O primeiro-ministro, Luís Montenegro, ladeado pelo ministro dos Assuntos Parlamentares, Pedro Duarte, e pelo ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, Paulo Rangel.
O primeiro-ministro, Luís Montenegro, ladeado pelo ministro dos Assuntos Parlamentares, Pedro Duarte, e pelo ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, Paulo Rangel.FOTO: Tiago Petinga / Lusa

Governo vai pedir ao Parlamento 200 milhões de euros para gastar com bancos falidos 

Executivo vai ter de pedir à AR uma autorização de nova despesa com restos de bancos privados (BPN e Banif), no valor de quase 200M€. É mais do que custará a recuperação integral do tempo de serviço dos professores no próximo ano (177 milhões de euros), segundo a proposta de Orçamento do Estado para 2025.
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Todos os anos, desde a grande crise financeira de 2008, os sucessivos Governos portugueses têm inscrito uma previsão de despesa muito avultada nos Orçamentos do Estado (OE) para salvar ou apoiar bancos. Até hoje, a conta já ultrapassa largamente 20 mil milhões de euros.

O OE2025 não é exceção: de acordo com um levantamento feito pelo DN/Dinheiro Vivo aos mapas da proposta orçamental, o Governo do primeiro-ministro, Luís Montenegro, e do ministro das Finanças, Joaquim Miranda Sarmento, vai pedir ao Parlamento autorização para fazer uma nova despesa com restos de bancos privados, que entretanto faliram, no valor de quase 200 milhões de euros.

Só por termo de comparação, é mais do que custará a recuperação integral do tempo de serviço dos professores em 2025 (177 milhões de euros).

Para os bancos são 199,3 milhões de euros, para se ser mais preciso, uma verba para continuar a apoiar cinco veículos financeiros que carregam os destroços de dois bancos que já faliram há muitos anos: o Banco Português de Negócios (BPN, falido e nacionalizado em 2008) e o Banco Internacional do Funchal (Banif, falido e resolvido em 2015).

Para não variar, é do universo BPN, um grande devedor da Caixa Geral de Depósitos (CGD), que continuam a vir os maiores prejuízos e pressões para o erário público.

No OE 2025, o Governo inscreveu uma despesa de 101,5 milhões de euros para a Parvalorem, o veículo financeiro que ficou com vários ativos problemáticos do antigo banco de José Oliveira Costa, designadamente uma carteira de imóveis, muitos deles de difícil recuperação e sem grande valor.

Além deste veículo, os restos do BPN foram depositados em mais duas sociedades - a Parparticipadas e a Parups. Ambas já não constam dos mapas deste OE. A Parparticipadas foi “incorporada na Parvalorem”, indica a nova proposta de OE.

Banif soma e segue

Depois o Banif, o banco fundado por Horácio Roque. O Orçamento prevê uma despesa de 61,8 milhões de euros com a Oitante, um veículo financeiro que carrega os ativos menos bons e tóxicos que o banco Santander Totta não quis comprar na altura da resolução.

Em todo o caso, esta sociedade tem conseguido entregar lucros ao Fundo de Resolução. Precisa, no entanto, de fundos públicos para se manter à tona, como provam os sucessivos orçamentos desde então. O OE 2025 prevê ainda gastar 32,9 milhões de euros com a Banif Imobiliária e mais um milhão de euros com a firma Banif SA. Tudo considerado dá os referidos 199,3 milhões de euros.

Pedir dinheiro ao Parlamento para continuar a segurar restos de bancos que já não existem não é uma originalidade do Governo PSD-CDS. Por exemplo, o Governo PS inscreveu no seu OE2024 (o que está hoje em vigor) 294,4 milhões de euros por conta dos dois universos em questão (BPN e Banif).

No ano anterior, o OE2023 (também PS) previa gastar 476,9 milhões de euros com os mesmos veículos financeiros problemáticos. E por aí fora.

