O preço dos combustíveis registou uma aceleração em março face a igual mês do ano passado, o custo dos alimentos parece ter estabilizado, mas quando se olha em retrospetiva para os últimos dois anos (entre março de 2022 e agora), percebe-se que o custo de vida agravou-se de forma significativa por causa do preço da comida, que subiu 20% desde o primeiro mês completo de guerra da Rússia contra a Ucrânia, indicam cálculos do DN/Dinheiro Vivo a partir de dados ontem atualizados pelo Instituto Nacional de Estatística (INE)..O item “combustíveis e lubrificantes para transporte pessoal”, onde caem as gasolinas e os gasóleos, pelo contrário, estão 11% mais baratos, não sendo despiciendo, claro, os fortes aumentos que ocorreram desde a primavera de 2022 neste item do cabaz de consumo que o INE usa para calcular a inflação, em Portugal..Ambos os produtos (alimentos e combustíveis) beneficiaram de medidas do governo para amortecer a elevada inflação. Aparentemente, ao dia de hoje, é possível afirmar que a inflação dos alimentos ganhou esta batalha..Desde outubro de 2022, quando a inflação atingiu um pico nunca vista na história recente do país (enquanto membro da Zona Euro), superior a 10%, que o indicador geral dos preços no consumidor apresenta uma tendência de descida gradual, apesar dos solavancos..Foi o que aconteceu outra vez em março. Segundo o INE, “a variação homóloga do Índice de Preços no Consumidor (IPC) foi 2,3% em março, taxa superior em 0,2 pontos percentuais (p.p.) à observada no mês anterior”..“O indicador de inflação subjacente (índice total excluindo produtos alimentares não transformados e energéticos) registou uma variação de 2,5% (2,1% em fevereiro)”..“A variação do índice relativo aos produtos energéticos aumentou para 4,8% (4,3% no mês precedente) enquanto o referente aos produtos alimentares não transformados diminuiu para -0,5% (0,8% no mês anterior), parcialmente em consequência do efeito de base associado ao aumento de preços registado em março de 2023 (variação mensal de 1,5%)”, explica o instituto..No entanto, como referido, o que as famílias hoje sentem nos orçamentos disponíveis é um aperto inequívoco, comparando com o tempo em que a inflação ainda não era o problema..As mais pobres, que dedicam uma proporção muito maior do seu rendimento disponível à compra de bens essenciais, serão as maiores queixosas..No ranking dos 15 maiores aumentos de preços entre março de 2022 e o mês passado, metade acontece nos itens alimentares..Nos “produtos hortícolas” o aumento de preços supera os 26%, no trio “leite, queijo e ovos” a subida é de 25%, as frutas estão 24% mais caras face há dois anos, no dístico “óleos e gorduras”, onde se inclui o azeite, o agravamento é, igualmente, de 24%. O pão está hoje 20% mais caro e a carne também..A liderar os maiores aumentos estão bens e serviços muito ligados ao turismo e à forte procura que existe neste setor. Os transportes aéreos registam uma inflação de quase 50% face a março de 2022. O alojamento turístico está 33% mais caro. Comer fora custa mais 20%..Do outro lado da balança estão, como dito, os combustíveis. Os que são destinados a aquecimento estão 2% mais baratos do que em março de 2022..O grupo que congrega a gasolina e o gasóleo de uso corrente pelas famílias e empresas teve um alívio no custo final no consumidor superior aos referidos 11%..A liderar o ranking dos que ficaram mais baratos estão, como tem acontecido, bens de cariz mais tecnológico: os telemóveis e as câmaras fotográficas e de vídeo registam uma inflação negativa de 14%. As bicicletas também estão mais acessíveis, com uma descida de 12% no preço médio final..Inflação alivia ou não?.A previsão sobre o que pode acontecer aos preços neste momento em que estamos é complicada, afirmam os analistas. Esta semana, Nazaré da Costa Cabral, a presidente do Conselho das Finanças Públicas (CFP), apresentou o mais recente e atualizado diagnóstico sobre as perspetivas macroeconómicas que se colocam à economia portuguesa nos próximos anos..O CFP nota “a contínua desaceleração no crescimento dos preços dos bens alimentares e, por outro lado, o impacto da transmissão da política monetária mais restritiva sobre a economia”..E salienta que, em 2024, “este processo de desaceleração da inflação em Portugal deverá ser parcialmente mitigado pelo ressurgimento de pressões inflacionistas nos produtos energéticos, pelo efeito base decorrente da cessação da medida do IVA zero (em especial a partir de abril), assim como pelo abrandamento substancialmente mais lento do ritmo de crescimento da componente de serviços, que persiste em valores elevados”..No entanto, há riscos macroeconómicos que “são maioritariamente de natureza externa e decorrem de um contexto de elevada incerteza”, diz a líder da entidade que avalia as contas nacionais..O primeiro deles é logo “a persistência da taxa de inflação [da Zona Euro em valores acima do objetivo de médio prazo [2%], levando ao adiamento do alívio da política monetária por parte do Banco Central Europeu (BCE), o que penalizará a atividade económica”. Ou seja, as taxas de juro, que hoje estão em máximos, até podem descer, mas mais tarde e mais devagar do que hoje se espera..O BCE, que hoje realiza mais uma reunião de política monetária e de taxas de juro, deve deixar tudo na mesma. Juros em máximos. Quer mais dados e esperar para ver se os preços caem de forma consistente. O gabinete de estudos do BPI afirma que “não esperamos um corte nas taxas já em abril, mas acreditamos que o BCE deixará para junho o primeiro corte de 0,25 pontos percentuais nas suas taxas de referência”..luis.ribeiro@dinheirovivo.pt