Luís Montenegro, primeiro-ministro, no lançamento do futuro grande hospital de Lisboa (Hospital de Todos os Santos). 7 de outubro de 2024.
Luís Montenegro, primeiro-ministro, no lançamento do futuro grande hospital de Lisboa (Hospital de Todos os Santos). 7 de outubro de 2024.Fotografia: Carlos Pimentel

Custo com PPP volta a subir ao fim de três anos com hospitais de Cascais e do novo Todos-os-Santos

Cascais e Loures processaram Estado e ganharam. Novo hospital de Lisboa arrancou com o Governo a acelerar apoios do PRR. Subida de encargos públicos acontece porque em 2023 “contrato não existia”.
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A despesa pública com as parcerias público-privadas (PPP) desceu a um ritmo assinalável desde 2019, interrompido em 2021 (mais 4,7%), depois continuou a cair: em 2022, registou a maior queda dos últimos dez anos (menos 12%), no ano seguinte recuou 7%, mas em 2024, voltou a subir.

A Conta Geral do Estado (CGE) de 2024, publicada há pouco mais de uma semana (foi entregue no Parlamento a 15 de maio, como dita a Lei de Enquadramento Orçamental), indica que o custo líquido final imputado aos contribuintes com as ditas parcerias aumentou 1,9%, para 1,3 mil milhões de euros.

O Ministério das Finanças, tutela do atual ministro Joaquim Miranda Sarmento, explica que esta subida ao fim de três anos se deve, sobretudo, a duas PPP no setor da Saúde.

Uma é o Hospital de Cascais, a outra o futuro Hospital de Todos-os-Santos (Lisboa Oriental), cuja construção arrancou, finalmente, no ano passado.

A megaoperação na freguesia de Marvila estava no prelo há décadas, com contrato assinado desde 2017, mas só em 2024 foi lançada a primeira pedra. O primeiro-ministro, Luís Montenegro, fez as honras, em outubro passado.

Segundo as Finanças, a execução da despesa total com PPP teve “um ligeiro acréscimo, de 1,9% (mais 23,6 milhões de euros)” no OE 2024.

Para isto “contribuiu significativamente o setor da Saúde, com um aumento de 65,2% dos encargos líquidos (mais 82,4 milhões de euros), mitigado pelo decréscimo de 5,1% registado no setor Rodoviário (menos 55,5 milhões de euros)”, refere a CGE, o documento principal de prestação de contas que “encerra o ciclo orçamental anual”.

Nas parcerias da saúde, “o aumento dos encargos líquidos deve-se, em grande medida, ao acréscimo dos pagamentos contratuais efetuados ao parceiro privado da gestão clínica do Hospital de Cascais, bem como aos pagamentos no âmbito do contrato de concessão do edifício do Hospital de Lisboa Oriental”.

O aumento de encargos públicos em 2024 acontece porque em 2023 “não se verificaram”, “o contrato não existia”. Relativamente ao setor Rodoviário, que compensou esta nova despesa, a CGE refere que houve um decréscimo nos encargos líquidos (face a 2023) explicado pela “diminuição dos encargos brutos referentes a pagamentos por disponibilidade, tanto na componente anual, quanto na componente de reconciliação”. A despesa pública com estradas beneficiou ainda de uma “redução dos pagamentos referentes a grandes reparações”, dizem as Finanças.

Nos dois hospitais referidos, há explicações diversas. Algumas decorrem de processos judiciais (caso de Cascais e do Hospital de Loures, que também é elencado), outras para tentar acelerar a execução dos fundos do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), como no novo Hospital de Todos-os-Santos.

A CGE refere como causa de despesa em PPP “pagamentos contratuais à entidade gestora do edifício (EGEd) do Hospital de Lisboa Oriental, não-orçamentadas no Relatório do Orçamento do Estado para 2024, os quais foram executados ao abrigo dos apoios do PRR”. “Estes pagamentos totalizaram 28,3 milhões de euros”.