Aliás, em 2023, houve uma péssima notícia para os contribuintes, só conhecida no final de março deste ano, quando o Instituto Nacional de Estatística (INE) divulgou a primeira notificação do Procedimento dos Défices Excessivos (o apuramento dos principais indicadores das contas públicas, em contabilidade nacional, que segue depois para a Comissão Europeia).

Nesse documento, o INE revelou os contribuintes perderam quase mais mil milhões de euros de uma assentada ainda por conta do BPN. O instituto procedeu ao “registo de perdas adicionais de créditos não passíveis de recuperação (915,9 milhões de euros) detidos pela Parvalorem, S.A., para além das perdas estimadas inicialmente para a carteira do BPN”.

BPN soma e segue

Perdas que podem nem ficar por aqui, segundo explica o INE: “Em 2023, no âmbito do processo de reestruturação das referidas empresas, com fusão das restantes na Parvalorem, foi elaborado um Plano de negócios para o período 2024-2027 com enfoque na estimativa de recuperação da carteira de crédito até ao fecho da empresa. No âmbito desse processo foi apurado o valor dos créditos que não serão recuperados, registado como transferência de capital com impacto no saldo das Administrações Públicas (AP)”. Ou seja, até 2027, o risco de haver mais perdas ainda por conta do BPN é relevante e até ameaçador.

Segundo o novo OE de Montenegro e Sarmento, no quadro que sintetiza os valores dos maiores empréstimos concedidos pelo Estado às empresas públicas, a Parvalorem é líder incontestada, devendo ainda uns impressionantes cinco mil milhões de euros aos contribuintes, mais do dobro do que deve, por exemplo, a Infraestruturas de Portugal (estradas e rede ferroviária nacional), com cerca de 2,2 mil milhões de euros.

Este resto de BPN é, sem sombra de dúvida, no que toca aos apoios do setor financeiro, o segundo elemento mais ruinoso para as contas a seguir à dupla BES/Novo Banco. Compreende-se a razão: o BES era um dos maiores bancos privados de Portugal e tinha uma grande escala internacional.

Segundo o Tribunal de Contas (TdC), a única entidade que faz o apuramento (banco a banco) do custo efetivo imputado aos contribuintes no âmbito do parecer à Conta Geral do Estado, coloca o custo com o BPN, um banco de pequena-média dimensão, nuns astronómicos seis mil milhões de euros.

BES soma e segue

A liderar, como referido, continua incontestado o BES, que faliu com estrondo em 2014, tendo sorvido já 8,3 mil milhões de euros ao erário público, segundo o auditor das contas públicas.

O Banif, outro banco que era de média dimensão, custou até agora 2,9 mil milhões de euros ao Estado desde que foi “resolvido”, indica o TdC. Vai fazer dez anos.

Como noticiou o DN/Dinheiro Vivo na altura (em março), o pacote do apoio aos bancos gerou, assim, em 2023, um prejuízo para as contas públicas (défice) de 1314 milhões de euros, quase o triplo do que tinha custado em 2022, por exemplo.

Além do gasto associado ao BPN, o INE revelou que, no ano passado, ocorreu mais uma ajuda prevista em termos contratuais ao Novo Banco, a marca herdeira do antigo BES, no valor de “117 milhões de euros associados à conversão de ativos por impostos diferidos (DTA) do Novo Banco em crédito tributário reembolsável”.

Ironicamente, no ano passado, o pesado agravamento no custo com apoios ao setor financeiro acabaria por passar quase despercebido, já que ficou diluído num ano de excedente orçamental recorde, que chegou a 3247 milhões de euros, o equivalente a 1,2% do PIB, como se sabe.

Sobre a situação deste ano, a execução das despesas previstas no OE 2024 e eventuais surpresas como novas “perdas adicionais de créditos não passíveis de recuperação” decorrente da operação Parvalorem, nada se sabe. Os portugueses devem esperar até final de março do ano que vem, altura em que o INE costuma regressar ao tema.

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