A CP reclama 18,6 milhões de euros junto da Infraestruturas de Portugal (IP) e da Fidelidade por causa do acidente ferroviário de 31 de julho de 2020, em Soure, distrito de Coimbra. A ação foi entregue no Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra no dia 13 de julho de 2023 e está relacionada com o choque entre um comboio Alfa Pendular e um veículo de manutenção da via IP, que vitimou dois funcionários da gestora de infraestruturas e que causou três feridos graves e 41 feridos ligeiros.A CP pretende ser indemnizada pela destruição do comboio - acrescido dos juros de mora - e pelas despesas com ações judiciais. A frota do serviço mais rápido da empresa ficou reduzida a nove unidades, limitando a oferta de viagens de Lisboa para Porto, Braga e Faro. Do acidente resultaram ainda custos adicionais de cerca de 575 mil euros pelos atrasos causados. A CP entrou com a ação através do próprio departamento jurídico, mas recusa mais comentários “respeitando assim o princípio da independência e da reserva dos tribunais”, refere ao DN fonte oficial.."Isto não é um incidente menor". O que explica o descarrilamento em Soure?. A IP contratou a defesa à sociedade de advogados Sérvulo & Associados, tendo já gastado cerca de 67 mil euros desde o final de 2023. A ligação vai durar pelo menos até ao final do próximo ano, segundo o portal dos contratos públicos. A gestora de infraestruturas confirmou ao DN que o apoio jurídico é relativo a este processo, contestado em novembro de 2023 por a empresa “entender ter cumprido todos os deveres de cuidado a que se encontrava adstrita, observando e dando cumprimento às diversas normas legais e regulamentares aplicáveis ao desenvolvimento da sua atividade”.A Fidelidade também surge como réu porque era a empresa contratada para o seguro de responsabilidade civil da IP. Em sua defesa, a companhia “impugna a violação dos deveres legais e /ou regulamentares alegada pela CP, e que o segurado IP estava obrigado a observar” e alega que a CP “não demonstrou o nexo de causalidade adequado entre os pretensos danos invocados e a atuação da IP”, adianta ao DN fonte oficial da seguradora.O acidente ocorreu pelas 15 horas e 26 minutos de 31 de julho de 2020 junto à estação ferroviária de Soure, na Linha do Norte. Segundos antes, o veículo de manutenção da IP (designado de VCC) ultrapassara, inadvertidamente, o sinal vermelho entrando na linha principal. Ao mesmo tempo, o veículo da CP tinha acabado de passar o sinal verde na linha principal e recebeu indicação de via livre pelo sistema de controlo de velocidade (Convel). A informação de que a via, afinal, estava ocupada, já não chegou a tempo de ser vista pelo comboio da CP. Quando o Alfa seguia a 180 km/h e a 400 metros do VCC, o maquinista apenas teve tempo para acionar a frenagem máxima. O Alfa embateu no veículo da IP a 155 km/h, segundo o relatório de outubro de 2021 do Gabinete de Prevenção e Investigação de Acidentes com aeronaves e acidentes ferroviários (GPIAAF).Um erro da tripulação do VCC na identificação do sinal foi apontado pela investigação como a “explicação mais provável” para a ultrapassagem indevida. A tripulação “terá percebido a indicação do segundo sinal a contar da esquerda como dizendo respeito à segunda linha a contar da esquerda, aquela onde se encontravam parados”. Para o GPIAAF, o erro humano “raramente é uma causa, mas sim a consequência de pré-condições não controláveis pelos trabalhadores de primeira linha”. A falta de sistemas de segurança, a ausência de análise ao excesso de velocidade nos veículos e de indicações na folha horária e a escassez de condições de trabalho foram as principais falhas apontadas pela investigação.A IP tinha conhecimento de várias situações de ultrapassagem inadvertida de um sinal fechado pelos veículos de manutenção, tendo sido registadas 18 ocorrências entre 2010 e julho de 2020. O gabinete de prevenção emitiu recomendações para reforçar as competências dos maquinistas e os elementos de segurança dos VCC.A gestora da rede ferroviária nacional também tinha sido alertada para a localização dos sinais em Soure e foi-lhe recomendada a elaboração de um estudo para que a leitura pelos agentes de condução fosse inequívoca evitando erros de interpretação. A IP nada fez, “tendo-se limitado a sustentar que os mesmos estavam de acordo com as regras e com as suas normas de projeto” e apenas tomou medidas de segurança depois do acidente, segundo o GPIAAF.A IP, na altura, acusou a investigação de “análise enviesada e não objetiva do acidente, inservível mesmo para os efeitos que se propõe”. Resta saber se vai haver algum pagamento de indemnização por parte da IP ou pela apólice do seguro.