrer à contratação de serviços externos de forma a cumprir os planos traçados para o verão, um exercício comum no quotidiano do negócio da aviação e que ganha expressão nos períodos de maior procura. A transportadora aérea tem atualmente em vigor três contratos com as companhias Airhub Airlines (Malta), com a AvionExpress (Lituânia) e com a portuguesa Hi Fly. Na prática, estas empresas fornecem um pacote “pronto a usar” composto por aviões e tripulação próprios que absorve parte dos voos da TAP. Ao DN, a transportadora de bandeira esclarece que estes acordos estão firmados até agosto e justifica o recurso ao regime de ACMI “com questões de indisponibilidade de avião próprio e devido a fatores não previstos”.O volume de voos da TAP operados este verão por outras companhias aéreas mais do que triplicou: se em 2024 foram realizados 392 voos por via dos ACMI, este ano o número dispara para 1300, adiantam os dados da SkyExpert.A estratégia adotada pela companhia é alvo de críticas por parte do Sindicato dos Pilotos da Aviação Civil (SPAC), que considera não se tratar de uma solução vantajosa, nem para a TAP, nem para os passageiros e trabalhadores. “Esta operação descaracteriza o serviço e o produto que a empresa - seja a TAP ou outra companhia - está a vender aos seus clientes. Normalmente, os ACMI não oferecem o mesmo nível de serviço. Os passageiros estão a adquirir um bilhete de uma determinada companhia, ou pensam que estão, mas depois voam com outra. É um serviço transvestido e prejudica a imagem da TAP perante o cliente”, acusa o vice-presidente do SPAC.Frederico Saraiva de Almeida atesta que os pilotos são prejudicados com a alocação de voos a empresas externas. “É menos trabalho que os pilotos fazem e, como temos uma componente variável, a nossa remuneração é impactada”, aponta. Recorde-se, no entanto, que o acordo de empresa (AE) entre o SPAC e a TAP salvaguarda os trabalhadores neste cenário. No âmbito do Regulamento do Recurso à Contratação Externa (RRCE), estão estabelecidos limites para a TAP recorrer à contratação externa. Caso sejam ultrapassados, a empresa tem de proceder ao pagamento de indemnizações compensatórias aos pilotos - como aconteceu no ano passado, altura em que a TAP desembolsou 60 milhões de euros por ter excedido o teto máximo traçado no documento.O vice-presidente do SPAC reconhece esta cláusula e, apesar de considerar o modelo de wet lease pouco benéfico, admite que, face ao atual contexto da companhia, “não se vislumbra uma solução melhor para aumentar a oferta”. Frederico Saraiva de Almeida adianta que o reforço nos quadros de 80 pilotos veio “colmatar falhas que existiam com a saída de alguns profissionais” e, contrariamente aos restantes sindicatos, assegura não haver falta de pessoal no cockpit. “Considerando as restrições atuais no âmbito do plano de reestruturação não adiantaria contratar um grande número de pilotos porque depois não há aviões para voar”, garante. .Carlos Antunes: “Guerra comercial obrigou a TAP a baixar preços no Brasil” .Brasil quer receber 300 mil turistas portugueses com o apoio da TAP