Reposição salarial dos professores deverá custar 469 milhões, mais 50% do que o previsto pelo governo
A reposição gradual das remunerações relativas ao tempo de serviço dos professores deverá custar mais 50% do que diz o governo, estima a Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO), num estudo entregue esta segunda-feira aos deputados da Assembleia da República (AR).
De acordo com o grupo de peritos coordenado pelo economista Rui Baleiras, o custo global da medida no final dos quatro anos que pode durar o processo de reposição salarial dos docentes da escola pública (2024 a 2027) deve rondar 469 milhões de euros em termos brutos (isto é, sem descontar a receita adicional em IRS e contribuições que o governo vai encaixar com este aumento de remunerações).
Se assim for, significa que, segundo as contas da UTAO, a medida vai custar mais cerca de 169 milhões de euros do que estima o governo (o ministro da Educação apontou para um custo global de cerca de 300 milhões de euros, em maio deste ano, há menos de um mês), ou seja, a despesa final com a medida pode ser 56% superior ao que refere o governo.
A Unidade que assessora o Parlamento em matérias de contas públicas foi requisitada pelos deputados do PSD para fazer este estudo, um tema que gerou muita discórdia política no tempo do governo anterior (PS), que também foi uma bandeira de campanha eleitoral e que continua a levantar muitas dúvidas, sobretudo relativas ao impacto permanente na despesa pública.
Isto numa altura em que as Finanças Públicas de Portugal e restantes países da Europa vão passar ser escrutinadas à luz de um novo Pacto de Estabilidade (a partir de 2025 inclusive) que coloca ênfase máxima no controlo e nos cortes da despesa.
Demora quatro anos a descongelar
No cenário mais parecido com o do acordo alcançado a 21 de maio passado entre o governo e sete estruturas sindicais dos professores, a UTAO explica que “o crédito total calculado para cada docente é lhe atribuído à razão de 25% ao ano”.
No chamado cenário 3 da UTAO, “cada quarto [da reposição total acordada] é entregue aos trabalhadores e inicia o pagamento da nova remuneração base em 1 de setembro de 2024 e 1 de julho de 2025, 2026 e 2027”, como está previsto no acordo oficial.
“Para 2024, a despesa com a recuperação faseada do tempo de serviço terá um impacto orçamental bruto de 41 milhões de euros e líquido de 18 milhões de euros, ou seja, 0,015% e 0,006% do PIB [Produto Interno Bruto] de 2024, respetivamente”, diz o grupo de peritos parlamentares.
Nos anos seguintes a 2025, “a recuperação do tempo de serviço será de 25% ao ano a partir do 2.º semestre dos anos 2025, 2026 e 2027” e “o ano cruzeiro será 2028, visto que será o primeiro ano a registar 14 remunerações base mensais incorporando 100% do tempo de serviço recuperado”, afirma o estudo da unidade parlamentar.
“Tendo em conta a despesa permanente que é criada por esta medida no ano 2028 (469 milhões de euros em termos brutos e 202 milhões de euros em termos líquidos) e utilizando como referencial o PIB previsto para 2024 no Programa de Estabilidade mais recente, é possível afirmar que o impacto bruto no saldo global das Administrações Públicas (AP) no ano cruzeiro de 2028 corresponderá a 0,17% do PIB e o impacto líquido a 0,07% do PIB”.
Ou seja, há um impacto negativo no saldo orçamental, mas o valor até nem se pode considerar muito significativo em termos líquidos pois, à luz destas contas novas, o governo pode vir a encaixar quase 270 milhões de euros em receita adicional por via de uma maior coleta de impostos e descontos sociais e de saúde (no caso, a ADSE).
“Os impactos líquidos descontam aos anteriores [brutos] a receita adicional das AP decorrentes da subida nas remunerações base: contribuições sociais do empregador e dos trabalhadores para sistemas de proteção social, contribuição dos trabalhadores para o subsistema de saúde ADSE e liquidação de IRS”, explica a UTAO.
A 21 de maio, quando o acordo foi celebrado com os sete sindicatos que o subscreveram (FNE, FENEI, SIPE, FEPECI, SPLIU, SNPL e SIPPEB), o ministro da tutela, Fernando Alexandre, explicou que “a recuperação do tempo de serviço ocorrerá à razão de 25% ao ano”.
E ainda que “o acordo reconhece aos docentes o tempo de serviço contabilizado através do Decreto-Lei n.º 74/2023, o chamado acelerador de carreiras, salvaguardando que não se verificam situações de duplicação de benefícios na recuperação do tempo de serviço.”
“Ficou ainda garantido o acesso ao 5.º e 7.º escalões a todos os docentes que, por via da recuperação do tempo de serviço, reúnam as condições de progressão na carreira”, disse o ministério.
Segundo o ministro, “este acordo acautela ainda os casos dos docentes que foram colocados nas Regiões Autónomas da Madeira e dos Açores, e que já viram contabilizado parte do seu tempo de serviço congelado”.
Relembrou ainda que “o acordo foi alcançado menos de um mês após a primeira reunião, pondo fim a uma situação que se arrastava há 8 anos e que provocou grande instabilidade no sistema educativo”.
“A recuperação do tempo de serviço dos professores representa um esforço orçamental muito significativo, refletindo a importância que o Ministério da Educação, Ciência e Inovação atribui à carreira docente” e “a partir de 2027, completada a recuperação total do tempo de serviço, a medida terá um custo para o Estado estimado em cerca de 300 milhões euros”.