Centeno: Portugal volta a ter défice público, mas dívida cai muito mais rápido
As contas públicas portuguesas vão voltar a ser deficitárias nos próximos três anos, interrompendo assim dois anos de excedentes em 2023 e 2024, prevê o Banco de Portugal (BdP), a autoridade governada por Mário Centeno. Em todo o caso, a trajetória de descida do rácio da dívida deve acelerar, caindo bem mais rápido do que prevê o Governo PSD-CDS, mostra o novo boletim económico do BdP divulgado esta sexta-feira.
"As projeções orçamentais apontam para o regresso a uma situação deficitária, embora o rácio da dívida pública mantenha uma trajetória descendente, atingindo 81,3% do PIB [Produto Interno Bruto] em 2027", indica o novo estudo sobre o que se pode esperar da economia e do País nos próximos três anos.
Depois de dois anos de excedentes (1,2% do PIB em 2023 e 0,6% este ano, ou seja, mais até do que os 0,4% estimados pelo ministro das Finanças, Joaquim Miranda Sarmento), o banco central de Centeno antecipa que "o saldo orçamental deve deteriorar-se em 2025, para -0,1% do PIB" e que "nos anos seguintes, continuam a projetar-se défices, em resultado das medidas permanentes já adotadas — com impacto na despesa pública e na receita fiscal —, dos empréstimos do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) previstos para 2026 e, a partir de 2027, do aumento de despesa para assegurar a continuidade dos projetos financiados pelo PRR".
Na proposta inicial do Orçamento do Estado para 2025, o governo e o ministro Sarmento previam alcançar um excedente de 0,3% do PIB no próximo ano.
No entanto, como se sabe, o OE 2025 acabou por ser bastante modificado no curso das negociações entre Governo e oposição, sobretudo o PS, e das votações parlamentares, fazendo aumentar mais o valor de certas rubricas da despesa, como pensões e salários.
Apesar do regresso aos défices, o outro indicador crucial para avaliar o desempenho das contas públicas, a dívida, deve cair mais do que espera Miranda Sarmento, mesmo com o efeito dos empréstimos do PRR, que fazem aumentar o endividamento nacional.
Por exemplo, entre 2024 e 2025, o governo prevê que a dívida caia de 95,9% do PIB para 93,3%, mas o BdP antecipa uma redução muito superior, de 91,2% para 86,5% do PIB, respetivamente.
No entanto, diz o BdP, "esta diminuição [no peso da dívida pública] abranda ao longo do período projetado, refletindo a deterioração das condições orçamentais e o menor contributo do crescimento económico nominal".
O Banco explica que "face às estimativas incluídas no OE2025 e no plano orçamental de médio prazo, projeta-se uma redução mais acentuada do rácio da dívida, essencialmente devido à hipótese de ajustamentos défice-dívida nulos".
Segundo o Conselho das Finanças Públicas (CFP), "o ajustamento défice-dívida corresponde à variação do stock de dívida pública que não resulta do défice/excedente orçamental".
Economia resiste, mercado de trabalho também, investimento trava com fim do PRR
Apesar dos riscos e ameaças cada vez maiores, sobretudo na envolvente externa, a instituição de Centeno prevê, para já, que a economia até ande com um pouco de mais força do que dizem as Finanças.
De acordo com a nota do BdP sobre o boletim, "a economia portuguesa cresce 1,7% este ano, 2,2% em 2025 e 2026, e 1,7% em 2027, mantendo a trajetória de convergência com a área do euro".
A inflação também alivia mais, "reduz-se para 2,6% em 2024 e 2,1% em 2025", estabilizando em 2% nos dois anos seguintes.
Segundo o BdP, "o maior crescimento da atividade está sustentado sobretudo na procura interna", sendo "sustentado sobretudo pelo consumo privado" em 2024.
Já em 2025 e 2026, o ritmo da atividade "reflete a melhoria das condições financeiras e a aceleração da procura externa, mas também a orientação expansionista e pró-cíclica da política orçamental".
"Em 2027, a desaceleração do PIB decorre, sobretudo, do impacto do fim da execução do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR)", diz o boletim.
"O mercado de trabalho continua robusto, com aumentos do emprego e dos salários reais, a par da manutenção de um desemprego historicamente baixo", taxa que se manterá inalterada em 6,4% da população ativa até 2027.
O Banco repara ainda que "em 2024, o rendimento disponível real regista um aumento historicamente elevado (7,1%), que se traduz na aceleração do consumo privado e num aumento marcado da poupança", mas depois deve "abrandar em 2025–27, em resultado do menor crescimento dos salários e do emprego, com reflexos no consumo".
A taxa de poupança dos portugueses, que se ficará em cerca dde 11,5% do rendimento disponível este ano, "estabiliza ligeiramente acima de 11% até 2027", diz o BdP.
"O investimento recupera em 2025–26 devido à melhoria das condições financeiras e das perspetivas globais e o estímulo dos fundos europeus, mas trava em 2027 com o fim do PRR".
"As exportações devem crescer 3,9% em 2024 e 3,2%, em média, em 2025–27, num contexto de aceleração da procura externa, menor dinamismo do turismo e ganhos de quota progressivamente menores", indica o BdP.