Os casos de Cascais e Loures

Em Cascais, houve o “pagamento de reconciliação não-orçamentado a favor da anterior EGEst Cascais [a entidade gestora, o parceiro privado da gestão clínica do hospital], cujo contrato terminou no final de 2022, referente aos serviços prestados nesse ano, no valor de 8,6 milhões de euros”.

A história recente deste hospital é recheada. Segundo uma notícia do Expresso de agosto de 2022, o grupo francês Vivalto Santé, controlado por um grande fundo de investimento (private equity), comprou o Grupo Ribera Salud (sedeado em Valência e com experiência em PPP em Espanha) e no acordo ficou com o Lusíadas Saúde, que era detido pelo norte-americano United Health Group, “o maior grupo de saúde do mundo”.

Pouco antes, nesta PPP de Cascais, em julho de 2020, o governo do PS tinha lançado um concurso para vender este contrato de gestão e prestação de cuidados de saúde a privados. Até então, era do Grupo HPP, da Caixa Geral de Depósitos.

Segundo o Expresso, “quando o contrato estava a terminar, em 2018, o governo de António Costa, com Adalberto Campos Fernandes na pasta da Saúde, decidiu prorrogar a PPP e lançar um concurso para voltar a adjudicar os hospitais a privados”.

Entretanto, meteu-se a pandemia, tudo se atrasou e, em 2023, o negócio do Grupo HPP - Hospitais Privados de Portugal (grupo que mudou o nome para Lusíadas Saúde) acabou nas mãos da Ribera Salud, um especialista em saúde privada, com operações na Eslováquia e na República Checa, hoje propriedade do referido grupo Vivalto. Na altura, a transferência foi avaliada em cerca de 300 milhões de euros.

Além disto, a entidade gestora do Hospital de Cascais também ganhou um processo contra o Estado no ano passado. A CGE confirma um “pagamento efetuado à anterior EGEst Cascais, no valor de 2,3 milhões de euros, no seguimento do acórdão arbitral proferido no segundo trimestre de 2024, relativo a custos incorridos pelo parceiro privado com medicamentos dispensados a beneficiários de subsistemas públicos de saúde”.

E, para terminar, as PPP acomodaram “a não execução da verba, orçamentada em 13,1 milhões de euros, referente à ampliação do edifício do Hospital de Cascais”, diz o documento das Finanças.

Mais a norte, em Loures, as PPP de 2024 absorveram o impacto “de um pagamento, no valor de 6,6 milhões de euros, a favor da EGEst Loures, decorrente de uma decisão arbitral [judicial] em matéria de tratamento VIH/Sida, que não se encontrava previsto no relatório do Orçamento do Estado para 2024”.

O novo grande hospital de Lisboa

Por fim, não menos importante, o novo grande hospital em Marvila/Chelas/Olaias, que pode abrir em 2028.

A obra pensada há décadas foi lançada no terreno no ano passado. Está andar.

A CGE explica que o Estado fez “pagamentos contratuais à entidade gestora do edifício (EGEd) do Hospital de Lisboa Oriental, não orçamentadas no relatório do Orçamento do Estado para 2024, os quais foram executados ao abrigo dos apoios do PRR” e que estes gastos “totalizaram 28,3 milhões de euros”.

“O contrato de gestão assinado em fevereiro de 2024 com um consórcio liderado pela Mota-Engil, na sequência de um concurso lançado em 2017, tem por objeto a gestão do hospital, em regime de PPP”, incluindo “conceção, projeto, construção, financiamento, conservação, manutenção e exploração do edifício”. “Tem um valor total de aproximadamente 350 milhões de euros e conta com uma contribuição de 100 milhões de euros do PRR”, refere a construtora.

“A conclusão da obra está prevista para dezembro de 2028” e “encerra um longo ciclo de promessas e planos que se arrastaram por quase 40 anos”, diz o grupo Mota-Engil.

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