Privatização pressiona TAP a cortar custos. Trabalhadores pedem cautela
O dossiê laboral na TAP continua sem prazo para estar fechado. Depois de um ano a negociar os novos acordos de empresa (AE), que ainda não estão implementados na sua totalidade, conforme previsto, Luís Rodrigues recebeu ordens do antigo ministro das Finanças, no final de 2023, para cortar o peso da massa salarial na companhia. A importância da competitividade da TAP no futuro processo de privatização foi uma das preocupações apresentadas por Fernando Medina ao CEO da transportadora aérea, apurou o DN/Dinheiro Vivo.
“Infelizmente, tudo é válido para a companhia ficar mais apelativa para quem a comprar. O que entendemos é que, na verdade, estão a baixar a massa salarial e a desvalorizar o valor da TAP para a venderem o mais rapidamente possível”, lamenta o presidente do Sindicato dos Pilotos da Aviação Civil (SPAC) Tiago Faria Lopes. Os pilotos foram os primeiros a ser chamados pelo chairman da empresa para renegociar as condições do novo AE, aprovado em junho de 2023.
A argumentação de Medina, transmitida pelo líder da TAP, escudou-se no incumprimento das métricas definidas pelo plano de reestruturação aprovado pela Comissão Europeia (CE), em 2021. O rácio entre a massa salarial e as receitas está atualmente nos 21%, acima dos 19% estipulados no documento de Bruxelas. António Costa confirmou, na semana passada, que o Ministério das Finanças deixou instruções à companhia para se ajustar às obrigações com a CE. O SPAC deu luz verde, em assembleia-geral, ao congelamento dos aumentos salariais definidos para 2024 e 2025.
“Abdicámos de pontos que estavam no nosso AE em prol da paz social e de uma boa gestão da companhia”, explica Tiago Faria Lopes. Ainda assim, o sindicalista aponta o dedo ao anterior Executivo por não ter revisto o plano de reestruturação, aprovado na pandemia, num contexto de crise. “Os rácios estão muito desatualizados e o antigo Governo deveria ter pedido à CE para rever o plano, uma vez que a TAP já tinha dado lucros em 2022 e voltou a registar em 2023. É uma forma desonesta de a UE estrangular a TAP que não pode crescer”, diz.
O representante dos pilotos adianta que irá pedir uma reunião aos novos ministros das Finanças e das Infraestruturas para apelar a uma revisão do plano de reestruturação e discutir a privatização. “Queremos que tenham consciência de que a TAP é um ativo muito importante. Se tiverem de a vender, que não façam como o governo anterior que trancou a compra a grandes grupos europeus de aviação, se calhar podemos vender a empresários portugueses. É diferente comprar agora a TAP SA de ter comprado a SGPS em 2014. A TAP ‘boa’ é altamente lucrativa, rentável e apetecível”, assegura.
Negociações só depois de AE em vigor
O objetivo da companhia, que registou um lucro histórico de 177,3 milhões de euros em 2023, é agora negociar com os restantes sindicatos para conseguir baixar os custos com os salários até ao final de 2025, ano em que termina o compromisso com Bruxelas. Em 2023, os gastos com pessoal subiram para os 722,6 milhões de euros e as receitas atingiram os 4,2 mil milhões de euros, que comparam com os 416 milhões de euros e 3,5 mil milhões de euros de 2022, respetivamente.
O momento é delicado e a tarefa de Luís Rodrigues não será fácil. Após meses de avanços e recuos nas negociações laborais, que colocaram fim aos acordos temporários de emergência e definiram os tão aguardados aumentos salariais, os trabalhadores ainda não viram os novos AE em vigor na sua plenitude. As atualizações das remunerações acabaram por resvalar para março e abril, quando estavam previstas, inicialmente, para janeiro e fevereiro.
Os tripulantes admitem já ter sido abordados informalmente no início do ano pelo CEO da empresa, mas adiantam que não foram definidas, para já, medidas concretas. “Existiu uma conversa sobre a necessidade de respondermos a este apelo. Que, a acontecer, terá de ser transversal a todos os trabalhadores da TAP”, alerta Ricardo Penarroias.
O presidente do Sindicato Nacional do Pessoal de Voo da Aviação Civil (SNPVAC) defende que “não faz sentido fazer ajustes a algo que não está ainda implementado”. “Afirmar, à cabeça, que um acordo já está a ultrapassar a massa salarial quando não se implementou parece-me precipitado”, indica. Para o representante dos tripulantes serão precisos seis meses, após a aplicação dos AE, para serem retiradas conclusões. “A implementação dos acordos baseia-se em flexibilidade e produtividade em troca de aumentos salariais e de melhores condições de trabalho. Foram estes dois pilares de negociação e só daqui a seis meses é que podemos perceber se o que foi negociado tinha razão de ser ou não. As medidas que negociaram connosco vão trazer benefícios à empresa”, justifica. Ricardo Penarroias diz que não será “insensível” ao pedido de Luís Rodrigues e clarifica que “o sindicato não fará qualquer tipo de ajuste salarial, porque não há qualquer aumento nem este ano nem no próximo”.
Já o Sindicato dos Trabalhadores e Aviação (SITAVA) sentou-se à mesa na semana passada com a administração, que pediu que os aumentos aos trabalhadores de terra, previstos para janeiro, fossem pagos apenas a partir de dezembro. O presidente da estrutura sindical, Paulo Duarte, atesta que as negociações só acontecerão depois da implementação dos novos AE. “Primeiro paguem o que devem e depois conversamos. Ainda nos estão a dever dinheiro desde julho do ano passado e já estão a fazer mais pedidos? No final de abril, quando pagarem, logo conversaremos sobre o assunto”, promete.