Nazaré Costa Cabral, presidente do Conselho das Finanças Públicas (à esquerda).
Nazaré Costa Cabral, presidente do Conselho das Finanças Públicas (à esquerda).Gerardo Santos

Desaire no investimento público pagou derrapagem nas prestações sociais

Execução do investimento público ficou quase 20% abaixo do previsto em 2024, tendo sido prejudicada pela lentidão do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), mostra o Conselho das Finanças Públicas.
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Os investimentos públicos previstos para o ano de 2024 ficaram mais de 2,6 mil milhões de euros abaixo do previsto no Orçamento do Estado (OE), mas esse desaire na execução orçamental acabou por compensar o aumento muito pronunciado das prestações sociais (como pensões e apoios como o CSI) e das despesas com pessoal, que no seu conjunto furaram a meta prevista no OE em mais 1,8 mil milhões de euros, indica o Conselho das Finanças Públicas (CFP), num estudo divulgado esta terça-feira.

De acordo com o relatório sobre a evolução orçamental das Administrações Públicas em 2024, "no âmbito da despesa de capital, tanto a Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF), como as outras despesas de capital ficaram muito aquém da previsão inicial do Ministério das Finanças (MF)".

A FBCF, que corresponde ao novo investimento público, "cresceu 10,9% em 2024, o que corresponde a cerca de um terço do crescimento que estava implícito no OE 2024 (32,3%)". Este OE foi apresentado em outubro de 2023 pelo governo do PS, que antecedeu o do PSD-CDS.

Segundo o CFP, esta despesa com investimentos públicos "ficou 1,5 mil milhões de euros abaixo do previsto nesse documento de programação orçamental (refletindo um grau de execução de 83,8%), sobretudo pelo facto de os investimentos executados ao abrigo do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) terem sido inferiores à previsão inicial".

Mais tarde, em outubro passado, Joaquim Miranda Sarmento, o ministro das Finanças do governo de coligação PSD-CDS, haveria de atualizar as suas metas para o investimento público e outras despesas de capital em 2024. Mas também estas não foram atingidas em larga medida.

Segundo o CFP, "a estimativa do MF para 2024, incluída na proposta de OE 2025, apontava inclusivamente para um valor da FBCF superior ao aprovado no OE 2024 (+146 milhões de euros)".

As outras despesas de capital, a segunda componente relativa ao investimento público em sentido lato, "ficaram 1,2 mil milhões de euros abaixo do previsto no OE 2024, dos quais maioritariamente são explicados pelos seguintes fatores: (i) menor impacto de one-offs face ao inicialmente previsto; (ii) revisão da base das contas nacionais e; (iii) execução de despesas ao abrigo do PRR aquém do previsto", refere o conselho presidido por Nazaré Costa Cabral.

"One-offs" são as chamadas medidas pontuais e irrepetíveis, que só acontecem uma vez.

O valor poupado ou não executado em despesa com investimentos acabou assim por mais do que compensar a subida muito significativa e além do esperado nas prestações sociais, cujo valor anual registou uma derrapagem superior a 1,8 mil milhões face ao previsto no OE 2024, tendo inclusive ficado 153 milhões de euros acima da estimativa atualizada por Miranda Sarmento em outubro passado.

Segundo o conselho independente que fiscaliza o cumprimento das regras orçamentais e a sustentabilidade das finanças públicas, "a maior execução da despesa corrente primária face ao previsto no OE 2024 deveu-se sobretudo às prestações sociais e, em menor grau, às despesas com pessoal".

"A despesa com prestações sociais que não em espécie cresceu 10,3%, quase o dobro dos 5,7% que estavam implícitos no OE 2024", confirma o CFP.

Para este desvio, "contribuiu, desde logo, o facto de, mesmo sem o efeito de medidas de política, a despesa com pensões ter sido superior ao previsto no OE 2024".

Acresce ainda "o impacto de medidas que não estavam previstas no OE 2024, como é o caso do pagamento do suplemento extraordinário de pensões, bem como do aumento do valor de referência do Complemento Solidário para Idosos (CSI) e do alargamento do universo dos pensionistas abrangidos pelo CSI", explica a entidade fiscalizadora. "Para o referido desvio também contribuiu o efeito decorrente da revisão da base das contas nacionais."

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A maior execução face ao previsto nas despesas com pessoal é explicada, em parte, pelas "medidas de valorização salarial de diversos grupos profissionais adotadas após a aprovação do OE 2024, que implicou o recurso à dotação provisional e à descativação de uma parte da reserva orçamental".

Em compensação, "em sentido oposto, o consumo intermédio e as outras despesas correntes registaram uma execução abaixo do previsto". "No primeiro caso, a maior parte do desvio deveu-se ao facto de as despesas ao abrigo do PRR terem sido inferiores ao previsto no OE 2024", diz o CFP. Foi o mesmo problema que emagreceu brutalmente o investimento público.

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